
Karl Lagerfeld foi diretor criativo da Chanel por 36 anos e da Fendi por mais de 50. O estilista alemão faleceu em 2019, aos 85 anos – Foto: Divulgação
Por Cassio Prates e Eve Barboza
Não são apenas os diretores criativos das marcas de luxo que vivem uma grande dança das cadeiras. CEOS e diretores de marketing também têm enfrentado mudanças significativas. Poderíamos encerrar o texto aqui, apontando os motivos óbvios: a economia incerta para os próximos anos, a queda de vendas no mercado de luxo (especialmente na China) e a alta inflação global. No entanto, buscamos oferecer uma visão mais ampla sobre esse movimento, até porque as pessoas continuam consumindo, e o luxo nunca foi um tema tão amplamente discutido.
Essas mudanças estruturais começaram com os diretores criativos. Algumas marcas adotaram estratégias rápidas e surpreendentes, como a Valentino, que trouxe Alessandro Michele para substituir Pierpaolo Piccioli. Outras movimentações foram mais breves, como as passagens de Peter Do na Helmut Lang e Ludovic de Saint Sernin na Ann Demeulemeester. Já marcas como Chanel têm demonstrado maior cautela, adiando a escolha de um novo diretor criativo desde o início do ano. O fato é que, atualmente, é raro encontrar diretores criativos que permaneçam mais de cinco anos em uma mesma casa. Um contraste marcante com a era de Karl Lagerfeld, que foi diretor criativo da Chanel por 36 anos e da Fendi por mais de cinco décadas. O lendário estilista alemão, que faleceu em 2019 aos 85 anos, simboliza um tempo em que a longevidade criativa era a norma – algo que parece quase inalcançável no cenário atual.
Esse cenário de mudanças também alcançou o nível CMO. No mês passado, Stefano Cantino foi nomeado executivo-chefe da Gucci, a principal marca do grupo Kering. Ao mesmo tempo, Cédric Charbit, ex-chefe da Balenciaga, assumiu a liderança da Saint Laurent, a segunda maior marca do grupo, enquanto Gianfranco Giannangeli substituiu Charbit na Balenciaga. Giannangeli, que ingressou na holding no ano passado como diretor comercial da Saint Laurent, anteriormente atuou como CEO da Margiela por três anos.
A reorganização começou após Francesca Bellettini deixar a Saint Laurent para se dedicar exclusivamente ao cargo de CEO adjunta do grupo Kering. Sob sua liderança, as vendas da Saint Laurent saltaram de 557 milhões de euros em 2013 para 3,2 bilhões de euros em 2023, ano em que foi promovida. Francesca, uma das mulheres mais influentes da indústria, destacou-se por priorizar o legado da marca, colocando-o acima de qualquer celebridade ou estratégia de relações públicas. Sua gestão consolidou a YSL como símbolo do estilo parisiense de luxo. No entanto, nos últimos meses, as vendas caíram 9%, principalmente devido à redução nas vendas de bolsas e acessórios, que tradicionalmente sustentavam o faturamento da marca.
Já Cédric Charbit, que trabalhou com Demna na Balenciaga de 2016 a 2024, foi fundamental para equilibrar a imagem e as vendas da marca após um escândalo envolvendo campanhas controversas e o esgotamento de produtos icônicos, como tênis e moletons streetwear. Sob sua gestão, a Balenciaga apostou em novas bolsas clássicas, como os modelos Rodeo e Bel Air, lançados em 2024, além de fortalecer sua oferta de alta-costura. Esses movimentos podem sinalizar a direção que ele levará para a Saint Laurent. Por outro lado, Gianfranco Giannangeli pode trazer para a Balenciaga um toque de exclusividade e inovação, inspirado em suas experiências na Margiela.
Paralelamente, o setor da moda se prepara para um 2025 particularmente desafiador, como apontado pelo relatório anual State of Fashion 2025, produzido pela McKinsey em parceria com o Business of Fashion. Além dos fatores econômicos e da inflação, o mercado enfrenta o aumento expressivo de “dupes”, a aceleração da crise climática e uma remodelação do comércio global, tanto em suprimentos quanto em vendas. O manual antigo já não se aplica, e a indústria precisa encontrar novos caminhos que vão além de produtos ou estratégias midiáticas.
Andy Warhol disse que os últimos cinco anos de uma década são os que definem sua essência: “É quando as pessoas dos primeiros cinco anos se tornarão parte do futuro ou parte do passado”. Outra frase famosa afirma que “não se mexe em time que está ganhando”. Porém, a realidade é que todos estão tentando acertar e se posicionar para encerrar a década com força, mesmo sem saber ao certo como fazer isso. A questão central é: será que ainda há espaço para crescer sem comprometer a exclusividade? Os novos comportamentos de consumo apontam para um abismo geracional, cultural e econômico entre quem está dentro e quem está fora das empresas. Talvez o público consiga expressar isso melhor que os executivos. Veremos.