No mar, concentração absoluta, leitura fina do vento e experiência acumulada ao longo de décadas (Foto: Divulgação)

Por Matheus Krüger

Poucos atletas atravessam décadas sem perder tração. Menos ainda conseguem se reinventar enquanto seguem competitivos. Paul Cayard faz parte desse grupo raro. Nascido em São Francisco e moldado desde cedo pela vela, ele construiu uma trajetória que desafia o tempo: títulos mundiais em diferentes classes, passagens decisivas pela America’s Cup, pódios internacionais e a vitória na histórica Whitbread Round the World Race. Aos 66 anos, segue em atividade, competindo em alto nível e ampliando um currículo difícil de igualar.

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Fora d’água, Cayard também se consolidou como uma das vozes mais respeitadas do esporte. Líder nato, mentor de novas gerações e um dos embaixadores mais longevos da Rolex, ele personifica valores como constância, precisão e savoir-faire. No Rio de Janeiro, conversamos com ele sobre carreira, longevidade, legado e a relação profunda com o mar. A seguir, um encontro de Bazaar Man com o velejador no Iate Clube da Cidade Maravilhosa.

Bazaar Man (BM) — Você recentemente conquistou novamente o título mundial da classe Star, 37 anos após o primeiro. O que esse feito representa para você em termos de legado e evolução pessoal?
Paul Cayard (PC) — Foi um feito enorme, talvez ainda mais significativo do que quando venci pela primeira vez, aos 28 anos. Ganhar agora, aos 66, mostra que cuidei do meu corpo e da minha mente ao longo da vida. Treino todos os dias, e isso me mantém capaz de competir com velejadores 40 anos mais novos. Vencer a Star já é especial em qualquer momento, conquistar o título novamente, depois de tantas décadas, é profundamente gratificante. Prova que disciplina e longevidade importam.

BM — Sua carreira transita por veleiros olímpicos, regatas oceânicas extremas e o clássico match race. Como você lida com essas diferenças?
PC — Hoje disputo principalmente na classe Star e em barcos grandes, mas ao longo da vida fiz de tudo, inclusive travessias longas, como a regata até o Havaí no ano passado. A Star sempre foi minha favorita: é técnica, exigente e extremamente competitiva. Competir ao mesmo tempo na America’s Cup, no Volvo/Whitbread e na Star foi um grande desafio, porque cada disciplina exige abordagens técnicas e psicológicas muito específicas. Tenho orgulho de ter performado em alto nível em todas elas.

BM — Você faz parte da família Rolex há mais de duas décadas. O que essa parceria representa hoje?
PC — É uma honra representar uma marca que simboliza excelência. Estar na mesma família que atletas como Roger Federer, Carlos Alcaraz e Robert Scheidt é especial. Entrei para a Rolex em 1998 e, desde então, construí relações pessoais verdadeiras. Por muito tempo achei que minhas grandes vitórias tinham ficado no passado, mas vencer novamente o Mundial da Star me trouxe de volta ao presente. Voltar aos eventos da marca como campeão mundial atual é algo muito significativo.

BM — Que lugar o tempo ocupa na sua relação com o mar?
PC — O tempo sempre foi fundamental na navegação. No passado, era essencial para determinar a longitude. Hoje, no esporte, continua sendo decisivo. O momento da largada, a velocidade até a primeira marca… um segundo faz toda a diferença. O tempo é tudo. Nesse sentido, o relógio representa precisão, mas também a essência de navegar bem.

BM — Liderança e legado vão além das vitórias. Como você vê esse papel hoje?
PC — Dedico grande parte do meu tempo a apoiar jovens velejadores. Tenho a America One Foundation, que ajuda atletas rumo às Olimpíadas de Los Angeles e também cerca de 150 jovens em classes rápidas como Moth, IQFoil e Kite. Organizamos campeonatos pelo Havaí, Califórnia, Flórida e Oregon. Como presidente da Star Class, também trabalho para preservar a herança do esporte. Criamos um programa que compra barcos e os empresta a velejadores com menos de 30 anos. A ideia é simples: passar adiante.

BM — Qual é a sua relação com o Rio de Janeiro?
PC — É antiga e muito especial. Minha primeira vez aqui foi em 1977, no Mundial de Laser em Cabo Frio. Depois, passei uma semana no Rio e lembro de ficar todas as manhãs sentado na varanda, admirando a vista. Era o Rio clássico: Copacabana, Ipanema, tudo muito vibrante. Desde então, voltei várias vezes para Campeonatos Mundiais, paradas do Whitbread e outras regatas. Sempre fico impressionado com a beleza natural: as montanhas, a Baía de Guanabara, o Cristo ao amanhecer. O Rio tem uma energia que não existe em nenhum outro lugar.

Décadas de vela, títulos mundiais e uma relação contínua com o tempo. Aqui, ele usa um Oyster Perpetual Submariner Date (Foto: Divulgação)