Quase quatro anos separam os álbuns Casa Branca, de 2019, e o recém-lançado Azul (2023), de Maria Luiza Jobim. Aos 36 anos, a cantora carioca – que pulsa música e arte pelas veias (ela é filha do icônico Tom e da fotógrafa Ana Jobim) – faz uma ode ao seu Rio de Janeiro, onde voltou a morar com a filha Antônia, de 5 anos, depois de uma passagem por São Paulo e de ter ficado reclusa, em Itaipava (na serra fluminense), durante o Covid-19. No primeiro disco, Maria brinca que embalou suas origens, e, no novo, empacotou este retorno ao Rio do presente. “As canções todas são de um período recente, não tem nada que tenha sido feito antes. Uma vibe solar, mas um traço melancólico”. Reflexo do tempo de casulo, no interior do Rio, depois de não ter podido ir para a estrada com o disco anterior.
Nas canções, ela toca em um lugar do feminino depois da maternidade a fim de se reconectar consigo mesma. “Da mulher, das relações amorosas, me redescobrindo muito nesse lugar. Tem uma coisa de cura, também, dos momentos que eu vivi”. Isolamento tem a ver, claro, com as faixas. Ré, mais introspectiva, foi a primeira que compôs em meados de 2020 ao lado de Felipe Fernandes. Estava em um movimento de voltar a morar no Rio depois da separação do advogado Paulo Figueiredo e o tempo no interior. “Reconexão com as pessoas e com a cidade”, conta ela, brincando que precisou se reapaixonar pela capital fluminense. “Daí que vem a coisa solar”. Com o mundo se abrindo, reavaliou a vida e se voltaria para a capital paulista – onde estava quando tudo parou – ou voltaria para sua cidade natal.
O compromisso escolar e a escola da filha acabaram chancelando essa escolha por si só. “O Rio estava vivendo uma situação de abandono, a cidade estava muito triste. E senti muito isso nesse retorno. As pessoas estavam desapontadas com a cidade, falando mal, e daí veio Boca de Açaí porque fiquei com vontade de falar daquele lugar que estava me abraçando e exaltar essa cidade que é minha e morada para tanta gente”. Ir contra a corrente e falar das coisas boas na orla, como o Leblon, onde mora atualmente enquanto espera acabar a reforma na casa no Jardim Botânico, onde vai fincar os dois pés no chão.

Capa do álbum ‘Azul’ (Foto: Reprodução)
Adriana Calcanhotto aparece na faixa Papais, uma homenagem ao pai das duas, ambos músicos, e que marca ainda a estreia de Antônia na música. De forma acidental, assim como foi com Maria. No caso dela, Tom Jobim a levava para o estúdio e ali foi se apaixonando pelo ambiente. Já sua filha foi levada da mesma forma e veio a ideia de ela fazer backing vocal. “Primeira vez que escutei, chorei. Em casa, ela me vê muito trabalhando e entra (na onda). Canta comigo, mas é uma brincadeira”. Se Maria cresceu em uma casa repleta de artistas A-list, ela nunca sentiu a pressão em cantar como algo profissional. “Qualquer coisa que fosse fazer, tinha de ser com verdade, por inteiro. Quero dar para ela essa liberdade, mas – também – as ferramentas de onde eu vim”, garante.
A história da faixa Papais é “engraçada”, Maria conta. A ideia do convite veio depois de ter assistido a uma live, onde Adriana contava sobre a relação com o pai. E gerou identificação imediata. Escreveu um e-mail acompanhado da batida de uma música, convidando Adriana, que nunca respondeu ao chamado. Meses depois, acabaram trabalhando juntas e a resposta veio em forma de letra.
O conceito do novo trabalho foi uma construção e, para ela, nunca vem antes de entrar em estúdio. “É como terapia, sabe? Primeiro você faz e depois você entende o que é. O próprio processo então é quase que uma crença limitante porque se você focar em determinado assunto vai deixar outros de fora”. Peixes com ascendente em câncer, Maria se define como apegada e chorona. “Aquela pessoa que sente tudo”. Havia a intenção de trazer o irmão, Paulinho, para o disco, mas ele morreu no início do ano passado vítima de um câncer. Mas ela acabou regravando “Samba do Soho” (que havia aparecido na discografia do pai) em sua homenagem. Outra participação é de Arnaldo Antunes na faixa de sua autoria, O Culpado é o Cupido, e melodia de César Mendes. “Foi um presente receber essa música inédita, poder interpretar e a grande sorte e presente foi o Arnaldo topar cantar”. Lisa Ono aparece na última faixa do álbum, intitulada Nada Sou Sou.
O mutabilidade das marés também tem muito dela e sua relação com esse universo. Queria falar desse movimento que a vida tem. A beleza que o mar nos proporciona é a falta de controle. Esse caos perfeito que é a vida e de não querer estar no controle sempre, das relações, vida e trabalho”, arremata. Este mês, ela sai em turnê pela Europa – com Portugal e Alemanha no caminho – e, na volta, começa a turnê passando por Rio e São Paulo.

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