Foto: Por Um Fio (1976), da série Fotopoemação.

Anna Maria Maiolino é uma mulher que transformou questões que atravessaram sua vida em um dos conjuntos de trabalhos mais importantes do mundo.

Lidando desde cedo com o exílio, a artista trouxe questões relativas aos conceitos de pertencimento, lugar, subjetividade e feminino como eixo principal de sua pesquisa e produção artística.

Nascida em Scalea, na Itália, mudou-se com a família para a Venezuela fugindo da guerra e, poucos anos depois, migrou novamente, dessa vez para o Rio de Janeiro, e adotou a nacionalidade brasileira em 1968. Sua produção da década de 1960 é fortemente impactada pela estética do cordel.

Suas xilogravuras e objetos da época integram o movimento que viria a se firmar como a Nova Figuração. Em 1967, a artista participa da mostra Nova Objetividade Brasileira, no MAM Rio, sendo uma das signatárias da Declaração de Princípios Básicos da Vanguarda, junto a Hélio Oiticica, Antonio Dias, Lygia Clark, Rubens Gerchman, Lygia Pape, Glauco Rodrigues, Carlos Vergara, Nelson Leirner, Mário Pedrosa, Waldemar Cordeiro, entre outros artistas dessa mesma geração.

O texto defendia “a liberdade de criação, o emprego de uma linguagem nova, a análise crítica da realidade e a utilização de meios capazes de reduzir à máxima objetividade o subjetivismo”. É com esse princípio que as obras de Maiolino passam a operar a partir da década de 1970, quando elas começam a se afastar da figuração, explorando outras possibilidades espaciais e poéticas do suporte.

É dessa época a série de trabalhos Fotopoemação, nos quais a artista cria uma série de poemas visuais a partir de performances, muito influenciada pelo contexto político da época e pelos impactos da ditadura na subjetividade.

Nos anos 1980, Maiolino retoma as práticas de desenho, mas, nesse momento, já adotando a abstração, cujo gesto se desenvolve também em grandes instalações site-specific. As formas assumidas pela argila são sempre criadas por movimentos básicos das mãos, todos retirados da prática culinária, interessando mais à artista o trabalho repetitivo e atencioso do que a sofisticação técnica.

Um gesto simples, mas que questiona muitas noções de gênero, a tradição masculina da escultura, das obras site-specific e da land art e os espaços ainda concedidos às mulheres. Essa trajetória da artista nos faz pensar na importância do seu trabalho, não somente a contribuição das suas discussões para analisar o país, mas também os limites geográficos do pensamento artístico.

Em 2012, a instalação Here & There, da mesma série dos trabalhos em argila, foi uma das obras mais comentadas da 13ª dOCUMENTA, maior exposição mundial de arte contemporânea, que acontece a cada cinco anos na cidade de Kassel, na Alemanha. Em 2024, Anna Maria Maiolino conquistou o reconhecimento máximo das artes visuais quando foi laureada com o Leão de Ouro em Veneza, recebendo o prêmio pelo conjunto de sua obra. Aos 81 anos de idade, Maiolino segue ativa.

No dia 14 de junho, a artista inaugura sua primeira individual em uma instituição francesa. Como parte das comemorações do ano do Brasil na França, Je suis là. Estou aqui celebra a trajetória de mais de seis décadas da artista. Reunindo mais de 100 obras, entre pinturas, esculturas, vídeos e desenhos inéditos, que percorrem os principais eixos temáticos de sua produção, a mostra acontece no Museu Picasso-Paris. Com curadoria de Sébastien Delot e Fernanda Brenner, a exposição foi dividida em seis seções: Introdução, Entre Significados, Tempestade de Ideias, “Em Princípio”, Novas Paisagens e Ricochetes, destacando a multiplicidade de linguagens de Maiolino, desde suas explorações do corpo e do cotidiano até suas investigações sobre identidade, exílio e resistência política.

Foto: Retrato de Anna Maria Maiolino.

Anna Maria Maiolino. Je suis là. Estou aqui não apenas consolida o reconhecimento internacional da artista, mas também estabelece um diálogo entre sua obra e o contexto artístico francês, reforçando sua relevância no cenário da arte contemporânea global, apresentando mais uma vez para o mundo a importância da artista, que fez de sua obra uma cartografia em que condensa a experiência como imigrante e como mulher diante dos acontecimentos do mundo.