Dries Van Noten verão 2026 – Foto: Divulgação

Por Cassio Prates e Eve Barboza

Parece exaustivo ter que se preocupar com o que as pessoas vão usar na próxima temporada. Um trágico desperdício de talento, já que as modas parecem tomar outros sentidos e preocupações — que oscilam entre vender e/ou se posicionar como inquestionáveis, enquanto o mundo anda dando aulas de realidade nada auspiciosas. A semana de moda masculina confirmou um pouco esse pensamento comum: está difícil, mas precisamos pensar no futuro.

Willy Chavarria foi quem trouxe o presente mais escancarado — modelos saíram em fila única e se ajoelharam, com as mãos atrás das costas, como se estivessem algemados, todos de camisa branca — como nas imagens da mídia de homens detidos em El Salvador. A imagem era atormentadora e bem menos colorida, como a própria realidade.

Rei Kawakubo, da Comme des Garçons, disse que estava pensando no líder político que o mundo precisa — e que provavelmente não virá. Ela fala de alguém poderoso, como um xamã, que voltasse para conduzir paz, amor e fraternidade. Da mesma forma, Miuccia Prada sugeriu uma mudança radical, para um novo lugar — que não fosse este aqui. A coleção abriu um espectro: você pode ver o que quiser ver.

É interessante pensar que duas mulheres, que há décadas são um termômetro do seu tempo, pensaram a moda de forma semelhante nesta temporada — mesmo com estéticas completamente diferentes — abrindo possibilidades em momentos que parecem não oferecer saída.

Prada verão 2026 – Foto: Divulgação

Pode-se fazer uma fácil associação entre tudo isso e o documentário HyperNormalisation, de Adam Curtis, que narra como a política foi derrotada pela ilusão — enquanto pessoas desistiram de mudar o mundo e se refugiaram no ciberespaço (que pode ser, também, o Instagram ou closets cheios de novidades). Esse mundo simplificado passou a ser administrado por um tipo de percepção instrumental, que sempre fecha narrativas em forma de entretenimento, com pouca margem para pensamento.

E aí, para além das duas grandes “mamães” da temporada — Miuccia e Rei — quem mais abriu espaço para pensar, ao invés de simplesmente fugir ou se evangelizar numa estética?

Dries Van Noten, com um homem mais fluido e colorido, que parece ir trabalhar depois de uma noitada na praia. Ou Jonathan Anderson, misturando gestual moderno com o acervo da maison Dior, fez com que as pessoas mais se admirassem do que se impressionassem com sua estreia — abrindo espaço para possibilidades. Para além do shape curto, da explosão de cores e dos flats — mas também com eles.

Não à toa, HyperNormalisation é o documentário preferido de Jonathan Anderson.