
Halle Berry no último red carpet do Red Sea International Film Festival 2023, em Jeddah, Arábia Saudita (Foto: Tim P. Whitby/Getty Images)
De Jeddah, na Arábia Saudita*
Um eclético grupo de estrelas hollywoodianas, incluindo Johnny Depp, Will Smith, Andrew Garfield, Gwyneth Paltrow, Chris Hemsworth, Sharon Stone, Halle Berry, o diretor australiano Baz Luhrmann, o inglês Terry Gilliam e a atriz francesa Catherine Deneuve passaram a última semana na cidade litorânea de Jeddah, na Arábia Saudita, para prestigiar a terceira edição do Red Sea Film Festival.
O Reino da Arábia Saudita está passando pelo início de uma pequena revolução cultural. Até 2018, as salas de cinema eram proibidas no país. O simples ato de ir ao cinema foi proibido pelo regime local por 35 anos. Agora, apenas cinco anos após a liberação das salas, aconteceu em Jeddah, cidade que fica à beira do Mar Vermelho, a terceira edição do Red Sea Film Festival, um festival dedicado principalmente à produção dos países árabes, asiáticos e da África do Norte.
A primeira grande surpresa foi descobrir que a produção de filmes sauditas é bastante diversa, e trata de temas considerados até então tabu como a emancipação feminina. O filme Inshallah a Boy, de Amjad Al Rasheed, uma coprodução entre Jordânia, Arábia Saudita, Qatar, Egito e França, foi o primeiro filme jordanês exibido em Cannes. É a história de Nawal (Mouna Hawa), uma mulher de 30 anos que fica viúva. Como ela não tem um filho homem, tem que lutar contra seu cunhado que quer vender seu apartamento onde vive com sua filha, para dividir a herança. É um filme sobre empoderamento feminino, em uma sociedade cujas leis protegem claramente os homens. O filme foi o escolhido para representar a Jordânia na categoria Filme Internacional na próxima cerimônia dos Oscars, em 2024.
Aliás, vários filmes pré-indicados ao Oscar foram exibidos em Jeddah. Além de Inshallah a Boy, Omen, do multi artista congolês Baloji, foi o escolhido para representar a Bélgica, apesar da nacionalidade do diretor. “Indicar um filme africano foi um passo importante do comitê de seleção belga, principalmente por seu passado colonialista. A Bélgica foi o único país, ao lado da Holanda, que topou investir dinheiro no meu filme”, contou o diretor Baloji no terraço do luxuoso hotel Ritz-Carlton.

Amanda Nell Eu posa para retrato durante o Red Sea International Film Festival (Foto: Tristan Fewings/Getty Images)
Tiger Stripes, da diretora estreante Amanda Nell Eu, um terror teen sobre uma garota que tem sua primeira menstruação e passa por uma série de transformações radicais em seu corpo, foi o escolhido para representar a Malásia, após ter vencido o Grand Prix na Semana da Crítica em Cannes. O filme, que foi exibido na Mostra de São Paulo, mistura elementos de Carrie, a Estranha, com os filmes do mestre tailandês Apichatpong Weerasethakul. Amanda foi a primeira diretora malaia a ter um filme exibido em Cannes. Curiosamente, Tiger Stripes foi censurado na Malásia, porém exibido na versão sem cortes em Jeddah. “Fiquei triste pelo filme ter sido censurado na Malásia, que também é um país islâmico, porém feliz de poder exibir aqui em Jeddah o filme sem cortes. A censura no meu país não faz nenhum sentido”, contou Amanda também nos jardins do Ritz-Carton, sede do festival.

Chairwoman do Festival Red Sea, Jomana Al-Rashid, e Gwyneth Paltrow (Foto: Daniele Venturelli/Getty Images)
Além da exibição dos filmes citados aqui, Jeddah recebeu as visitas de várias estrelas hollywoodianas. Gwyneth Paltrow, Johnny Depp, Nicolas Cage, Diane Kruger, Will Smith, Jason Statham, Sharon Stone, Halle Berry, Michelle Rodriguez e Andrew Garfield foram algumas delas. O diretor australiano Baz Luhrmann, de Elvis e Moulin Rouge, presidiu o júri, que também contou com a presença da atriz espanhola Paz Vega, do ator sueco Joel Kinnaman (atualmente em cartaz com O Silêncio da Vingança), a atriz indiana Freida Pinto, e da atriz egípcia Amina Khalil.
Segundo Baz Luhrmann, o que mais o surpreendeu durante o festival foram as histórias humanas protagonizadas por mulheres. “O storytelling é a melhor forma de dar voz às suas lutas”. Luhrmann, que citou o filme Lawrence da Arábia, como um dos seus primeiros contatos com a cultura árabe, declarou que está aberto para filmar um de seus próximos projetos nos recém-inaugurados estúdios Alula, na região noroeste da Arábia Saudita.
Luhrmann também mediou uma conversa com o ator australiano Chris Hemsworth, recém-chegado da Comic Con São Paulo (CCXP SP). Hemsworth, que acabou de filmar Furiosa, o quinto filme da série Mad Max, rasgou elogios ao diretor George Miller, da primeira franquia Mad Max, de 45 anos atrás.
O diretor britânico Terry Gilliam, (de Brazil, o Filme), que também passou por Jeddah, declarou que quer produzir seu próximo filme, Carnival at the end of the days, na Arábia Saudita, com o amigo Johnny Depp no papel de Satã. Gillian já trabalhou com Depp antes nos filmes Fear and Loathing in Las Vegas (1998) e O Mundo Imaginário do Dr. Parnassus (2009).

Catherine Deneuve em rápida aparição no tapete vermelho (Foto: Getty Images)
Outra que esteve na cidade foi a atriz francesa Catherine Deneuve, para promover seu novo filme Bernadette, uma comédia sobre a viúva do ex-presidente Jacques Chirac. A passagem de Deneuve por Jeddah foi discreta. A atriz não falou com a imprensa e só deu as caras no tapete vermelho durante a cerimônia de abertura e no evento Women in Film.
Nicolas Cage participou de uma conversa aberta ao público mediada pela jornalista libanesa Raya Abirached. O ator, que não tem nenhuma rede social, comentou sobre como se sentiu ao descobrir que havia virado um meme na internet. “Um dos meus atores favoritos era James Dean. Também adoro Jerry Lewis. Gosto de manter uma aura de mistério sobre minha vida privada. Os atores têm que fazer você sonhar sobre eles e não se expor demais. Quando descobri que havia virado um meme, pensei em fazer algo criativo com isso”, contou o ator durante o encontro. O resultado é o ainda inédito Dream Scenario, uma comédia surrealista na qual Cage interpreta um homem que começa a aparecer nos sonhos de diferentes pessoas ao redor do planeta.
O filme de encerramento foi o aguardado Ferrari, de Michael Mann, estrelado por Adam Driver, Penélope Cruz, e o brasileiro Gabriel Leone. Ferrari chega aos cinemas brasileiros em 8 de fevereiro. Nenhum membro da equipe estava presente.
No entanto, houve mais um desfile de estrelas no red carpet da cerimônia de encerramento. O mais ovacionado foi o britânico Jason Statham, astro de filmes de ação como as franquias Velozes e Furiosos e Os Mercenários. As vencedoras do Oscar Halle Berry e Gwyneth Paltrow também deram o ar da graça, e participaram de conversas abertas ao público.
Uma coisa é certa, o Red Sea Film Festival quer abrir seu espaço privilegiado para as mulheres, sejam elas atrizes oscarizadas, ou diretoras estreantes da região. Uma intenção muito bem vinda em um país que tem uma história complicada em relação aos direitos femininos. Inshallah, que não seja apenas uma moda passageira.

Sharon Stone discursou durante o gala Women In Cinema Gala (Foto: Daniele Venturelli/Getty Images)
*A terceira edição do Red Sea Film Festival aconteceu em Jeddah entre 30 de novembro e 09 de dezembro. O jornalista viajou a convite do Red Sea Film Festival.