
Novo álbum chega depois de quase seis anos (Foto: Julia & Vincent)
Depois de um retorno catártico no Coachella, o duo francês Justice – formado pelo falante Xavier de Rosnay e o tímido Gaspard Augé – lança o álbum Hyperdrama (Universal Music). De passagem por Monterey, no México, enquanto o primeiro se deliciava com uma torta de morango, o segundo dava pequenos tragos em seu vape. “É como estar nu diante de um exército de zumbis. Vamos apenas observar o que acontece. Mas está tudo bem. Sabemos onde estamos, nossa música é de nicho, não é para todos, e estamos em paz com isso desde o início”, conta a dupla via Zoom. “Vamos ver como as coisas se desenrolam, mas não vamos seguir tendências nem nos adaptar à forma como a música está sendo ouvida ou aos aspectos sociais. Isso só nos sugaria.”

Um dos feats. do álbum é com Tame Impala (Foto: Julia & Vincent)
O projeto do álbum começou em fevereiro de 2020, uma semana antes de o mundo ser surpreendido pelo lockdown da Covid-19, e só retomaram em junho daquele ano, quando puderam voltar para Paris. O trabalho tem 13 faixas, com colaborações de peso do naipe de Tame Impala, Flints, Connan Mockasin, Miguel, RIMON e Thundercat. Quando fazem uma batida, e acham que ficariam na voz de alguém, ficam esperando o momento certo para fazer o convite. “Quando sentimos que a música cabe bem com alguém, fazemos uma abordagem, e acontece da maneira mais simples possível. Nos encontramos em uma noite, ouvimos música, conversamos e vemos como isso pode acontecer. E, então, uma janela se abre para executarmos. Com cada um deles foi assim. Nos juntamos para ouvir as tracks, falamos, e depois nos vemos de novo para trabalhar nas faixas”, explica Rosnay.
O álbum vai do house ao electro, passando pelo Pop e R&B, com uma boa dose de riffs marcantes e poderosos beats. “A principal preocupação era nos divertirmos, fazer algo brincalhão e também abrupto entre uma faixa e outra. Nunca pensamos que temos de superar algo ou nós mesmos. É uma mistura de funky, disco, com um jazz suave em alguns momentos. Queríamos experimentar um lugar que nunca havíamos explorado. Para nós, tinha que ser algo animado e nos entreter, com uma pitada de surpresas ao longo da audição”, resume Augé. Leia a íntegra do papo:

Xavier de Rosnay e Gaspard Augé (Foto: Julia & Vincent)
O que colocaram no álbum e entenderam que era marca de vocês?
Não sabemos qual é a nossa assinatura. Assinamos músicas tão diversas, como Stress, Genesis ou D.A.N.C.E.. É ao mesmo tempo reconfortante e desafiador nos identificarmos. Mergulhamos nessa assinatura porque é harmoniosa, vai além de simples acordes e melodias.
Ao produzir uma música, podemos usar apenas um piano ou um riff simples, mas ambos sentimos imediatamente se ela pertence ao Justice. Mesmo feitas pela mesma pessoa, se você pegar um disco do Justice, é capaz de reconhecê-lo e perceber diferentes emoções. O ponto comum entre todas as nossas músicas é, novamente, um certo tipo de harmonia e a forma como soa e é produzido. É possível identificar a banda pela forma como as músicas são escritas.
O lançamento anterior de vocês foi Woman Worldwide, de 2018. E o cenário musical mudou, não apenas pela pandemia, mas pela ascensão dos serviços de streaming até as dancinhas trend no Tik Tok. Como enxergam o panorama com o qual Hyperdrama se depara em 2024?
Honestamente, não absorvemos tudo isso. Parece ser informação demais, vai contra nosso instinto e a maneira como fazemos música. Como vemos o Hyperdrama neste mundo? É como estar nu diante de um exército de zumbis. Vamos apenas observar o que acontece. Mas está tudo bem. Sabemos onde estamos, nossa música é de nicho, não é para todos, e estamos em paz com isso desde o início.
Vamos ver como as coisas se desenrolam, mas não vamos seguir as tendências, não vamos nos adaptar à forma como a música está sendo ouvida ou aos aspectos sociais relacionados a ela. Isso só nos sugaria. O problema é que, ao tentar se adaptar a algo, você já está atrasado quando finaliza, porque as coisas mudaram novamente. Isso seria impossível para nossa essência. Então, vamos apenas seguir o nosso caminho.
E de onde vem o nome?
O nome vem do drama como forma teatral. Dentro do drama, há o melodrama, onde tudo é exagerado – a atuação, as emoções, os aspectos trágicos, cômicos e românticos. Para nós, o hyperdrama está um nível acima, onde tudo é ainda mais exagerado e fantasioso. É como se fosse uma versão exagerada do melodrama. Não tem nada a ver com o drama tradicional, onde algo terrível aconteceu. Na verdade, está mais ligado à forma narrativa que nos interessa.
Foi uma maneira eficaz de representar a música de forma simples e marcante, porque a vemos como uma pura fantasia, transbordando em todos os sentidos. É como um grande filme de ação – já viu Akira? É como isso, um enorme espetáculo tomando formas insanas. E “hyper” traz essa ideia de futuro digital, tudo acontecendo rápido, múltiplas narrativas. Assim é como vemos a música, na nossa opinião.

Gaspard Augé e Xavier de Rosnay (Foto: Julia & Vincent)
A última vez que se apresentaram no Brasil foi em 2012, no festival Sónar. Podemos esperar vocês aqui?
Adoraríamos. Estávamos tentando ir, mas tudo depende. Há tantas coisas que queremos fazer, mas infelizmente temos de recusar porque é fisicamente impossível estar em todos os lugares ao mesmo tempo e cumprir todos os compromissos. Então, esperamos que sim, mas não podemos prometer nada. Infelizmente!
O álbum Cross (2007) é um marco para aqueles que foram adolescentes nos anos 2000. Vocês planejam comemorar o 20º aniversário?
Não, não estamos planejando nada do tipo. Acreditamos que já entregamos tudo o que podíamos durante aquele período. Quando finalizamos o álbum, saímos do estúdio, que era um porão em Paris, e nunca mais voltamos lá. Então, todo o material que usamos para criar o álbum ficou lá, e não temos ideia do que aconteceu com ele desde então.
Lançamos algumas das músicas que tínhamos, e, para ser honesto, estamos muito orgulhosos do resultado. Foi uma experiência transformadora para nós, mas não somos nostálgicos. Quando se trata de celebrações, deixamos para a gravadora. Adoramos o álbum, mas não estamos planejando uma grande comemoração. Quer dizer, com certeza haverá algumas coisas acontecendo, mas acreditamos que já demos tudo o que tínhamos desse álbum.

Xavier de Rosnay e Gaspard Augé (Foto: Julia & Vincent)