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ALERTA SPOILER: Lady Gaga (Harley Quinn) e Joaquin Phoenix brilham em Coringa: Delírio a Dois, um romance musical repleto de performances e um toque de loucura, sob a máxima: “mentes brilhantes pensam igual” (great minds think alike, em inglês). Mas o que significa pensar como essa carta fora do baralho quando, na verdade, você é um assassino em série que sofre de delírios?
A trama começa com a prisão de Arthur Fleck, após os acontecimentos do primeiro filme, de 2019, em que, vestido de “palhaço” e com um sorriso no rosto, ele assassina o apresentador Murray Franklin (Robert De Niro). Na penitenciária, os risos são raros e, com uma aparência cadavérica, Fleck vive uma rotina sossegada, repetitiva e distante da figura que o levou à prisão. No julgamento, sua advogada (Catherine Keener) discute com o promotor interpretado por Harry Lawtey sobre a questão: Coringa e Fleck são duas identidades separadas? Nesse momento, os fãs de quadrinhos vão pirar, já que o promotor está predestinado a se tornar o diabólico Duas-Caras – outro vilão de Batman. Será que vem mais uma sequência?

Joaquin e Lady Gaga em cena da sequência de “Coringa” (Foto: Divulgação)
A rotina de Fleck vira de cabeça para baixo ao conhecer Lee (Gaga) em um coral dentro da prisão. Ali, a música e as artes fazem – ou deveriam fazer – parte de um processo de cura e encontro consigo mesmo. Além das vozes em suas cabeças, eles trazem muito talento vocal em um repertório revisitado, que evoca a alma apaixonada desse casal em uma era pré-internet, provadas com TVs de tubo espalhadas pelas ruas de Gotham, dos amores fluidos e bem antes das problemáticas atuais para encontrar uma cara-metade.
Lady Gaga interpreta uma Arlequina manipuladora, que se mostra apaixonada por Arthur. Ou seria pelo Coringa? Ela traz uma “malícia astuta e manipuladora”, como bem destacou o The Guardian. Arlequina possui uma alma genuinamente perturbada, “de uma maneira que Arthur/Coringa talvez não seja”. No entanto, sua personagem não se desenvolve. Não por falta de tempo de tela, mas pela forma como suas ambições e personalidade são moldadas pelo contexto da prisão e sua ligação com Arthur.

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Se o filme se passasse nos dias atuais, não seria incomum ver Lee se expressando em redes sociais, compartilhando sua rotina enquanto aguarda o julgamento de Arthur e tentando dar sentido ao relacionamento deles de maneira pública, mas íntima. Arrisco dizer que ela lançou o álbum Harlequin, com outras camadas de sua personagem que não pudemos entender de fato no longa. Por isso, os indícios de que ela ganhará uma franquia própria só aumentam.
No longa de Todd Phillips, quando parece que o incurável Arthur Fleck está pronto para a redenção do supervilão, as coisas não seguem o esperado. Agora conhecido e aclamado por livros e filmes sobre ele, algumas pontas soltas deixam a desejar, embora a franquia, em 2019, tenha rendido ao protagonista o Oscar de Melhor Ator no ano seguinte.

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O riso frouxo e maquiavélico do personagem começa apagado, quando até mesmo um dos guardas (Brendan Gleeson) da penitenciária pergunta se Coringa não tem uma piada para eles, ou quando ele aceita dar uma entrevista a um repórter de TV (Steve Coogan), mas nada parece abalá-lo. A infância abusiva, as possíveis doenças mentais e os transtornos de personalidade se perdem em um gênero que mescla elementos musicais ao drama de tribunal – uma combinação arriscada, disseram as críticas especializadas do exterior.
Mas não é Bruce Wayne que faz falta em Gotham; são as camadas de Coringa e Arlequina que precisavam ser mais fiéis ao primeiro filme. Afinal, esta é – ou deveria ser – uma sequência que mergulha na mente brilhante e perturbada de seus protagonistas. A sacada genial da abertura, ao recontar a história ao estilo Looney Tunes, mostra a potência que o filme poderia ter alcançado se tivesse aprofundado as dualidades e contradições dessas “mentes brilhantes”, como prometido desde o início.

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