
Vinheria Percussi Cacio e Pepe | Foto Ricardo D Angelo
Já ouviu falar na “Santíssima Trindade da Cozinha Romana”? Pois bem, esse é o termo italiano dado ao trio que representa a culinária da capital do país: carbonara, cacio e pepe e amatriciana. “São receitas feitas com poucos ingredientes e que se interligam. Com massa, pecorino e pimenta-do-reino, temos o cacio e pepe. Se adicionar o guanciale e ovo, nasce carbonara. Se escolhermos o molho de tomate ao invés do ovo, chegamos ao matriciana”, conta o restaurateur Leo Marigo, que está à frente de casas de sucesso, como Evvai, Daje Roma e Petros Greek Taverna e Rendez-Vous. Coincidentemente, são alguns dos pratos que encabeçam o hype das receitas que estão em alta na esfera gourmet e nas redes sociais.
No topo dessa lista está a carbonara, que é a rainha da cozinha (e da cultura) romana. Trata-se de um prato relativamente recente, nascido pós Segunda Guerra Mundial, na Itália do Renascimento, quando o país passou por um grande entusiasmo, por um desejo de crescer, de se sentir bem, após anos sombrios de dificuldades e fome. Os registros históricos apontam que não há uma autoria precisa, mas os principais indícios datam para a década de 50.
Para o terror dos italianos, é um dos pratos mais dissociados e distorcidos no mundo.
“Vale frisar sempre que a receita original não leva manteiga, nem creme de leite, tampouco salsinha ou qualquer erva em sua preparação, nem na decoração”, ressalta Silvia Percussi, chef e proprietária da Vinheria Percussi, renomado endereço italiano, em São Paulo, que recentemente, voltou a operar em novo endereço, sempre em Pinheiros, mas agora na Rua Bianchi Bertoldi, 109. “Ela leva somente guanciale, um embutido feito a partir da bochecha do porco e na falta dele, pancetta ou bacon, nesta ordem; só gemas – 1 a 2 por pessoa; pecorino romano e pimenta-do-reino preta moída na hora. As pastas ideias são spaghetti, rigatoni ou mezze maniche”, complementa Silvia, que é italiana, com raízes na região da Ligúria, no noroeste da Bota.
Já o cacio e pepe, que é feito somente com pecorino e pimenta-do-reino preta e tem como grande segredo a cremina – que é criar uma emulsão com seus dois ingredientes e a água do cozimento; teria origem muito mais antiga que a da carbonara. Conta-se que remonta à época em que pastores percorriam os campos do Lazio, a região que abriga Roma, e para sobreviver, nesse período que obviamente não havia refrigeração, levavam ingredientes que resistiam por muito tempo: pasta, pecorino – que é um queijo de ovelha maturado; e pimenta-do-reino. Segundo a chef, o segredo para chegar ao ponto perfeito é usar a água do cozimento morninha, caso contrário passa do ponto e passa do ponto, dando aquele efeito ‘chiclete’ do queijo. Este, aliás, deve entrar no preparo ralado finíssimo, ‘tipo areia’ para que a cremina ganhe a textura de veludo desejada. As pastas indicadas aqui são tonarelli, spaghetti e massas longas em geral. O chef Ailton Piovan, comanda a Cantina Piovanelli, em São Roque, e assim como Silvia conta que a água da cocção da massa junto com o queijo ralado bem fino é o segredo para o sucesso de um bom cacio e pepe. “Escolha ingredientes de boa qualidade e aposte na pimenta moída na hora, seja no moedor ou – como eu prefiro – na ponta da faca. Assim, ela adiciona ainda mais aromas e sabor ao prato”, diz.
Por fim, para fechar o trio, está a amatriciana ou matriciana, que nasceu em Amatrice, pequena cidade também da região do Lazio, por meio de camponeses que enfrentaram uma crise econômica forte e muitos optaram pela mudança para Roma, que estava distante cerca de 145 km. Ali, como meio de sustento, muitos começaram a trabalhar em restaurantes e, naturalmente, foram ensinando e inserindo o prato de sua cidade Natal, nos cardápios da cidade. Como a oferta de produtos da capital era maior, a receita que originalmente era feita com guanciale, pecorino e peperoncino (pimenta vermelha seca), ganhou a adição de molho de tomate. O restaurateur Leo Marigo conta que é essencial usar um bom guanciale nessa receita. “Bacon aqui não, por favor”, diz ele, que completa. “Minha dica é fritar a cebola e o alho para o molho na mesma frigideira da fritura do guanciale, aproveitando sua gordura, e deglacear com um pouco de vinho antes de colocar o tomate.” A receita, que tem como indicação tradicional o uso de bucatini e vai bem também com rigatoni, foi reconhecida em 2020, como Especialidade Tradicional Garantida, um selo de grande valor no País da Bota, voltado para proteger sua origem e receita.
Não a toa, a santíssima trindade da culinária italiana figuram os pratos mais vendidos nos restaurantes italianos. “Aqui no Piccini Cucina, quase 30% dos pedidos é o nosso carbonara. Isso independe do clima, desde a abertura da casa ele sempre figurou entre os mais pedidos”, diz Samuel Rodrigues, sócio do restaurante. O restauranteur Marcelo Muniz concorda e sente o mesmo efeito no seu restaurante Nonna Rosa. “Os pratos campeões – entre outros – estão o carbonara e o caccio e peppe. E acredito que isso aconteça pois são pratos teoricamente simples, mas são de cozinha que todo mundo fala que é confort food. E sim, quem fica triste depois de um prato assim?”
Il Cacio Pepe Al Pistacchio
Tempo de preparo: 30 minutos
Rendimento: 4 porções
Ingredientes
400 g spaghetti seco de grano duro ou 500 g tonarelli fresco
200 g queijo pecorino romano ralado fino
Pimenta-do-reino moída na hora
1 colher de sopa de sal
Pistache a gosto
Modo de preparo
Em uma panela, coloque cerca de 5 litros de água para ferver. Quando levantar a fervura, adicione o sal. Em seguida, despede a massa e deixe cozinhar até ficar “al dente”. Para isso, verifique o tempo de cozimento da embalagem e retire um ou dois minutos antes. Enquanto a massa cozinha, coloque duas conchas da água do cozimento em um bowl e espere amornar. Junte o queijo pecorino ralado e mexa com ajuda de um batedor até conseguir um creme denso. Se ficar cremoso demais, adicione um pouco mais de água do cozimento, mas, se estiver muito ralo, coloque mais um pouco de pecorino ralado. Escorra a massa e emulsione neste creme e junte o pistache. Polvilhe com pimenta-do-reino moída na hora. Distribua a massa nos pratos e salpique mais pecorino. Sirva imediatamente para não esfriar.
Carbonara
Tempo de preparo: 30 minutos
Rendimento: 3 porções
Ingredientes
300 g de spaghetti ou rigatoni
6 gemas
50g de pecorino romano
150 g de guanciale
Azeite, sal e pimenta-do-reino a gosto
Modo de preparo
Comece cortando o guanciale em cubinhos e refogue em fogo baixo. Enquanto isso, quebre os ovos, separe as gemas em um prato fundo, bata bem com um garfo, acrescente quase todo o pecorino e tempere com uma pitada de sal. Se precisar, junte um pouquinho da água do cozimento para deixar mais cremoso. Depois, leve ao fogo uma panela com 4 litros de água filtrada e sal. Quando ferver, coloque a massa para cozinhar, respeitando o tempo determinado na embalagem. Escorra a massa e leve à panela com o guanciale refogado. Em seguida, longe do fogo, junte os ovos batidos e uma pitada de pimenta-do-reino. Misture até que os ovos se tornem um creme amarelo. Se precisar, pode acrescentar um pouco mais de água do cozimento para dar cremosidade. Junte o restante do queijo e sirva em travessa aquecida.
Amatriciana
Tempo de preparo: 30 min
Rendimento: 4 porções
Ingredientes
400 g de bucatini ou rigatoni
150 g de guanciale
400 g de tomate pelado (opcional)
50 g de pecorino romano ralado
Sal e peperoncino (ou pimenta calabresa seca) a gosto
Modo de preparo
Levar ao fogo uma panela com 4 litros de água filtrada. Cortar em cubinhos o guanciale, colocar em uma panela e levar ao fogo baixo até derreter bem a gordura (se desejar, pode acrescentar duas colheres de sopa de azeite e um pouco da água do cozimento), não deixe queimar, junte o tomate pelado (opcional), deixe apurar. Adicione a pimenta. Cozinhe a massa quando a água ferver, adicione sal quando estiver al dente escorra e leve a massa à panela com o molho. Sirva com o pecorino ralado no momento.