
Foto: Larissa Kreili
Preta Gil está de volta aos palcos, com o Bloco da Preta, uma adaptação da folia de rua para um show de Carnaval fechado. A apresentação, que conta com participações de Pabllo Vittar, Gilsons e Thiago Pantaleão, ocorre neste domingo (04.04), no Rio Arena, na capital fluminense. O concerto será gravado para – em um segundo momento – virar um projeto audiovisual. Com o EP De Volta ao Sol, com três faixas (lançado na última sexta-feira, dia 02.02), a cantora marca um novo momento na carreira após a superação de um câncer no intestino, diagnosticado no início de 2023 e que teve seu tratamento encerrado no fim do ano passado.
Além do anúncio de mais dois EPs, completando um álbum até o fim de 2024, a próxima fase ainda guarda uma parceria com Alcione. No total, 12 faixas devem ganhar a luz ao longo do ano. “Voltei a sorrir, a querer me conectar com essa energia solar, voltei a querer brilhar e a receber a luz do outro. Para me alimentar, alimentar o meu próprio sol e poder brilhar”, conta em entrevista à Bazaar. A seguir, Preta fala da emoção da felicidade em se afirmar como compositora e as dificuldades do retorno aos holofotes depois de um ano conturbado – marcado não só pelo enfrentamento da doença, mas também pela separação com o ex-marido e a descoberta de uma traição enquanto fazia o tratamento. Leia a transcrição do papo:
O nome do EP é “De Volta Ao Sol”, com uma interpretação dúbia… Queria saber como é, para você, estar nesta posição de voltar a brilhar?
Fiquei até curiosa para saber a dubiedade que você vê no tema.
A gente passou sombrio com a pandemia, você, em particular, por conta dos tratamentos e incerteza. Por isso, a minha pergunta. Como é para você se sentir viva, produtiva e de volta à música?
É isso o que o De Volta Ao Sol significa para mim. (O ano de) 2023 foi muito complicado, sombrio, onde – de fato – me senti apagada em diferentes sentidos. Tive que me reservar para me curar. O tratamento em si e as etapas são muito dolorosas. Fiquei introspectiva e sem energia vital, mesmo. Sem força, sem energia, sem luz e sem brilho. Quando resolvi mexer nessas canções, que tinha composto em 2021, uma delas quando eu li e ouvi, era exatamente o que está ali.
Porque é isso: voltei a sorrir, voltei a querer me conectar com essa energia solar, eu voltei a querer brilhar e a receber a luz do outro. Para me alimentar, alimentar o meu próprio sol e poder brilhar. Fui abastecida, durante o tratamento, por esse amor da minha família, dos amigos e das pessoas que não conheço. Isso tudo se transformou em sol. Por isso, a música fala de voltar ao sol. É exatamente isso que você falou: estou me sentindo, agora, recomeçando, renascendo e voltando a brilhar.
Como você se sente ao estar de volta ao Bloco da Preta?
É muito satisfatório e, ao mesmo tempo, com muita gratidão. Porque fiquei muito em dúvida se eu ia conseguir. Um mês atrás, estava em uma fase da minha reabilitação que eu não conseguia me ver em um palco. Estava usando fralda, com muita incontinência fecal. Isso é uma coisa constrangedora de falar, mas é a realidade do meu tratamento. Consegui, nessas últimas semanas, progredir muito. Até quando o meu meu sócio, Marcelo (Azevedo), propôs de a gente fazer esse show, porque o bloco na rua eu vetada de fazer. Não deixaram por uma questão óbvia, né? Sol calor, ficar exposta muito tempo… Fora de cogitação!
Como é voltar aos palcos de uma maneira tão energética?
Quando o Marcelo falou: “vamos fazer um show fechado”, no mesmo dia do bloco, topei, mas fiquei com medo. Pensei: será que vou conseguir? Automaticamente, pensei nas pessoas que poderiam me ajudar. E vieram todos meus amigos. É uma vitória muito grande. Hoje, me sinto muito bem. Ainda tenho muitas questões, muito a evoluir na minha reabilitação, mas eu estou bem. Feliz e, realmente, muito grata. Vou estar lá do jeito que posso. Não é a Preta de antes, nunca mais eu vou ser… Mas vai ser uma Preta muito melhor. Muito mais grata, querendo doar muito mais do que sempre doei. E sendo muito verdadeira. Tá tudo bem se a gente não estiver bem.
O palco tem um poder de cura muito forte assim. Eu experimentei isso durante o meu tratamento. Estive no palco algumas vezes, com a minha família, fazendo show e foram momentos muito especiais, sem dúvida. Tanto que a gente tem a hashtag #carnacura, porque vai ser uma cura coletiva. Não só para mim, mas para todos que estiverem lá. Para a gente se curar juntos. Todo mundo tem as suas dores, seus problemas…. Quero abraçar não só a felicidade, de a gente celebrar a vida, mas também a vulnerabilidade de todos, como eu também quero abraçar a de todos. Mas, mesmo assim, pode carnavalizar. Mesmo assim, a gente pode celebrar a vida. Estamos vivos, estamos aqui.

Foto: Larissa Kreili
Vai vir um álbum na sequência do EP, tem alguma outra coisa de projeto?
Sim, tenho 12 posições prontas. Três a gente lançou agora. Depois, a gente vai lançando. Amei lançar três músicas, uma por semana. Me dá muita agonia nesse mundo de hoje, dos streamings, de lançar algo e saber que muita música vai ficar perdida e as pessoas não vão ouvir. Acho interessante mostrar uma por uma e apresentar cada canção. Depois, cada um elege a sua preferida. A gente vai continuar lançando vários EPs até o final do ano. Entro em estúdio quando acabar o Carnaval para finalizar mais três. No próximo bloco de lançamentos, vem uma canção junto com Alcione, que é linda – uma composição minha, também. O show de domingo, a gente vai gravar, para virar um super audiovisual.
E vai para o YouTube, alguma plataforma de streaming, TikTok?
Não sabemos… A gente foi lá e viu a estrutura que montou e está uma coisa gigantesca. Não faz o menor sentido durar um dia. Vou gravar e ver se lanço no meu canal, se faço alguma parceria. Ainda vai ser definido. O importante é que não vai perder esse registro histórico.
Teve alguma curiosidade de bastidores?
Essas sanções, a gente compôs e gravou em 2021. A gente fez um camping, em 2021, e dessa experiência saíram 12 canções. Dessas, “Batucada”, “Axé Disco” e “De volta ao sol”, já estavam bem avançadas de produção. Quando foi no final do ano passado, quando operei, em dezembro, no meio do mês – literalmente, lá para o dia 10 ou 15 – me deu um faniquito. Ouvi as canções e, quando ouvi “De Volta ao Sol” não era esse o título da música. Mas todo o resto da letra, tinha. E falei: essa música é mais atual do que nunca. Quero gravar! Mexi na letra e, junto com Pablo Bispo, finalizamos.
E prendeu alguém no sótão, como aquele meme brasileiro da Beyoncé (que, dizem, manter a Sia em cativeiro para lhe passar singles)?
Mentira, tadinha. Não, muito pelo contrário (risos). Esse camping foi aqui na Liga, que é um espaço para fomento de artistas e composição. Os meninos fizeram o disco da Gloria (Groove) e da Iza nesse formato. Mas eu não tinha muito essa confiança em mim mesma como compositora. Acabei compondo 12 músicas em três dias com vários parceiros. E provei para mim mesma que minha criatividade está além do que imaginava. Tinha essa crença limitante.
Talvez, trabalhar na terapia. Porque meu pai (Gilberto Gil) é um dos maiores compositores do Brasil. Achava que não era, mas isso para mim é muito revelador. Este é um momento de renascimento de várias formas. Inclusive, artisticamente. E não tem ninguém no porão. Está todo mundo no sol junto comigo (risos).

Foto: Larissa Kreili
QUIZ
Qual é a sua parte favorita do carnaval?
Sempre fui muito fã dos artistas desde criança. Passei meus carnavais da Infância em cima do trio de Moraes Moreira, de Dodô e Osmar, Armandinho, de Baby (do Brasil) e de Pepeu (Gomes) até chegar no momento onde meu pai fez o Expresso 2222, o trio dele. Minha vida foi em cima de trio elétrico. Amo brincar na pipoca, hoje em dia eu não tenho saúde para isso, mas eu vou voltar a ter quando me reabilitar. De cima do trio, amo olhar como a rua é tomada, como ela é democrática e livre. Observar a diversidade, a alegria e a felicidade do povo brasileiro , que mesmo com tantos problemas, as pessoas realmente esquecem e vão carnavalizar.
Qual que é a sua fantasia mais icônica de carnaval?
Quando fui rainha de bateria da Mangueira. Usei para fazer as fotos de Batucada, do EP, com Thiago. Tirei ela do armário depois de 17 anos. Você ser rainha de bateria da Mangueira é algo que nem eu, quando falo, acho estranho. Então, não tem fantasia mais especial do que essa.
O que não pode faltar no Carnaval perfeito da Preta?
Tanta coisa, mas acho que a gente tem que ter respeito pelo próximo.
E o que que te tira do chão, além do carnaval (no sentido de pular)?
A minha neta (Sol de Maria, filha de Francisco Gil), porque gosta de brincar com a vovó. E meus fãs me fazem sair do chão.