
Fotos por Zé Takahashi
A Silvério apresentou sua coleção Primavera/Verão 2026 na FAUUSP, em um desfile que uniu moda, arquitetura e academia de forma simbiótica. A escolha da locação foi um dos assuntos mais comentados entre os convidados: além da beleza da arquitetura, o ambiente acadêmico ganhou força com a participação ativa de estudantes de Design e Arquitetura, estreitando os laços entre criação e formação. A mistura de moda, arquitetura e academia é algo muito entrelaçado à vida do diretor criativo.
“A gente estava habituado a trabalhar com uma plataforma que sedia grande parte da infraestrutura. Levantar essa estrutura por conta própria foi desafiador nesse sentido — enfrentamos várias questões para as quais não estávamos preparados. Mas acho que tivemos uma sacada muito legal, que foi cruzar tudo isso com a educação. Educação é uma coisa que move o meu coração. Eu, sem educação, não estaria aqui falando com vocês de alguma forma. Sou movido por políticas públicas que me colocaram em lugares de saber. Dividir isso com alunos, dentro desse prédio maravilhoso da FAUUSP, dialogar com o design, com a arquitetura… é algo que a Silvério quer ampliar: falar dessa afrodiáspora brasileira com sotaque brasileiro, com pegada paulistana. A escolha do espaço tem muito a ver com entendermos essa relação do saber dentro da academia — e também os nossos saberes ancestrais dentro desse mesmo espaço. E, obviamente, continuar falando com os alunos, continuar invocando e provocando novos criativos e criadores. Essa é uma das principais mensagens que eu quero ecoar”, comenta Rafa Silvério para a BAZAAR.
Intitulada Reluz — conjugação do verbo reluzir, que significa “brilhar intensamente” —, a coleção marca mais um momento de brilho do diretor criativo Rafa Silvério. Inspirada no álbum Luz, do cantor e compositor Djavan, a proposta nasce do despertar sensível provocado pelas canções e da valorização da imagem da beleza negra.
“Toda a inspiração veio de um processo de audição do áudio do álbum. No primeiro momento, a gente fez um processo de entender o que despertava os sentimentos em cada um. Numa segunda rodada de audição, a gente foi fazendo livre associações, simbologias, resimbolizações do que poderia ser essa ideia de reluzir essa coleção, né?”… “A principal mensagem desse desfile é que a gente tenha liberdade para ter várias referências de moda afro no país. Temos vários outros designers negros superpotentes. Esse é um momento mais maduro da marca, no qual realizamos nosso primeiro show independente, fora de algumas plataformas com as quais já flertamos no passado”, afirma Rafa.
O resultado foi uma coleção impactante. A entrada dos modelos pelas passarelas do prédio da FAUUSP, com um casting potente e roupas que resgatam memórias afetivas e reafirmam os códigos da marca, emocionou o público. O styling, assinado por Alberth Franconaid, e a maquiagem de Katia Araújo, da MAC Brasil, exaltaram a beleza única e delicada de cada modelo.
“O guia do Silvério para essa coleção é o álbum Luz, do Djavan. E a gente traduziu isso para a maquiagem como texturas diferentes sobre essa pele. Então, vocês vão ver pontos mais matificados e pontos mais luminosos, com diferentes estilos de brilho — mais acetinado, mais lustroso, em alguns pontos. Esse rosto vem com uma estrutura muito interessante, e com tonalidades que vêm do tom natural da pele. Então é uma maquiagem de beleza — uma maquiagem bastante bela, mas muito sensível, que respeita a individualidade de cada modelo. Todos os tons foram trabalhados em cima da pele de cada um”, contou Katia sobre a assinatura da beleza da coleção.
A importância da moda negra
“Essa é uma coleção em que a gente quis fazer um casting todo racializado. A gente quer reforçar uma estética negra — uma estética negra não estereotipada. Falar de uma forma de expressão genuína, afastando alguns estereótipos racistas do que é moda negra no país, do que é moda afro. Queremos trazer uma ideia mais cosmopolita. Ao mesmo tempo, também é um tema muito solar. A Silvério, por muito tempo, escolheu olhar para lugares mais melancólicos, mais reflexivos. Não que este seja simples — entretanto, ele tem uma leveza e uma fluidez.
Um dos desafios que nos propusemos foi pensar esse verão: o que seria essa bossa? Essa mulher negra, essa musa inspiradora, essa pétala do Djavan pensada nesse verão brasileiro, nessa bossa? Tudo isso mantendo os códigos da marca que a gente vem desenvolvendo, como os cortes espiralados. Essa alfaiataria aqui está mais recortada, mais espiralada, mais próxima ao corpo. E, ao mesmo tempo, trazemos alguns exercícios voltados para a moulage, com vestidos em crepe, acetinados, em seda.
A grande novidade está justamente nessas experimentações. A maior dificuldade técnica foram os vestidos. Para mim, que adoro tecidos mais estáveis, lidar com uma matéria-prima que ainda é um flerte… não sei se está tão resolvida. Mas pensamos essas experimentações justamente para abrir também esse espaço dentro da marca — de levar a ideia espiralada para tecidos mais lânguidos e mais fluidos.”