A foto de corpo todo mostra a atriz Julia Dalavia de braços cruzados, com uma roupa com gola, minissaia e sandálias usadas com meia preta. A foto é preto e branco.

Julia Dalavia – Foto: Mariana Maltoni, com styling de Leandro Porto e beleza por João Miranda

Julia Dalavia não pára! Para quem mergulhou de cabeça na veroz trama de “Dias Perfeitos” e já está com saudades da intérprete de Clarice, a atriz agora estrela duas produções diferentes: o suspense “Reencarne”, de Bruno Safadi, e a adaptação em áudio de “Orgulho e Preconceito”, pela Audible, em que dá voz a Elizabeth Bennet.

De Goiás, onde rodou as cenas da série de terror da Globoplay, às cabines de gravação, Julia parece mover-se com naturalidade entre o medo, o romance e o silêncio. Em entrevista à BAZAAR, Julia fala sobre a fase que marca sua transição entre novos formatos e desafios, o prazer de se arriscar e o que aprendeu ao se ouvir – literalmente – em outra frequência. Leia o papo completo abaixo:

Harper’s BAZAAR – Você começou a atuar muito cedo, aos oito anos. Como esse início precoce moldou sua relação com o ofício e sua forma de escolher projetos hoje?

Julia Dalavia – Ter uma relação tão longa com a atuação possibilitou que eu me explorasse e trouxesse experiências de muitas formas, como atriz e como pessoa. O teatro apareceu para mim primeiro como brincadeira e, a partir das oportunidades que foram surgindo, fui descobrindo a seriedade do jogo e, aí sim, a dimensão do ofício. Sinto que por ter começado cedo, hoje conheço melhor meu processo, minhas investigações como artista e o que quero com elas. Além de ter podido aprender com excelentes mestres nesse caminho.

HB – Você já passou por teatro, cinema, TV e agora o formato em áudio. Há algo em comum que te move em todos esses espaços?

JD – Independente dos fatores externos, como os formatos, o que me move é a busca em relação ao meu ofício, em cada processo e por cada personagem. É essa investigação constante que dá sentido ao meu trabalho.

A atriz Julia Dalavia posa com o rosto virado para o lado, com os cabelos presos para trás e usando um batom preto, vinílico. A foto é preto e branca.

Julia Dalavia – Foto: Mariana Maltoni, com styling de Leandro Porto e beleza por João Miranda

HB – “Reencarne” foi a primeira série que gravou como protagonista, e ainda um suspense – um gênero denso e cheio de camadas. Como foi se preparar emocionalmente para esse papel?

JD – É engraçado porque eu tenho muito medo de terror sobrenatural, tudo que mexe com o espiritual, com o que está fora do nosso alcance como humanos. Eu sempre tive muita dificuldade de assistir, então quando topei fazer a série, apesar de ter amado o roteiro e a complexidade dele, eu também fiquei preocupada de me bater mal emocionalmente. Mas no final das contas foi muito leve, alegre e em alguns momentos hilário de fazer. Ver como é feita a caracterização, os truques da arte e da câmera. Sem falar que me ver correndo ensopada de sangue falso no meio de um milharal no interior de Goiás quebrou um pouco desse medo em mim. Agora eu até consigo assistir mais.

HB – O projeto te levou até o Festival de Berlim. O que essa experiência representou para você, tanto pessoal quanto profissionalmente?

JD – Foi muito especial estar em um festival como o Berlinale, é uma honra fazer parte de um projeto que leva nossa língua e nossa dramaturgia para o mundo. Ver de perto como nossas histórias são recebidas e celebradas foi uma experiência que vou guardar com carinho, ainda mais por ter sido a primeira vez que assisti à série, o que sempre causa um frio na barriga. Sem falar que poder conhecer o mundo com meu trabalho é sempre muito emocionante.

HB – “Dias Perfeitos” é uma adaptação do livro do Raphael Montes, um autor conhecido por mergulhar em zonas sombrias da mente humana. Como foi dar vida à Clarice e entrar nesse universo?

JD – O universo da psique humana sempre me fascinou. Em “Dias Perfeitos” Raphael mergulha fundo no psicológico desses personagens, e isso tornou a Clarice um grande desafio. Sinto que ela chegou em um momento onde eu tinha ferramentas para atravessar e aproveitar o processo, apesar de todos os medos que se fazem presentes, e não são poucos. Foi uma oportunidade de me conhecer muito profundamente.

HB – O que te atrai em personagens que transitam por zonas mais intensas ou psicológicas, como as de “Reencarne” e “Dias Perfeitos”?

JD – O que me fascina é poder compor essas personagens e suas histórias por vias subjetivas, permitir que suas motivações se revelem por caminhos inesperados. Para mim é muito interessante quando a narrativa se desvia do óbvio, quando convida quem assiste a percorrer junto, pensar, sentir, construir sentidos. Gosto desse espaço em que o olhar de quem vê também se torna parte da criação.

HB – No audiobook da Audible, você interpreta Elizabeth Bennet, uma das personagens mais icônicas da literatura. Que desafios encontrou ao atuar apenas com a voz?

JD – Foi uma descoberta deliciosa e um exercício intenso de imaginação. Como tudo acontece só pelo som, sem outros elementos para apoiar a narrativa, mergulhamos fundo no texto e nos sentidos que ele trazia.

Lembro que no primeiro dia eu estava bem apreensiva, sem saber como seria, eu nunca tinha feito uma audiossérie. Mas a Lô Politi, nossa diretora, e o Rodrigo [Simas] também estavam vivendo essa primeira vez, então fomos experimentando juntos, testando, descobrindo o que funcionava.

No fim, eu só queria começar tudo de novo, de tão gostosa que foi a experiência.

A atriz Julia Dalavia posa sorrindo, com os olhos fechados e os cabelos presos para trás e usando um batom preto, vinílico. A foto é preto e branca.

Julia Dalavia – Foto: Mariana Maltoni, com styling de Leandro Porto e beleza por João Miranda

HB – Foi sua primeira experiência com uma audiossérie. Que tipo de descobertas esse formato te trouxe como atriz?

JD – Foi minha primeira vez, espero que de várias. Ter o som como único elemento de comunicação me provocou a exercitar minha imaginação. É um jogo delicado, quem ouve cria suas próprias imagens a partir das intenções que damos ao texto, então essas imagens precisam existir primeiro em mim — com nitidez. No audiovisual temos outros recursos, nem sempre tudo precisa ser contado na voz e no texto. É o mesmo trabalho com pontos de tensão diferentes.

HB – Em meio a tantos gêneros diferentes — suspense, thriller, romance — qual tipo de história te instiga hoje?

JD – Me instigam as histórias que além de comunicar convidam quem assiste a participar de alguma forma. Histórias que provocam questionamentos, reflexões, e acima de tudo, geram boas perguntas.