A defesa de um gol na Praia de Copacabana, registrada pelas lentes do fotógrafo Thomaz Farkas, em 1947, e outras duas dezenas de imagens que têm como foco o futebol são o pouco que se pode encontrar sobre as modalidades olímpicas na exposição que está em cartaz no Museu de Arte do Rio e foi pensada justamente para o período dos Jogos, que ocorre entre 5 e 21 de agosto. Dentro das atividades esportivas, vê-se alguma coisa de asa-delta, skate, jiu-jítsu e até mesmo highline, a prática de andar sobre uma fita elástica que virou febre nas praias cariocas – nada disso é considerado, no entanto, esporte olímpico. No lugar das fotografias que circulam por aí sobre o tema, com atletas de corpos esculturais e movimentos que parecem orquestrados magistralmente, entram registros dos músculos de um travesti que vive em um casarão na Lapa; dos ângulos que formam as pernas ágeis de um policial enquanto persegue um jovem do Movimento Estudantil de 1968, que acaba morto durante a ação; e da fluidez dos passos dos capoeiristas na roda do Cais do Valongo, por onde milhares de escravos entraram no Brasil.
Quando os curadores Paulo Herkenhoff e Milton Guran se propuseram a realizar a exposição em época de Olimpíada, o foco não foi o esporte, nem os atletas, mas sim as Linguagens do Corpo Carioca [A Vertigem do Rio], como bem indica o título da mostra. “Precisávamos apresentar a cidade ao estrangeiro, tanto de outros países como de outras regiões do Brasil”, diz Guran, carioca de 68 anos que sempre viveu na capital fluminense.
“O que me surpreende é como o Rio de Janeiro pode reunir, ao mesmo tempo, a maravilha e o horror”, completa. “E isso está na seleção”, revela, lembrando do contraste entre a paisagem da Pedra da Gávea durante a prática de highline e os caixões enfileirados após a chacina de 21 pessoas na Favela de Vigário Geral, em 1993 – registros que estão à mostra na exposição, que segue em cartaz até 9 de outubro.
A diversidade que compõe Linguagens do Corpo Carioca aparece sob os olhares de grandes expoentes da fotografia, como Thomaz Farkas, Pierre Verger, Marcel Gautherot e Nair Benedicto, mas também inclui desenhos de Cecília Meireles, pinturas de Di Cavalcanti e aquarelas de Jean- Baptiste Debret e Johann Moritz Rugendas, pintores que retrataram a sociedade carioca ainda em formação, documentando os diferentes estratos da sociedade em registros que se tornaram quase uma iconografia dos tempos imperiais.
São, ao todo, cerca de 800 imagens de mais de 160 autores. Para chegar a esse amplo recorte, os curadores contaram com dois pesquisadores, que buscaram apresentar o Rio de Janeiro desde a sua formação, abordando a herança negra, indígena e portuguesa, até os dias atuais. “Partimos da ideia de que o corpo fala, às vezes, com mais expressividade do que as próprias palavras e de que gestos corporais ajudam a expor a cidade. Então, analisamos o corpo do indivíduo isolado, o corpo em diálogo com o coletivo e os corpos individuais e coletivos em contato com a cidade”, afirma Guran. “Sabemos que toda classificação é reducionista, mas procuramos reduzir de forma abrangente”, pondera. Até 9 de outubro :: museudeartedorio.org.br