
Foto: Divulgação
Por Paula Jacob
Jennifer Lawrence é conhecida por interpretar mulheres voláteis emocionalmente – o que pode ser uma armadilha. Em Morra, Amor, porém, a atriz se entrega à direção de Lynne Ramsay com voracidade para interpretar uma jovem mulher lidando com as consequências físicas e mentais da maternidade – da gestação ao puerpério. Adaptação do livro de mesmo nome, escrito pela argentina Ariana Harwicz, o filme costura cenas do presente com momentos do passado para diferenciar a memória de felicidade e prumo de uma família que começa a ruir justamente quando se forma dentro de uma lógica tradicional de morar junto, casar, ter filho.
Conhecida pelo outro ótimo filme que trata de temática similar, Precisamos Falar Sobre o Kevin, Lynne investiga de maneira radical até que ponto é possível manter a sanidade diante de uma transformação tão grande quanto o ser mãe. E aqui, não há juízo de valor ou romantização, é tão pé no chão que, por isso, assusta com suas dimensões quase palpáveis.
A protagonista, Grace, vive numa região interiorana, na casa que era do tio de seu companheiro, Jackson (Robert Pattinson), isolada de tudo, perto da natureza e a poucos minutos da sogra. Nesse cenário, quando eram apenas dois, as noites e os dias se faziam felizes e dançantes, com música alta, vinho, sorrisos despretensiosos e muito sexo. Quando engravida, Grace já começa a dar sinais de que algo não vai bem. Fica cada vez mais presa dentro da sua cabeça, imaginando (ou não) cenários, e se mistura com os animais e ao redor, quase como se tivesse tentando compreender essa metamorfose de um jeito instintivo. A partir do nascimento do bebê – sem nome –, tudo ganha proporções maiores.

Foto: Divulgação
É interessante também analisar o personagem de Pattinson, um homem que antes aceitava muito bem os comportamentos não convencionais da sua namorada. Contudo, a partir da inserção de uma criança no contexto, ele passa a contestar a parte mais animalesca dela, ao invés de tentar acolher as suas angústias. É só com a percepção da sua mãe que ele começa a enxergar Grace com mais empatia a ponto de auxiliá-la no processo de tratamento psicológico.
No livro de Ariana, que faz parte de uma trilogia involuntária, a história tem uma narração experimental. Um desafio de adaptação que Lynne Ramsay consegue contornar aproveitando o que o cinema oferece como possibilidade. A montagem e a direção de fotografia, principalmente, brincam com indícios, feitos, imaginação, sentimentos complexos de nomear de tal forma que ainda abre espaço para algumas cenas tragicômicas curiosas e divertidas. Roteiro e atuações, claro, complementam a dinâmica de altos e baixos dessa história que se impregna no corpo de quem assiste.
“Morra, Amor” é destaque na programação do Festival do Rio e estreia nos cinemas brasileiros dia 27 de novembro