André Lamoglia fala sobre evolução, propósito e novos desafios na carreira

 

Por Rener Oliveira

O ator carioca André Lamoglia, de 28 anos, fala pausadamente, com a segurança de quem vive um bom momento. A palavra “gratidão” surge várias vezes na conversa com Bazaar Man, não como clichê, mas como consciência do caminho que vem construindo. Desde 2015, quando estreou no teatro, ele trilha uma trajetória consistente: passou pelo Disney Channel, ganhou projeção internacional com Elite (Netflix) e agora retorna ao Brasil em fase de maior clareza sobre a própria carreira. Esse novo capítulo vem com Os Donos do Jogo, série nacional da Netflix lançada no fim de outubro. Criada e dirigida por Heitor Dhalia, a produção traz Lamoglia como Profeta, personagem ambicioso e complexo, imerso na máfia do jogo do bicho carioca, ao lado de Juliana Paes, Mel Maia e Chico Díaz. Mais do que o desafio de protagonizar um grande projeto, André destaca o desejo de voltar ao país com papel que o tirasse da zona de conforto. “Lá o roteiro é achei incrível. Eu e o Heitor fomos desenvolvendo juntos e deu tudo certo. O que mais me motivou foi voltar ao Brasil com um projeto desse porte, ao lado de um profissional tão renomado quanto o Heitor. Além disso, é um protagonista muito diferente de tudo o que já fiz, que me levou a explorar outras facetas como ator.”

 

Apesar de ser carioca, Lamoglia admite que pouco sabia sobre o universo que inspirou a série. “Eu não conhecia essa realidade da máfia carioca, então esse foi um desafio na construção do personagem e, ao mesmo tempo, algo que me aproximou da cidade. O elenco é 100% do Rio, justamente para trazer esse espírito local. Mergulhei nesse universo e fiz muitos estudos.”

 

O novo trabalho marca uma virada na trajetória de Lamoglia. Ele reconhece que o drama espanhol foi um divisor de águas, mas vê Os Donos do Jogo como um passo adiante em complexidade e controle criativo. “Elite fez parte da minha vida. Entrei em um projeto já em andamento e com alcance mundial — foi a chance de mostrar meu trabalho. Agora, acredito que será levado para outros lugares também. Não fico pensando lá na frente, no que é esperado em termos de sucesso. Meu foco é o processo, em entregar o melhor personagem. O que vem depois é consequência.”
Ele fala sobre essa fase com naturalidade. Há uma visão clara sobre tempo, escolha e propósito. Para André, construir uma carreira sólida é pensar a longo prazo. Com sua equipe, planeja os próximos passos de forma coletiva. “Cada um tem sua ambição, trajetória e jornada. Não existe certo ou errado, só somos diferentes. Sou muito grato às oportunidades que tive, porque cada projeto me transformou. Hoje, penso além do agora. Poder escolher e lutar pelos trabalhos que quero fazer é um privilégio.” O ator também comenta o bom momento do audiovisual brasileiro, que vive uma visibilidade inédita.

“Temos um filme indicado ao Oscar, o Ainda Estou Aqui, e grandes chances de concorrer com Agente Secreto, com o Wagner Moura. Fico feliz de ver o mundo conhecendo nossas histórias e nosso trabalho. O streaming trouxe esse alcance global— antes, um projeto ficava restrito ao país; agora, é lançado simultaneamente em vários lugares do mundo.”
Longe de vaidades, André vê a imagem como extensão do ofício. A exposição faz parte, mas é a atuação que guia suas escolhas. Para ele, atuar é um exercício de expressão, não de persona. “É importante diferenciar o ator do personagem. Não busco uma imagem de galã, busco crescer como ator e fazer bons projetos. Claro que isso reflete na minha imagem, e está tudo bem, mas não é algo que eu persigo. Tenho clareza do que é importante para mim e para a minha carreira.”

Nos últimos anos, essa consciência também se estendeu à moda. O interesse, que começou pelo estilo pessoal, evoluiu para uma relação próxima com marcas e desfiles. “Com o tempo, surgiram oportunidades e comecei a me envolver mais. Vejo a moda como algo diretamente ligado à atuação: o figurino ajuda a construir o personagem. Quando faço prova de roupa, já começo a materializá-lo. Hoje, frequento desfiles, tenho proximidade com marcas e sou muito grato por essas portas abertas. Eu me visto para me sentir bem, me expressar e transmitir o que sinto.”
A relação com a moda vai além do gosto. Lamoglia é hoje um nome consolidado no mercado publicitário, com campanhas para Bvlgari, Armani, Dior, Carolina Herrera, Fendi, Ralph Lauren, Moschino, Prada e Dolce&Gabbana. Seu trânsito entre o cinema e a moda é natural — enxega ambos como espaços de narrativa, onde estética e identidade se encontram.
Em meio às gravações, costuma guardar objetos que o conectam às histórias que vive em cena, numa forma simbólica de preservar experiências. “Já pedi sobremesa (risos) algumas coisas dos meus personagens. Guardei, por exemplo, uma lycra de um papel que fiz para a Disney, o uniforme do Iván (do Colégio Las Encinas) e, em Os Donos do Jogo, levei uma lembrança. Gosto de guardar esses objetos como lembrança, para eternizar os personagens.”

Fora das câmeras, André desacelera. Prefere estar entre pessoas que o conhecem antes da fama e o mantêm ligado às origens. “Sou muito seletivo e cercado de pessoas queridas, que me fazem bem e conhecem o André de antes de tudo isso. São elas que me fazem voltar às raízes e viver de forma simples, com muito amor — esse sou eu no dia a dia.”
Cita Leonardo DiCaprio, Wagner Moura e Fernanda Torres entre suas referências — nomes que admira pela consistência. Mas sua maior inspiração vem da vida comum. “O trabalho do ator é observar, porque interpretamos vidas, e elas acontecem nas ruas.”
Com foco e olhar apurado para o ofício, André Lamoglia segue observando e vivendo, como quem sabe que maturidade é continuar em cena mesmo quando as luzes se apagam.