“A experiência no teatro me faz entender a história que preciso contar”, sentencia Seu Jorge, capa da Bazaar Man

Seu Jorge me atende por chamada de vídeo faltando pouco para chegar ao seu destino, a cidade de Paulo Afonso, na Bahia, onde faria um show. A viagem foi longa e cansativa, me diz, mas, com ele, não há tempo ruim. Com sorriso no rosto, o timbre de voz grave, que lhe rendeu a abreviação de senhor no nome, e muita disposição para um bate-papo, ele fala sobre tudo: a vida de ator, cantor, empresário e pai de Samba, de um ano recém-completado.

Vindo de um ritmo frenético de apresentações e muitos compromissos profissionais, Seu Jorge abriu, dias antes, o estúdio de sua produtora para o shooting. Como em todos os papéis, nas fotos feitas para Bazaar, o artista de 54 anos encarnou seu próprio personagem: “A experiência no teatro me faz entender a história que preciso contar”, explica. “Cada roupa reflete não só o momento, como também expressa uma personalidade. A cada troca de look, ela transforma sua narrativa e se revela uma nova versão”, sentencia.

Nosso papo terminou por vídeo, na Bahia, mas começou dias antes, cara a cara, na Black Service, além de produtora, hub criativo sob seu comando, em Barueri, na Grande São Paulo. É lá também que ele mora, no andar de cima, com a mulher Karina Barbieri e o filho. Seu Jorge também é pai de Maria Aimee e Flor, de 21 anos, e Luz Bella, de 18, as duas últimas de seu casamento com a empresária Mariana Jorge.

E foi justamente com a geração Z, a mesma de suas meninas, que o cantor viu crescer sua popularidade. Suas músicas foram descobertas por esse público, com um empurrãozinho do Funk MTG, uma montagem de sons, batidas e efeitos sonoros em hits consagrados. A faixa Quem Não Quer Sou Eu, do DJ Topo, alcançou o topo das paradas. “Chegou de forma abrupta e, de repente, virou uma linguagem.” Se ele gostou do resultado? “Aplaudi porque ele pegou uma canção clássica e a trouxe renovada, sem perder o conteúdo.”

Prestes a lançar o álbum Baile à la Baiana, em parceria com Peu Meurray e Magary Lord, ambos de Salvador, ele promete um resumo vibrante da música festiva e do povo brasileiro. “Salvador é uma capital com população preta superior a 80%, com raízes profundas nos povos originários e sertanejos”, conta. Para ele, a cidade carrega seu próprio “modo preto” de ser. “Quis contar um pouco dessa trajetória através de músicas como Lasqueira”, diz, cantarolando.

Sobre o novo projeto, Jorge explica as particularidades de unidade entre os músicos e, agora, propõe essa troca diante do público. “Somos contemporâneos e uma complexidade nos une: somos negros. Temos os mesmos pensamentos, o mesmo nível de simplicidade, gostamos das mesmas comidas e compartilhamos as mesmas preocupações com nossos filhos.” A sonoridade nordestina se encontra com a herança carioca em tracks “alegres, festivos e com batidas por minuto acima de 130”.

No capítulo atuação, quem não ama ver Seu Jorge nas telas? O protagonista de filmes sobre as vidas de Marighella e Pixinguinha brilha em estúdios do Brasil e de Hollywood. Fez amizades inesperadas, como a com o cineasta Wes Anderson, com quem rodou Asteroid City, e estará na próxima produção de Fernando Meirelles e Ernesto Solis, Corrida dos Bichos. “Meu personagem é intenso, tem uma vida difícil e uma grande preocupação com a família. Vive com pouco dinheiro, ameaçado constantemente com medo de ser despejado. É um cara com pouca mobilidade e muitos conflitos”, adianta.

Além desse, participará, ainda, do desdobramento para as telonas da série Irmandade, que será rodada no Rio de Janeiro ainda neste ano. “São filmes muito bonitos, que falam do jeito de ser do brasileiro.”

Com tantos talentos e em tantas frentes, Jorge Mário da Silva, seu nome de batismo, virou embaixador da cultura brasileira, título recebido do Ministério da Cultura. Quer construir pontes diplomáticas com países lusófonos, especialmente no Continente Africano, onde busca cidadania cabo-verdiana. “Quero desenvolver um triângulo, inicialmente, com Angola, Brasil e Cabo Verde. São países de onde vem minha herança africana. Sou recebido como filho e, como povo, temos semelhanças, principalmente musicais.”

E quando a gente pensa que não cabe mais nenhuma faceta nessa equação, eis que ele aparece tricotando e crochetando: “Pratico desde os 13 anos, é o tipo de handmade que me faz desacelerar”. Assim como os momentos de pausa ao lado da família. Quando terminou as fotos para a Bazaar, não perdeu tempo: foi correndo ao encontro de Karina e Samba, que estavam no estúdio, para jogar bola com o pequeno. Seu Jorge segue se reinventando e promete não parar por aí. Axé!