A atriz pernambucana Lucy Ramos sonhava em ser jogadora de futebol, chegou até a jogar em alguns times, mas seu treinador, à época, descobriu logo que sua aptidão estava mais para modelo do que para esportista.
Com 16 anos começou a trabalhar como modelo, e se deu bem na profissão. Em seguida, resolveu fazer um curso de teatro e teve como resposta a seu empenho um papel na novela “Começar de Novo”, da TV Globo, foi quando se mudou para o Rio de Janeiro. “Minha mãe, de todas as maneiras, fez de tudo para criar a gente da melhor forma possível, mesmo a gente morando na favela, tendo todo o tipo de realidade que se tem dentro das comunidades”, conta.
Daí em diante, foram muito papéis em novelas da Globo, como “Malhação”, “Sinhá Moça”, “Pé na Jaca”, “Ciranda de Pedra”, “Salve Jorge”, “A Força do Querer”, “A Dona do Pedaço”, entre diversos outros personagens.
Atualmente, ela vive Lívia Albuquerque, em “Amor Perfeito”, trama das 18h da Globo. Na novela, ela concebe uma mulher que sofre com a relação abusiva por parte do marido [Beto Militani] e o drama da maternidade. Para Lucy, papéis como esses são importantes para que as mulheres possam analisar a própria realidade e entender se estão vivendo um relacionamento abusivo. “Em um País onde uma mulher é morta a cada seis horas, em média, é inadmissível a normalização do assédio moral, da agressão psicológica e outras atitudes que são tratadas como pouco graves. Meu papel é uma forma de alertar, servir como espelho para que nosso público assista e consiga mudar uma realidade que põe em risco a vida e a autoestima de mulheres que sofrem com isso diariamente. É inadmissível a normalização do assédio moral”, diz.
Ao lado do marido, o diretor e roteirista Thiago Luciano, ela também comanda a produtora Zero Grau Filmes, que tem em seu currículo séries para TV e streamings.
Ligada em moda e redes sociais, Lucy aprendeu que tem de ter horários para tudo, inclusive para ficar no celular, e optou por encerrar seu dia na internet por volta das 21h e usa o tempo livre para ler.
Leia a seguir a entrevista que artista concedeu à Bazaar.
O que te levou a seguir a carreira de atriz?
Eu comecei a minha carreira, para você ter uma ideia, jogando futebol. Eu sempre fui muito moleca, de jogar futebol, bolinha de gude, soltar pipa. Minha mãe me colocou em uma escolinha de futebol do Marcelinho Carioca, ela sempre quis que eu fosse modelo, aí o meu professor, depois de um bom tempo que eu já estava na escolinha, disse que eu tinha jeito para ser modelo, embora eu jogasse bem. Ele acabou me levando para uma agência, e eu trabalhei em várias agências pequenas. Fiz muita coisa nessa época, entregava panfleto, eu queria trabalhar, tinha 16 anos. Aí, um dia eu estava fazendo um trabalho em um shopping e passou um “olheiro” [profissional que descobre modelos] da L’Equipe, que era uma agência grande, e pediu para que eu levasse todo o meu material à agência para fazer um teste. E acabou dando certo, fiz muitos trabalhos pela agência. Nisso, o governo soltou uns cursos gratuitos que as pessoas podiam se inscrever para fazer, eu me inscrevi em técnico-ator, e fui tocando as duas coisas ao mesmo tempo, o curso, que durou um ano, e o meu trabalho na agência. Foi através da L’Equipe que eu cheguei na Globo, onde comecei como elenco de apoio. Fiz vários processos, cursos, oficinas, até que apareceu uma personagem para “Sinhá Moça”, que foi meu primeiro trabalho grande na emissora.
Que trabalhos da sua carreira destacaria?
Olha, eu fiz muita novela, né? Coisa que eu gosto muito de fazer. Então eu destacaria “Sinhá Moça”, “Cordel Encantado”, que foi demais, foi muito doce fazer esse trabalho. Até então eu fazia esses personagens caricatos pretos, escravos etc. e “I love Paraisópolis” foi quando eu fiz uma psicóloga, e é legal quando te dão personagens que te tiram desse lugar caricato.
Quais foram os principais desafios da carreira até aqui?
Eu vim de um lugar muito simples, minha mãe não sabia me dar conselhos sobre a carreira, era tudo muito novo, então eu fui errando e acertando muito na vida. Mas graças a Deus eu sempre fui muito abençoada. Acho que o mais difícil foi isso mesmo, não ter uma pessoa que me mostrasse os caminhos, eu fui na vida. Talvez eu olhando para trás veja que alguns caminhos poderiam ter sido melhores, mas ao mesmo tempo sei que não, porque eu não sabia como fazer.
Como você avalia a presença preta no audiovisual atualmente?
De uma forma muito positiva. Toda essa virada veio com algo negativo, que foi a pandemia de Covid-19, mas as coisas foram se abrindo para os pretos, para as causas pretas. A gente não sabia como ia ser, se era uma onda, mas saímos da pandemia e estamos aí, fazendo protagonistas, aparecendo, em séries, em um posicionamento bom. A novela mesmo que eu estou vivendo, que tem uma quantidade bacana de pretos, e cada um com sua profissão, com suas histórias de amor, com seus conflitos. A minha personagem chegou agora na trama [“Amor Perfeito”, TV Globo], eu digo que ela passou uma primeira temporada figurando, mas nessa reta final, já que passamos do meio da novela, ela conta a sua história.
Conte sobre Lívia, sua personagem em “Amor Perfeito”. Como você avalia a posição dela no casamento que vive?
Eu fiz uma leitura da personagem, uma leitura muito ampla, porque novela é assim, é quase um “deixa a vida me levar”, ela pode ir para qualquer lugar a qualquer momento, tudo depende de um monte de fatores, de audiência, disso, daquilo e tal. Como eu já fiz muitas novelas eu não crio expectativa, eu entendo a cabeça dos autores, entendo no geral, e através do texto vou trabalhando sem grandes expectativas para não criar nenhuma frustração. A Lívia é essa mulher, que se casou naquela época… Ela é casada com esse homem rude, bruto, grosseiro, que tem esse relacionamento abusivo, então é uma mulher que se trava de uma certa maneira, então ela não se mostra exatamente como ela é. O marido a cobra por ela não conseguir ter filhos, aí conseguiu adotar o Tobias [Davi Querioz], quer era algo que ela queria muito. E vive nesse lugar, mesmo passando dificuldades com o marido ela permanece casa, porque tem uma questão da época e tudo o mais. Até que ela engravida e o marido passa a ser um doce com ela, que tem um pouco essa coisa de se casou tem de ficar.
Você acha que vai haver uma reviravolta na vila dela?
Sim, mas eu não vou dar spoiler (risos). Mas vai ter uma reviravolta sim.
Acha que o streaming abriu portas para mulheres, diretoras, roteiristas etc.?
Com certeza. O streaming tem muito esse lugar de trazer essa diversidade, trazer as mulheres, trazer os pretos. Até pessoas que não tinham muito lugar em outras tramas, no streaming você tem esse protagonismo, de levar a trama.
Conte um pouco sobre o seu trabalho na Zero Grau Filmes.
O meu marido [Thiago Luciano] tem a Zero Grau Filmes já faz um tempo. Eu fui começando a me envolver de alguma forma, cheguei até a fazer um curso de assistente de direção, cheguei até a fazer um filme como assistente de direção, mas não era muito a minha. Esses filmes que fazemos pela Zero Grau, por enquanto, são de baixo orçamento, mas queremos aos poucos ir mudando isso. Meu marido dirige, escreve, conduz as gravações, e eu fico ali do lado ajudando em tudo o que é preciso, represento, faxino, vou ao mercado buscar coisas. É uma maneira de entender o outro lado, o olhar da equipe. Todo mundo que está ali é por um fim, então é importante entender todo o processo. Tem o ator, que vai aparecer, mas tem toda uma equipe que trabalha por trás, existe uma máquina para que aquilo funcione. Eu sou sócia da produtora e também tem a Luc Filmes, que é minha, e acabou que ela já faz parte de alguns filmes que a gente faz e tal. É o tempo inteiro, o Thiago tem muitos projetos, muitos planos, que é tudo muito demorado. Esse segundo filme que a gente fez, “O Segundo Homem”, que nós produzimos para o Star+, viajamos com ele, fomos lá para Los Angeles, nós estamos trabalhando ele ainda. Nós o finalizamos em 2019, antes da pandemia.
Qual sua relação com a moda? Há estilistas ou marcas de sua preferência?
Quando eu era modelo, eu não tinha essa coisa de ser tão ligada à moda como eu tenho hoje. Porque na minha época de modelo a gente tinha que ser um papel em branco, e a marca escrevia a sua história. Hoje, com essa coisa de influenciadora, a imagem que você apresenta é o que você é. Eu venho aprendendo muito. Agora, inclusive, eu venho fazendo promoções de marcas. Para mim, moda não é uma coisa que por que está todo mundo usando eu vou usar também.
Acha que a moda é uma forma de expressão?
Com certeza. Tem sempre uma história por trás de uma peça.
Como cuida da beleza? Tem algum ritual?
Sim. Antes eu não pensava muito, ficava esticada no sol, sem o uso correto do protetor. Agora, eu tenho uma bolsa de cremes para usar. Creme para acordar, para dormir, para tudo. É uma loucura. Para fazer a maquiagem, então, você passa quatro, cinco coisas, a garrafinha de água para cima e para baixo, exercício, que, às vezes, você não tem vontade nenhuma de fazer, mas sabe que faz bem para a saúde.
O que faz nas suas horas vagas?
Olha, isso é uma boa pergunta, viu? Eu nunca tive o costume forte de ler, sempre preferi outras distrações, mas agora eu pensei: “Eu quero ler”, inclusive para sair do celular, porque eu trabalho muito com rede social. Estou trabalhando muito a questão do sono também, passei a entender o quanto é importante você dormir, sair do celular, eu saio às 21h, depois só no dia seguinte, e o que faço nesse meio tempo? Eu leio. Adoro também jogar baralho, jogo com meu marido, com meus sogros.