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Por Clara Drummond

2025 é o ano de Adriana Varejão. Em março, a artista inaugurou a exposição Don’t forget: we came from the tropics (Não se esqueça: a gente veio dos trópicos) na Hispanic Society Museum & Library, em Nova York. Depois, foi a vez de Entre os Vossos Dentes, em conjunto com Paula Rego, no Centro de Arte Moderna Gulbenkian, em Lisboa. E, neste mês, será sua primeira individual em Atenas, Histórias Moldadas, na galeria Gagosian. “As três exposições são bem distintas entre si — a sensação é a de que estou usando partes diferentes do cérebro em cada uma”, brinca Varejão. “Não era para as datas serem tão próximas, está sendo uma correria, mas trabalho bem sob pressão.” Em Nova York, Varejão exibe pinturas tridimensionais criadas para serem apresentadas ao lado da coleção de pratos do museu, escolhidos pela própria artista para fazerem parte da mostra. A série Pratos é resultado de uma pesquisa sobre a fauna e a flora amazônicas, iniciada após a sua participação na 1ª Bienal das Amazônias, em 2023. No terraço do prédio, Varejão instalou uma sucuri em fibra de vidro que se entrelaça com a escultura equestre em bronze El Cid Campeador, feita por Anna Hyatt Huntington, em 1927.

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A convergência entre o contexto político e a abertura da exposição fez com que a instalação fosse o grande destaque: no mesmo dia da abertura, o presidente americano Donald Trump decretou uma lei que proíbe a remoção ou alteração de estátuas e monumentos, com o objetivo de evitar o que chamou de “falsa revisão histórica”. “Eu soube do decreto enquanto enrolava essa sucuri enorme na frente de um museu que tem estampados na fachada os nomes de conquistadores espanhóis. Achei uma louca coincidência histórica. Por sorte, a Hispanic Society é uma fundação privada, então ficou tudo bem. Mas, mesmo assim, tivemos que pedir autorização à prefeitura, afinal a estátua está em um espaço público, e o El Cid é considerado um marco cultural na cidade de Nova York”, conta a artista.

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Do outro lado do Atlântico, a proposta era bem diferente: uma retrospectiva de trabalhos desde a década de 1990, a fim de criar um diálogo com a obra da portuguesa Paula Rego (1935- 2022). Em 2017, as duas já haviam apresentado juntas uma exposição na Carpintaria, no Rio de Janeiro. Mas, aqui, o duo ganha nova dimensão, com quase cem obras, entre pinturas, gravuras, esculturas e instalações criadas ao longo de mais de seis décadas. É, também, a primeira exposição em que a curadoria é feita pela própria artista: “Foram quatro anos trabalhando em conjunto com a (Fundação Calouste) Gulbenkian. Precisei desenvolver todo o pensamento, conceber os 13 núcleos da exposição, escrever os textos, escolher o nome das salas e orquestrar a equipe”. Entre Vossos Dentes tem curadoria também de Victor Gorgulho e Helena de Freitas, e expografia de Daniela Thomas. “Minha obra sempre se endereçou às questões coloniais, sobretudo na década de 1990.

Estando em Lisboa, o viés histórico e político torna-se inevitável. São questões dolorosas e delicadas, mas importantes. O título das salas é bastante revelador desse aspecto da curadoria: ‘fui terra, fui ventre, fui vela rasgada’; ‘memórias de açúcar e sal’; ‘comemos, matamos, dançamos e misturamos’, e por aí vai.” Em Atenas, o foco se volta para a cerâmica: a proposta é reinterpretar esse material tão marcante em sua trajetória artística, com especial atenção às tradições gregas, turcas, chinesas e baianas, cada uma com uma sala para si. “Meu trabalho sempre vai ter alguma relação com o lugar onde ele é exposto. Costumo visitar a cidade antes para pegar o máximo de referências históricas. Nunca tinha ido à Grécia, passei uma temporada lá, visitei museus, passeei por algumas ilhas. Entrei em contato pela primeira vez com as cerâmicas gregas.” As monocromáticas e craqueladas da dinastia Song, da China, são uma referência recorrente na produção de Adriana Varejão. Já as produzidas em Maragogipinho, onde fica o maior polo de cerâmica da América Latina, são um interesse recente. “Fiquei com vontade de fazer essa ponte Atenas-Recôncavo Baiano. Fiz três trabalhos inspirados na cerâmica de lá.” Quando a maratona de celebrações acabar, Adriana já tem um novo foco: sua próxima mostra, na galeria inglesa Victoria Miro, em 2026.