
Por Daniela Pizetta
Paula Le Moult talvez não tenha percebido ainda, mas leva a vida, e principalmente o trabalho, no melhor estilo punk-rock. Porém, antes de qualquer surpresa em relação à comparação (afinal, o que uma carioca solar teria a ver com o estilo mais underground do rock&roll), digo que é preciso ir além, pois não me refiro à estética e sim à ética punk, que é toda baseada no “faça-você-mesmo”.

O fato é que não cheguei a esta conclusão sozinha. Tão logo entramos no segundo minuto de conversa, a própria estilista mandou sinais sobre os pilares que sustentam sua personalidade: “não existe nada que eu não consiga fazer, mas se existir, aprendo em cinco minutos”, disse em entrevista à Bazaar.

Hoje morando com a família em Bruxelas, na Bélgica, toca de lá a marca de moda que lançou em 2018 e é inteira produzida no Brasil: Lily Franco. O DNA da label é brasileiro, mas o olhar de Paula é global. Sua rotina é cercada por referências incríveis; dentro e fora de casa. A apenas 40 minutos de onde mora, fica a Royal Academy of Fine Arts, escola localizada na Antuérpia e berço de designers de moda, como Martin Margiela, Dries Van Noten e Haider Ackermann, três integrantes do icônico grupo The Antwerp Six.

A algumas quadras da sua townhouse, fica o ateliê do celebrado florista Thierry Boutemy, responsável pelas instalações de marcas como Hermès, Dior e pelas flores que decoram a sala de jantar de Paula.
Carreira

O trabalho na moda sempre foi um norte para a estilista, que deixou o Rio de Janeiro aos vinte e poucos anos para trabalhar como figurinista nos estúdios paulistanos da Rede Globo. Foram quinze anos na emissora até ser tomada pelo desejo de abrir seu próprio negócio. Por volta de 2004, começou a desenvolver produtos high-end para marcas contemporâneas, enquanto atuava como stylist no mercado editorial e aos poucos construiu seu próprio networking.

Em 2008, foi para a Inglaterra, onde concluiu seu mestrado no London College of Fashion. Por lá, abriu espaço para o amor e casou-se com o franco-alemão Sebastien Le Moult. Juntos, mudaram-se para o Brasil, e foi nesta época que Paula ampliou seus horizontes ao trabalhar para o Grupo Soma, o conglomerado que detém marcas como Animale e A.Brand.

A townhouse
Cinco anos depois, o casal voltou à Europa e mora em Bruxelas até hoje. Foi na capital belga que nasceram os gêmeos François e Antoine, e enquanto um deles é apaixonado por elementos da natureza, o outro é o colecionar dos dinossauros que “decoram” a casa de cinco andares da família. Paula diz que a invasão dos bichos não foi planejada e, sim, absorvida com bom humor: “eu tenho dois meninos incríveis que brincam pela casa e acabamos incorporando seus brinquedos no dia a dia, sem resistência”. Paula também nos lembra que na Europa não existe glamour, e poucas pessoas contratam serviços de babás, por exemplo. “Algumas horas de apoio é natural, mas além de ser caro é malvisto, pois a convivência é parte fundamental da educação e ela é dada pelos pais através de exemplos.”

A casa vertical, no melhor estilo Beaux-Arts, abriga também o escritório/ateliê de Paula, que fica no último andar. “Como trabalho no horário do Brasil, às vezes coloco as crianças para dormir e subo para trabalhar.” De forma geral, o bom gosto do casal e as peças cheias de histórias refletem a personalidade de Paula e de Sebastien. Juntos, gostam de garimpar e descobrir peças com significados, como a obra do brasileiro Caribé, que encontraram em um mercado de artes em Paris, ou a foto da jovem fotógrafa argentina Romina Ressia (uma das preferidas de Sebastien).

Fã da marca americana Rodarte e das divertidas parcerias da Loewe com a icônica Paula’s Ibiza, seu estilo pessoal é reflexo do seu vasto conhecimento, e isso não se resume a marcas de moda. A brasileira conhece seu corpo, ama suas raízes e usa a moda de forma emocional. Um fato curioso, é que Paula tem fascinação por correntes douradas, como a bolsa azul com alça de metal da italiana Bottega Veneta, uma das suas preferidas. Com bom humor, conta que levou o assunto até para a terapia, e descobriu que os elos que tanto aprecia estão diretamente ligados à sua vida social: “ao mesmo tempo que sou extrovertida, tenho poucos e verdadeiros amigos. Meus encontros na vida são fortes, nutrem e me mantém segura.”

Depois de um papo delicioso no melhor português, com palavras francesas que chegavam para preencher os espaços que nossa língua não alcança, percebo que Paula é mesmo dessas pessoas que se entregam. Seu trabalho é “alimento” e tudo que pulsa nela está também nas suas coleções. A Lily Franco nasceu para levar o DNA brasileiro aos europeus e uma das premissas da marca é ser feita no Brasil. Reúne tudo que Paula aprendeu em vinte anos na moda e é também o elo que a conecta com suas raízes: “minha marca é uma maneira de estar perto do sol, falando minha língua e criando um produto que tem minha personalidade.”