
Cerâmica, pedra, alumínio e plissado viraram cadeira, vaso e poltrona, com o mesmo raciocínio de coleção, pesquisa e assinatura. Foto: Reprodução
Em 2025, designers que já tinham um vocabulário próprio no vestir começaram a aplicá-lo ao habitar. Não como “projeto especial” para foto, e sim como trabalho mesmo: peça que precisa aguentar uso, peso, tempo, mão em cima, corpo em cima. Ou seja, um móvel para o lar.
Waldick Jatobá, diretor do Instituto Campana, coloca essa migração num lugar simples: quando a estética puxa a criação e o pensamento é 360°, a mesma linguagem pode existir em campos diferentes, do vestir ao espaço, sem perder força. “Acredito que a busca pela estética, seja na moda, no design de produto e/ou na arquitetura, será sempre o agente provocador da criação. Alguns fashion designers têm bastante sensibilidade para uma criação 360°. Foi o caso do Lagerfeld e é o caso do Maurício Galante. Desde que essa criação seja verdadeira, não importa em qual setor ela é aplicada; o resultado será sempre muito bom.”
Na prática, estilistas e designers de moda pensam com profissionais do design como materializar a aura da marca em objetos que conversem com o look e ampliem esse universo. E, muitas vezes, é essa colaboração que abre caminho para o modista entrar no design de interiores. A porta de entrada, para alguns, foi a mesa. A Carolina Neves levou a linguagem da joalheria para a cerâmica na “Linha Home”, com bowls e castiçais esmaltados, formas arredondadas, cor marcada, listras e um toque dourado que funciona como assinatura.
Se a cerâmica vem com cor e acabamento, Andrea Colli e Marcus Bernardes vão para a rocha, com vasos numerados e únicos, feitos de fragmentos que se encontram no processo. A pesquisa começa no argilito e vai abrindo caminho para outras pedras, com uma técnica de junção que assume que a matéria carrega memória.
Da rocha, o salto vai para um raciocínio mais industrial. Formado em Design Industrial, Pedro Andrade lança mobiliário com o estúdio Clube e apresenta junto da coleção “Nonhuman Life”, na flagship da Piet, em São Paulo, em 9 de dezembro. A estreia vem com cadeira e mancebo de alumínio, em duas cores, pensados a partir de leveza e resistência como problema prático, com um imaginário de biomimética que ele puxa para insetos.
Em vez de tentar abraçar o assunto inteiro de uma vez, a Ana Cecília Gromann entra com recorte. A AC Gromann estreia com o “Conjunto Mobiliário Pan”, poltrona e mesa lateral desenhadas a partir da referência à artista Marta Pan. Madeira maciça faveiro, desenvolvimento com o estúdio Poraneo, venda por encomenda. Começar por um conjunto fechado ajuda a entender a intenção: entrar, testar, entender o lugar.
A dobra, que na roupa é método e assinatura, aparece no mobiliário como estrutura mesmo. Na colaboração entre Neriage e Folio, a Rafaella Caniello leva o plissado para fora do corpo e para dentro da casa, transformando textura em volume e relevo, sem depender de discurso sobre “misturar moda e design”.
Outra chave é tratar estofado como edição. Na colaboração com a Feeling, o Alexandre Herchcovitch cria oito composições de tecidos para a poltrona Elefante, desenho de Mauricio Bomfim, em edição limitada de 150 peças numeradas. A lógica é simples: cada tecido vira um look. “Minha proposta não foi alterá la, mas sim criar uma nova camada de expressão”, disse à Bazaar no lançamento das peças.
Quando o material vira ponto de partida, o mobiliário muda de tom. Em “RITOS”, Jay Boggo e Bruno Rodrigues colocam a pedra como protagonista e constroem o resto do sistema em diálogo com aço carbono, pedra sinterizada e materiais biotecnológicos como micélio e um revestimento derivado de folha orelha de elefante. A coleção reúne aparador, bancos, mesa lateral, cadeiras e poltrona. Jay resume o tipo de respeito que esse processo exige: “A pedra pede respeito. Se forçada, quebra.”
E, vindo da joalheria, o Carlos Penna amarra esse movimento sem precisar se transformar em manifesto. Ele trata a cadeira como continuação natural do próprio raciocínio, “pequenas arquiteturas para o corpo”, só que ampliadas, com foco em estrutura, peso, vazio e movimento. A origem da peça nasce de uma decisão rápida: imaginou uma cadeira que pudesse virar bolsa e ligou para Ingrid no mesmo dia, colocando design e corpo para funcionar sem hierarquia.






