Balenciaga – Foto: Divulgação

“Certamente, é o hábito mais vulgar e bárbaro que a mente excêntrica da moda já inventou. Pode servir para um marinheiro sem cultura, mas dificilmente para um aristocrata.” O brado escandaloso é de Ward McAllister, ativista do glamour e árbitro do social na Era Dourada dos Estados Unidos, em fins do século 19. Em retrospectiva, é uma ironia engraçada. Do outro lado do oceano, o Czar Nicolau II da Rússia, herdeiro da lendária dinastia Romanov, tinha orgulho do desenho de dragão em seu braço. Quase contemporânea, Sissi, Imperatriz da Áustria, também ostentava a imagem de uma âncora próxima ao braço. Não foram os únicos aristocratas a adotar o costume rebelde, mas serviram de exemplo para gerações futuras da alta sociedade. Sorry, Ward!

É quase impensável começar a narrar a história das tatuagens, enquanto modismo, a partir de uma perspectiva europeia, elitista ou, ainda mais, meramente estética. Essas marcas permanentes, afinal, têm origens milenares e raízes culturais e religiosas espalhadas por incontáveis civilizações.

Pense nos inuítes, maoris, vikings… até mesmo nos antigos egípcios. A questão, agora, é que, na moda, as tatuagens têm ganhado força como a estampa da vez – e com muita razão. Cheias de personalidade (e qualidade perene), possuem o atrativo de perpetuar legados no melhor dos costumes das maisons.
Mas calma, nada disso significa tatuar logos ou monogramas. Aliás, essa “base biológica” sequer tem sido a prioridade – é mais um exercício de ilusão de ótica. Quando o brasileiro Pedro Saci foi convidado por Demna Gvasalia para assinar designs exclusivos na coleção de verão da Balenciaga, a ideia foi mesmo a de criar desenhos que, impressos em tecido, dessem a sensação de realidade. Na moda, esse tipo de experimento teve Issey Miyake como vanguardista, quando lançou sua primeira coleção em 1971, em Nova York, com os rostos de Janis Joplin e Jimi Hendrix estilizados com os traços de irezumi, a tradicional tatuagem japonesa.

Para o designer nipônico, foi um movimento ousado: apenas em 1948, as tatuagens haviam sido legalizadas em seu país de origem e, até hoje, sofrem com a associação à máfia. Esse movimento, político por essência, influenciou outros criativos igualmente inspirados pelo zeitgeist das tattoos. Em 1989, Martin Margiela lançou blusas transparentes com estampas de arte corporal e, cinco anos depois, Jean Paul Gaultier estreou a lendária coleção Les Tatouages. Na Europa, a estética trazia como principal referência a cultura dos marinheiros, enquanto os Estados Unidos, coberto por estradas, levantou a bandeira da cultura motociclista. Na virada do século, a etiqueta-ícone da cultura pop americana, Von Dutch (recém-redescoberta pela Gen-Z), recebeu Christian Audigier como estilista que, no frisson das tatuagens que reinstituiu na marca, acabou indo trabalhar na linha de roupas do tatuador-celebridade Ed Hardy, em 2004. Na era Y2K, calças de cintura baixa e a febre da pele à mostra criaram ainda mais espaço para pintar o corpo – uma tendência que nunca mais saiu de moda. E nem adianta esfregar: as tattoos ficam e o estilo também!