Foto: Arquivo Pessoal

Por Dani Pizetta

Flávia Vitornio é jornalista e turismóloga pós-graduada em meio ambiente e sustentabilidade, além de especialista em viagens com práticas sustentáveis. Acredita que a forma mais clara de entender a importância da preservação da natureza é se colocando dentro dela. Ao combinar trabalho e lazer, Flávia certamente encontrou sua voz, e suas experiências tornam-se ainda mais importantes à medida que seu discurso passa a mexer conosco e a nos inspirar.

Em conversa com Bazaar, ela nos leva para uma viagem que combina sustentabilidade, poesia e aventura rumo ao cerrado brasileiro. Sua jornada começa em Brasília, passa pela Chapada dos Veadeiros, pelo Parque Estadual Terra Ronca e se estende pelo Parque Nacional Grande Sertão Veredas, na trijunção dos estados de Goiás, Minas Gerais e Bahia.

Área da piscina e spa da Pousada Trijunção – Foto: Arquivo Pessoal

Flávia se hospedou na pousada de mesmo nome, e conta que a propriedade é uma joia em meio ao cerrado. Com apenas sete habitações, os guias são na maioria biólogos e apresentam o entorno de diversas formas. Ali, estão mais de 33 mil hectares de remanescentes de cerrado, cercados de vida silvestre e vegetação nativa. Em parceria com entidades como Embrapa e Onçafari, a trijunção permite que espécies de animais que sofrem risco de extinção, como o tamanduá-bandeira e o lobo-guará, continuem a viver livres, protegidos e se reproduzindo. Além disso, 90% de sua área total está destinada a conservação e conta com 10% de produção agrossilvipastoril sustentável.

Ao longo da viagem, Flávia rodou mais de 1.200 quilômetros dirigindo pelo cerrado, que além de considerado o segundo maior bioma da América do Sul é também conhecido como a savana brasileira. Já sobre o imaginário de que suas paisagens podem ser absolutamente secas e de vegetação amarelada, ela diz que não é bem assim: “vi muito contraste e cor, a vida selvagem pulsa, a vegetação é única e as flores exuberantes se adaptaram à seca e tem raízes profundas”. Além disso, viu muito ipê, flor de pequi, lobeiras, mandacaru, chuveirinhos, margaridas do cerrado e enfatiza que estas maravilhas da natureza são fascinantes.

Foto: Arquivo Pessoal

Assim como na maioria dos lugares no interior do Brasil, o dia no cerrado começa cedo. “Araras-canindés anunciam o amanhecer juntamente com as seriemas. Aí você pode escolher: se quer explorar a região de bike, a pé, remando ou em um 4×4. O legal é escolher um rolê por dia, porque todos valem muito. Um pedal de 30 quilômetros em meio às diversas formas do cerrado te leva a um oásis. A imagem surge em uma formação natural completamente diferente do que se vê até chegar lá. São árvores de copa, lagoas e rios que formam as famosas veredas, os oásis do sertão”.

Ela complementa, dizendo que um mergulho nesse oásis é ainda mais satisfatório depois de ter passado pelos campos vastos sob o calor de 38 graus. Para explorar os limites dentro do Parque Nacional, uma combinação entre carro 4×4 e caminhadas é o ideal, pois são 150 quilômetros entre os dois portões de acesso com vários mirantes, a cachoeira do Mato Grande e os encontros de rios.

Foto: Arquivo Pessoal

A gastronomia é autêntica e um misto entre influências indígenas, quilombolas e de povos do interior que valorizam o que o cerrado dá, como frutas, raízes, sementes e ervas. Os pratos mais conhecidos levam castanha de baru, pequi, gueroba, tamarindo e as receitas típicas levam frango ou arroz com pequi, além de sucos que abrem o apetite para uma combinação de sabores sem fim.

No total, a viagem durou sete dias em meio a uma profunda imersão cultural e longas conversas capazes de abrir horizontes. A experiência a conectou ainda mais aos princípios básicos da relação homem-natureza. Aos que leram Guimarães Rosa e seu “Grande Sertão: Veredas” e buscam ver com os próprios olhos as paisagens descritas pelo autor – e vistas por Flávia -, um estudo feito pelo engenheiro florestal Guilherme Braga Neves concluiu que ele levou à risca a topografia, os acidentes geográficos e os cursos de rios aos escrever o livro. A obra cita pelo menos 424 localidades reais.

Foto: Arquivo Pessoal

Porém, do romance ao turismo, a verdade é que é preciso viver o Brasil para compreendê-lo. E só sentindo na pele as delícias, mas também as dificuldades de certas regiões, é que desenvolveremos empatia, compaixão e hábitos capazes de impactar positivamente nossa vida e nossa passagem por este imenso planeta.