
Foto: divulgação
por Pedro Lobo
Pelos corredores de uma pousada fresca em Salvador, no início de outubro, passeava uma noiva de sorriso largo em seu longo vestido creme, feito de crochê. Até o casamento, foram mais de 30 dias de trabalho de três crocheteiras, que fizeram a peça à mão, atendendo ao pedido para que fosse algo “clássico”. O modelo foi o primeiro do Ateliê Mão de Mãe no universo das roupas de matrimônio. A marca baiana completa o seu terceiro ano de vida em ascensão meteórica, com crochê moderno consolidado durante o evento São Paulo Fashion Week e no guarda-roupa das celebridades, que abraçaram as roupas leves em visitas à praia.
Os sócios Vinicius Santana e Patrick Fortuna reconhecem o mar como uma das identidades da etiqueta, que se inspira na ancestralidade negra, no candomblé e na Bahia. Porém, o trabalho mais recente busca ir além do litoral, ganhando espaço no contexto urbano e nas roupas de festa. Eles prometem investimento alto nos trajes para convidadas e noivas já nas próximas estações, com foco no sob medida, carro-chefe da casa.
O ateliê funciona com cinco funcionários fixos, incluindo a crocheteira Luciene Brito, mãe de Vinicius, e inspiração para o nascimento da grife. Outras duas bordadeiras, três costureiras e 90 crocheteiras completam a equipe, que responde a 50% de pedidos personalizados. O atendimento a casamentos deve ser ainda mais exclusivo, abraçando poucos clientes com dedicação intensa, que vai das trocas de referências e conversas sobre o croqui até as provas de roupas, acompanhadas da dupla de criativos soteropolitanos.
Antes mesmo desse début nos modelos festivos, o colorido branco já era tendência entre os sócios – além de importante para o candomblé, como cor de Oxalá (orixá da criação), é visto por eles como atemporal. O que não tira o espaço dos ton mais vivos, como vermelho, laranja e azul, muito presentes nas criações da brand, que tem como assinatura as miçangas, conchas, palhas e búzios em grande parte das coleções.
Aquele primeiro vestido de casamento foi encomenda de uma conterrânea, que fazia questão de contratar uma marca igualmente baiana. O “santo bateu” ainda mais quando viram que a busca era por algo mais tradicional, sem perder o requinte, princípios que Vinicius e Patrick levam a sério. A peça final trazia uma capa semitransparente que beirava os 2,5 metros de
comprimento, com 25 búzios aplicados – um para cada grande amiga da noiva, homenagem que é tida como tradição na família dela. “Foi incrível, uma troca muito gostosa com ela e com a mãe. Uma experiência boa de participar e de estar perto, queremos fazer mais disso no futuro”, avisam. Ainda neste ano, o Ateliê inaugura espaço físico em Salvador, onde também será instalada uma escola profissionalizante de crochê, modelagem e outras técnicas artesanais. A perspectiva é de expansão para mais cinco pontos de venda em 2024, buscando ampliar o público que, hoje, corresponde a 70% de mulheres, na faixa dos 25 a 50 anos.
Entre os itens mais vendidos estão vestidos, croppeds, saias e biquínis, vistos recentemente no verão europeu e caribenho em figuras como Anitta, Clara Moneke e Rafa Kalimann, que têm reforçado o retorno do crochê à moda praiana. O salto é grande para o trabalho de Vinicius, que até o período pandêmico de 2020 era vendedor no shopping. Em seus pedidos mais complexos atualmente, como vestidos de grandes eventos, o processo de desenvolvimento varia de 15 a 45 dias, e é inteiramente feito à mão.
Sempre que fala sobre o ateliê, a dupla defende a valorização da arte manual, que foi a maneira com que Luciene Brito, mãe solteira, sustentou os quatro filhos quando crianças. Outra palavra presente por ali é a “brasilidade”, que vem do apreço ao trabalho das mãos de mães brasileiras e, em especial, baianas. É como define Patrick: “As pessoas podem esperar da gente algo construído de forma diferente, inusitada, com muita identidade e muito dendê”.