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Por Carlos Ribeiro

Julho não foi só mês de Olimpíadas. Foi também mês da Semana Internacional de Vela de Ilhabela, tradicional competição brasileira da modalidade. Tanto na França quanto no litoral paulista, várias mulheres se lançam à água. Os objetivos são os mais diferentes: conquistar a glória olímpica, faturar uma medalha, cruzar a linha imaginária de chegada da regata, estar ao lado de familiares e amigos, saboreando o esporte que amam. Mas o certo é que a vela brasileira é cada vez mais feminina.

Não se sabe exatamente quantas velejadoras existem no País. Na Semana de Ilhabela do ano passado, 25% dos competidores (pouco mais de 150), eram mulheres. Nem todas brasileiras, obviamente. Uma delas, a bióloga geneticista paulista Valéria Ravani, conta que, há dois anos, realizou um velho sonho: o de trazer da Europa um recém-adquirido barco, de cerca de 41 pés (aproximadamente 12 metros de comprimento). Para isso, era necessário enfrentar a aventura desejada de atravessar o Oceano Atlântico, entre Portugal e Brasil. Com mais duas pessoas a bordo, ela fez a travessia em 40 dias, saindo de Lagos, no Algarve, com paradas providenciais nas Ilhas Canárias, em Cabo Verde e Salvador, antes de chegar ao Guarujá, no litoral paulista. “Sempre gostei do mar, de explorar lugares praticamente virgens da costa, algo cada vez mais raro, principalmente na Europa”, diz Valéria, que tem 76 medalhas e mais de 20 troféus, mimos destinados aos três primeiros colocados de uma prova.

Ter um veleiro é algo para poucos, ainda que ele possa ser comprado em sociedade, com pessoas que dividem a mesma paixão. O preço varia entre 100 mil e 100 milhões de reais. “Eu diria que é como investir em casas no litoral. Você pode ir de um chalé a uma residência sofisticada”, afirma a bióloga que, sinceramente, não vê a empreitada como negócio, já que sempre foi movida pelo amor ao esporte que abraçou.

Fazendo história

Aos 40 anos, a velejadora Isabel Swan está confirmada nas Olimpíadas de Paris, em parceria com Henrique Haddad – Foto: Divulgação

Para se ter ideia do recente poder feminino na vela brasileira, tomando a competição como parâmetro, as duas últimas medalhas de ouro do País na modalidade, em Olimpíadas (Rio 2016 e Tóquio 2020), foram conquistadas pela niteroiense Martine Grael e pela paulistana Kahena Kunze, na classe 49erFX. A dupla estará na França em busca de nova medalha. A também niteroiense Isabel Swan é outro nome confirmado nas Olimpíadas de Paris. Aos 40 anos, ela faz parceria com Henrique Haddad, na categoria 470, agora mista. Ao lado de Fernanda Oliveira, foi a primeira brasileira da vela a conquistar uma medalha olímpica: um bronze, em Pequim 2008, na mesma classe que disputa na França. “Estou feliz por estar novamente nas Olimpíadas. Meu sangue é salgado”, diz ela, também em referência às três horas diárias que passa na água, treinando.

Isabel, que começou a velejar aos oito anos, no Rio Yacht Club, em Niterói, é ciente da sua representatividade entre as mulheres do esporte. Foi dela um dos discursos que ajudou a trazer as Olimpíadas para o Rio, em cerimônia realizada em 2009, em Copenhague, na Dinamarca. Na época, a atleta era uma das embaixadoras da candidatura da capital carioca. “Velejar é o retrato do que é a vida. Alternância de dias em alta e em baixa, com ventos fortes ou a ausência deles, nos obrigando a tomar decisões, sempre procurando manter o prumo”, afirma.

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Nesse universo de mulheres obstinadas da vela, não necessariamente pelos feitos na água, existem, ainda, aquelas que gostam de velejar em família. É o caso da contadora paulista Camila Dumarco, 45 anos, mãe de Sofia, 13, e de Eduardo, 11, alunos do Yacht Club Santo Amaro (YCSA), às margens da represa de Guarapiranga, na capital paulista. É lá que ela e os filhos batem ponto de sexta a domingo. Se o marido de Camila, o médico Rodrigo Dumarco, é o grande incentivador dos filhos, por ser um apaixonado por barcos desde a infância, cabe a ela coordenar toda a logística que visibiliza as aulas. Quando têm regatas na Ilhabela, o marido leva a lancha da família de Santos até o local. “Velejar é algo que realmente gostamos. No feriado de Corpus Christi, por exemplo, alugamos um barco de 42 pés e ficamos cinco dias e quatro noites entre Paraty e a Ilha Grande, no Rio”, conta Camila.

A arquiteta paulistana Vivian de Vasconcellos, 44 anos, tem uma rotina parecida por causa dos dois filhos mais velhos, de um total de três, também alunos da escola de vela do YCSA: Arthur, 10 anos, e Martin, 7. O marido, Arthur de Vasconcellos, conhecido como Pirata, foi atleta de ponta da vela. Com ele, Vivian já disputou provas oceânicas, como as 32 horas de regata entre Recife e Fernando de Noronha, em 2010, obtendo o terceiro lugar. “Geralmente eu cozinho para a tripulação, pois sou a única a não enjoar”, confessa ela.

Vivian é o retrato perfeito de uma matriarca de família que adotou a vela. “Ser mulher de velejador é incrível, mas quando seu filho veleja, esse mundo entra em você. Aprendi e me envolvi tanto, que isso também passou a ser a minha vida”, sintetiza a experiência de quase toda uma vida, com orgulho.