
O casal Luísa Bianchetti e Seba Orth posa no sofá Balo, com um biombo pintado por Luísa ao fundo – Foto: Ruy Teixeira, com direção criativa de Kleber Matheus, direção de arte Otávio Françoso, coordenação Mariana Simon (KM Studio), produção executiva Zuca Hub e produtora responsável Claudia Nunes
Por Paula Jacob
Em uma cidade como São Paulo, cada vez mais tomada por prédios sem personalidade, que substituem antigas construções carregadas de história e vida de bairro, encontrar um endereço que preserve suas características originais – ainda cercado por vizinhos similares e com o silêncio pairando no ar – é um verdadeiro privilégio. Mas, para descobrir esse paraíso, é preciso uma dose de sorte, timing e um olhar atento para as joias escondidas. Exatamente como foi para Luísa Bianchetti e Seba Orth, que, após inúmeras visitas, conseguiram, enfim, pegar as chaves do novo lar.
A casa, localizada no bairro do Pacaembu, em São Paulo, é um marco da arquitetura modernista paulistana, projetada em 1957 pelo arquiteto Joaquim Guedes e conhecida como Residência Cunha Lima. Não à toa, brilhou os olhos e o coração da dupla de criativos à frente do Estúdio Orth, escritório multidisciplinar que une arquitetura, design de interiores e mobiliário.

A casa azul, localizada no bairro do Pacaembu, em São Paulo, é vista em sua totalidade – Foto: Ruy Teixeira, com direção criativa de Kleber Matheus, direção de arte Otávio Françoso, coordenação Mariana Simon (KM Studio), produção executiva Zuca Hub e produtora responsável Claudia Nunes
“Fizemos um raio-x na região inteira. E por sermos da área, o corretor indicou que seria do nosso gosto, mas havia questões práticas pelo fato de estar há 15 anos fechada”, diz Luísa. “Foi ele abrir a porta que pensamos: ‘é aqui!’”
A estrutura de concreto armado aparente em formato de caixa, finalizada com grandes janelas de vidro, o jardim com vista para o bairro e a planta original foram algumas das características que nos conquistaram logo de cara. Apesar de todo o encantamento, Luísa e Seba tinham consciência da reforma que precisariam fazer. “Preservamos as estruturas basilares da casa, aumentamos um pouco o banheiro e o quarto principais, criamos uma cozinha de apoio para a área externa e refizemos toda a parte hidráulica e elétrica por causa do tempo que estavam sem uso.”
Ao todo, foram nove meses de revitalização e, desde dezembro do ano passado, estão curtindo a nova rotina. “Somos casados, sócios, trabalhamos juntos, moramos juntos. Antes de virmos para cá, estávamos em uma casa que tinha um andar de showroom das peças e outro que era a parte íntima. Foram quatro anos curtindo o corpo a corpo do Estúdio, mas sentimos que era hora de separar as coisas”, conta. “Somos apaixonados por nosso trabalho, e essa casa, agora, funciona como um laboratório, justamente porque nos aproximamos mais da parte criativa, de maneira natural.”
Os amplos ambientes, invadidos pela luz natural, que causa sensações cinematográficas, não possuem um projeto de interiores tradicional. Tudo acontece de acordo com o processo criativo dos dois, que ocupam, aos poucos, os cômodos e cantinhos da casa com as peças do Estúdio Orth e as obras de arte pintadas por Luísa. “É um grande ateliê, o fluxo criativo ficou mais saudável.”
Nascida em Brasília em uma família de artistas, ela sempre teve o avô, Glênio Bianchetti, como uma grande referência. Ele foi convidado por Darcy Ribeiro para fundar o departamento de artes da UnB e tinha um ateliê em casa, onde promovia um ambiente de trocas criativas. O pai de Luísa, arquiteto, trabalhou por muitos anos na Fundação Oscar Niemeyer e foi responsável pelo projeto do espaço que abrigava o ateliê do avô. “A casa dele estava sempre cheia de pessoas criativas, ele organizava exposições por lá e incentivava essa atmosfera de espaço compartilhado”, relembra Luísa. Agora, com o novo endereço, ela revisita essa conexão no dia a dia da família, com a presença também do enteado Rio, de 10 anos. “Fico fazendo essas associações justamente por ter crescido vendo os potes coloridos de pigmentos do meu avô. Ficava fascinada, e o Rio é curioso assim também, testa as tintas, rabisca, pinta.” As atividades em conjunto são intrínsecas à rotina: “Ficamos bastante em casa, curtindo também esses primeiros meses aqui. Ouvimos música os três juntos no meu ateliê, conversamos, pintamos”.

A poltrona Pilão, resultado de uma parceria com a Misci – Foto: Ruy Teixeira, com direção criativa de Kleber Matheus, direção de arte Otávio Françoso, coordenação Mariana Simon (KM Studio), produção executiva Zuca Hub e produtora responsável Claudia Nunes
Não à toa, virou também um ponto de encontro entre os amigos. Compartilhar o silêncio e a tranquilidade da nova casa é um jeito de deixar a todos imersos neste clima que respira arte e arquitetura. “Brincamos que aqui é um QG de ideias, porque, toda vez que as pessoas vêm para cá, inventamos várias coisas juntos.” Inclusive, foi daí que nasceu a collab com a Misci, de Airon Martin – a Poltrona Pilão é feita a partir de um desenho de três bases de madeira maciça, metal fundido e couro. “É um privilégio ter uma rede de amigos inspiradores.”
Além do novo endereço do Estúdio Orth, também no Pacaembu – “viramos extremamente bairristas” (risos) –, Luísa e Seba preparam novidades para os próximos meses. Ela pintou novos objetos que vão compor, pela primeira vez, o catálogo da marca. São biombos, luminárias, almofadas e espreguiçadeiras com interferências autorais, tudo pensado e executado na casa. “Foi um desafio criativo gostoso.” Não restam dúvidas.