Demi Moore para Harper's Bazaar de Abril/ 2010

Demi Moore para Harper’s Bazaar de Abril/ 2010

Por Juliana Lopes

Quando é que não estivemos em crise? Falemos sério. Já nascemos com essa pressão. O comportamento brasileiro geral é comportamento de crise, que estimula uma pressa desesperadora. Aprender rapidamente todas as línguas possíveis e todos os softwares.

Entrar rapidamente na melhor faculdade que te levaria para o melhor emprego. Comprar rapidamente a casa, juntar rapidamente o primeiro milhão, para rapidamente estarmos a salvo de uma ameaça perene. Era lindo nos anos 1980 comer fast food na mesa de trabalho.

Dar o tal “sangue para a empresa”. Até as revistas de moda celebravam esse lifestyle do desespero. E demos o sangue, correto? E estamos a salvo, correto? Não! Mas pensemos em soluções doces, vibrantes, contagiantes como um punhado de balões coloridos. Foco sim, tristeza jamais.

Em 2008, quando a crise pegou a Europa de jeito, era admirável o estupor com que os jovens italianos de Milão olhavam para pequenas diminuições na qualidade de suas vidas. Como assim não tirar férias de 30 dias, sendo 15 destes na praia e outros 15 na montanha? Como assim a parede da biblioteca de 500 anos está levemente descascada? Seria maravilhoso o dia em que nossos problemas diminuíssem para tal dimensão.

E o que faz o mundo da moda nesses períodos mais árduos? Os fornecedores italianos de matéria-prima de moda são um bom exemplo. Profissionais dessa ponta inicial da cadeia produtiva precisam vender seus produtos uns dois anos antes dos desfiles.

Nada fácil provocar o desejo de moda onde ainda não existe a moda, senão na imaginação dos designers! Ainda mais quando o capital está curto: os números da produção e do varejo despencavam.

Coco Rocha - Harper's Bazaar China/ Setembro 2013

Coco Rocha – Harper’s Bazaar China/ Setembro 2013

E uma produção cara, convenhamos, porque o made in Italy prima pela qualidade e não deixa a peteca cair. Estamos falando dos melhores tecidos, dos melhores aviamentos, da mão de obra entre as mais sofisticadas do mundo. “Dobbiamo tirare su di morale!” (“Temos de levantar esse moral!”) diziam um, dois, dezenas de empresários pelos corredores das feiras Lineapelle, Pitti Filati, Milano Unica. Ainda que com o nó na garganta e a conta no vermelho.

A ideia era essa, levantar o moral mesmo, provocar alegria, ainda que uma alegria aparentemente insana, que consegue passar por cima da preocupação, da apreensão, da tristeza de um período ruim. Porque a luta continua, right? E o resultado disso em produtos? Corredores de brilhos, couros sintéticos “leopardados”, misturas arrojadas de cores que ardiam os olhos em pink, verde-limão, tudo muito ácido e chamativo. Levantando o moral mesmo, sacudindo os ânimos.

Como aquele doce tiramisu, famoso na Itália e feito de biscoito, creme, mascarpone e café, e que significa algo como “me põe pra cima”. Debates gastronômicos apontam que o doce nasceu nos eufóricos anos 1950, no Vêneto ou em Friúli, mas sempre com a vontade de ser algo up, talvez para animar o pós-guerra, ou então os prostíbulos, ou então tem esse nome pra energizar jovens antes de fazer uma prova.

Na última semana de moda de Paris o “espírito de tiramisu” (com o perdão do mix!) levantou a poeira da nevrálgica e pop avenida Champs Elysèes. Um desfile da L’Oréal aberto ao público, na pegada inclusiva não apenas pela entrada livre mas pelo casting diversificado – Jane Fonda, 79, uma das mais aplaudidas, desfilou. A modelo brasileira trans Valentina Sampaio também.

O megaevento funcionou como uma grande fanfarra nacionalista e otimista vitaminada, alinhada com a estratégia de Emmanuel Macron. “Quero que a França seja uma nação que pense e se mova como uma start-up”, declarou o presidente, há poucos meses, à imprensa.

Muito dinamismo e força de vontade para levantar uma start-up. Em tempos de terrorismo, o recado é superior e poderoso. E ainda que a festa não resolva o problema, sem alegria, amor e comoção fica ainda mais difícil. Cheers!