Chanel, Métiers d’Art 2024 (Foto: Divulgação)

Ainda que Chanel seja sempre uma caixinha (ou seria uma bolsa?) de surpresa, não era fácil prever as experiências que seu Métiers d’Art na Inglaterra prometia para os convidados. Nos dias antes do desfile, saraus de poesia e jogos de futebol fizeram parte da agenda da maison, assim como uma festa pós-show em que Suzy Menkes e Patricia Carta dividiram carona para chegar até o endereço. O único fato previsível, talvez, tenha sido o tempo chuvoso que caiu sobre Manchester e reuniu todos os presentes debaixo de um toldo de vidro, na Thomas Street. Mas se as gotas não atrapalharam as revoluções culturais que aconteceram na cidade há sessenta anos, o resultado não seria diferente hoje. Afinal, a estilista Virginie Viard convidou um time de rebeldes com causa para colaborar com a marca nessa temporada, que seguiu um formato diferente de outras.

Ao invés de uma transmissão ao vivo, a coleção será revelada amanhã (08.12) em um curta-metragem inédito – formato que a Chanel também usou para revelar os primeiros teasers da estação, com a assinatura inconfundível de Sofia Coppola, embaixadora da casa desde os tempos de Karl Lagerfeld. Há imagens de Mancunians (naturais de Manchester) nas ruas da cidade, clicadas por James Hawkesworth, todos vestindo os novos modelos temporada, ao som de Blue Monday, da banda-hit nos anos 1980 New Order. Quer tentar adivinhar de onde são?

Muito mais que ‘brit’, a Chanel é ‘manc’ nessa estação – e com motivo. Além de Coco adorar a Inglaterra (berço de seus grandes amores, como Boy Capel e o Duque de Westminster) e ter pegado dos britânicos a “febre pelo tweed”, a região influenciou profundamente os campos das artes, música, esporte e literatura – cada um deles, a seu modo, importante para a história centenária da casa.

O mix quase anárquico pode assustar os caretas, mas é eufônico e natural para Virginie, que já mostra uma inclinação pessoal para o punk desde sua coleção de alta-costura, no outono 2020, em que se inspirou em uma princesa warholiana rebelde para criar visuais meio insurgentes. O mesmo espírito retorna com a nova coleção, agora ao som de remixes hipnotizantes (curados por Michel Gaubert) e uma paleta colorida. Aqui, os tweeds – todos Lesage – são vibrantes e nem um pouco discretos, com padronagens variadas, enfeitadas por joias, bijus e camélias.

As saias não são como as minis da década de 1960 – parecem ter dois ou três dedos a mais –, mas a proposta de visuais com ares vintage lembra muito a de Alessandro Michele para sua era na Gucci. Também apareceram, com certeza, muito mais pérolas (em chapéus, pulseiras e botas) do que os típicos agitadores jovens da Manchester passada teriam usado ou preferido, ainda que o senso de texturas e camadas – em misturas de babados, plumas, tricôs e matelassês – dialogue com a subversão do “chic tradicional”. Há até shorts jeans e camisetas básicas!

As boinas, pode-se admitir, inclinaram um pouco no clichê, assim como os laços quase pesaram demais. Do lado da leveza, surgiram agasalhos esportivos, bolsas em formato de caixinha de chá, bordados com imagens de vinis e estampas curiosas com chuvas de tipografia. É nos detalhes, afinal, que mora a moda de Virginie na Chanel – uma desculpa perfeita para quebrar as regras nas temporadas de Métiers d’Art, exclusivas da casa.