
Madonna e sua filha Lourdes Maria. Foto: Reprodução
Sempre ouvi de pessoas mais velhas sobre a importância dos cuidados nas redes sociais — sobre não confiar em estranhos, não expor a vida pessoal demasiadamente e cuidado ao soltar opiniões polêmicas. Eles me falavam isso numa época onde tudo era mato e para acessar as redes sociais era preciso esperar até a madrugada para ficar mais em conta. Passam-se anos, e as dinâmicas mudaram, a tecnologia deu um salto gigantesco e os debates sobre o bom uso da internet ficaram mais complexos.
A professora da Universidad Autónoma Metropolitana de México, Rosalía Winocur, trata em seu artigo “Conflitos e diferenças geracionais no uso das tecnologias digitais” que, enquanto os jovens não veem uma barreira entre o mundo online e o offline, as pessoas mais velhas (em especial, os baby boomers e a geração X) tendem a sentir mais medo: medo de errar, de serem enganados, de terem seus dados íntimos vazados. O risco para eles aparece como ameaça. Já para os jovens, a instabilidade é parte natural do jogo digital — uma espécie de “espírito esportivo” para lidar com perdas de arquivos, invasões e até as gafes públicas.
Esse contraste também se reflete no lugar das redes dentro da vida cotidiana. Para os mais velhos, publicar ou se expor online é algo que precisa ser cuidadosamente justificado. Para nós, que crescemos dentro desse ecossistema — millennials e, sobretudo, geração Z — as redes não são apenas ferramentas, mas extensão da própria sociabilidade. Faz parte do modo como nos reconhecemos, nos posicionamos, até como elaboramos identidade.
Minha mãe, por exemplo, sempre insistiu que eu não deveria publicar nada sobre política ou causas sociais nas redes. Para ela, falar de política era arriscar desentendimentos, expor-se demais, criar atritos desnecessários, não só socialmente como profissionalmente. Para mim e para muitos da minha geração, é justamente o contrário: silenciar-se é abrir mão de uma parte de quem somos. Redes como Twitter, Instagram e até TikTok se tornaram palcos de mobilização, de reivindicação e de pertencimento. Claro que isso também nos coloca em situações de risco: às vezes nos expressamos mal, ou algo sai do controle, e o que era um post vira um problema maior. Mas faz parte da negociação de viver em público.
As diferenças não estão apenas no que se posta, mas também em como se posta. A linguagem é atravessada por gerações. Enquanto emojis são usados de forma literal pelos boomers — um coração vermelho para dizer “eu te amo”, uma carinha sorridente para desejar bom dia — na geração Z eles podem ser usados de forma irônica, invertendo os sentidos. O emoji amarelo chorando de rir muitas vezes não significa riso, mas deboche. A caveira, por sua vez, não tem nada a ver com morte literal, mas com gargalhada, algo como “morrendo de rir”. Já os millennials ficam num meio-termo: ainda usam emojis em tom direto, mas já se arriscam nas camadas de ironia.
Essas variações parecem pequenas, mas são códigos que organizam pertencimentos. A geração Z flui com a lógica do simultâneo, do meme e da ironia. As gerações anteriores tendem a buscar ordem, clareza e literalidade. E talvez seja aí que a maior diferença se revela: não é só sobre dominar a tecnologia, mas sobre dar sentido a ela. Para uns, as redes são ferramentas práticas. Para outros, são espaços de experimentação, performance e política.
De acordo com a pesquisa “Social Media by Generation” da Global Web Index (2018), cada geração encontra nas plataformas digitais usos bem distintos. Globalmente, os baby boomers ainda fazem do Facebook e do WhatsApp seus territórios principais, espaços voltados a manter contato com família e amigos. Já a geração X mantém a mesma lógica, mas combina com o YouTube como fonte de informação e entretenimento. Entre millennials, o pêndulo se desloca para Instagram e YouTube, onde tanto seguem marcas quanto constroem comunidades.
A geração Z, por sua vez, concentra-se no TikTok, Instagram e YouTube, lugares em que se expor e se expressar é parte central da experiência. Se no mundo os números mostram um equilíbrio entre Facebook e YouTube como as maiores redes, no Brasil e na América Latina o retrato é diferente: passamos em média mais de 3 horas por dia conectados, e o YouTube, o Instagram e o WhatsApp formam a tríade mais acessada.
É aqui que entram os dados recentes levantados pelo advogado e pesquisador de tecnologia Ronaldo Lemos: “97,7% dos adolescentes brasileiros usam redes sociais todos os dias, e quase 65% afirmam estar online ‘quase constantemente’”, aponta. Ele lembra ainda que a geração Z passa em média 4h20 por dia conectada, enquanto a geração Y fica pouco acima das 3 horas e a X, menos de 3. Para Lemos, “isso revela não só uma intensidade maior, mas uma relação diferente com o meio digital. Para os mais jovens, as redes são espaço de convivência e identidade. Para os mais velhos, tendem a ser funcionais: trabalho, informação e família”.
Ele também chama atenção para um efeito colateral do design das próprias plataformas: “O uso de inteligência artificial está embaralhando tudo. As redes conseguem estimular ainda mais a compulsão de uso, tornando ficar online quase irresistível. É a análise de comportamento pela IA que intensifica esse ciclo”, diz. Não à toa, cerca de 50% dos jovens afirmam hoje que as redes têm efeito mais negativo do que positivo sobre sua geração.
Talvez o maior desafio (e também a maior oportunidade) esteja justamente em reconhecer essas diferenças como linguagem e não como ruído, aprendendo a traduzir umas às outras sem perder o que cada geração tem de singular.

