Professora, mestre pela Universidade de Brasília e doutoranda em antropologia social pela Universidade Federal de Minas Gerais, Célia Xakriabá tem orgulho de reforçar que ela própria é fruto da Lei de Cotas. “Sempre atuei tentando não apenas acessar a universidade, mas levar a minha cultura para dentro desse espaço. Além disso, até hoje, busco esclarecer sobre as políticas de educação indígena, quilombola e do campo.”
Guiada por sua ancestralidade, a primeira deputada federal indígena do estado de Minas Gerais, eleita com 101.154 votos, avisa que as causas dos povos originários não podem mais aguardar e que o planeta precisa de socorro. “A minha eleição significa muito mais que a união dos indígenas de Minas Gerais. Mostra que as pessoas começaram a entender que nós somos a solução para o planeta. A diversidade e a luta pela mãe Terra foram a centralidade desse pleito. Também precisamos ‘mulherizar’ a política. Com o aumento das violências e a disseminação das nossas lutas, conseguimos dar visibilidade à diversidade. Isso é um avanço e mostra o reconhecimento das pessoas sobre a noção de representatividade. É uma vitória contra o racismo da ausência.”
Ex-assessora parlamentar da deputada federal Áurea Carolina, também do PSOL, Célia reforça que os últimos quatro anos tiveram grande retrocesso nas demandas ambientais. “Os povos indígenas foram os verdadeiros ministros e ministras do meio ambiente. Mais quatro anos de governo Jair Bolsonaro poderiam significar a perda da Amazônia. Nós seguramos o quanto pudemos para a ‘boiada não passar’. Mas a destruição, as violências, o ecocídio e o genocídio são a marca desta gestão.”
Para ela, a demarcação das terras é a única garantia de manter os direitos dos nativos e impor o fim do desmatamento e do garimpo ilegais. “Defendo a educação territorializada, a conservação da cultura indígena e o reconhecimento de tudo o que os povos indígenas significam para a preservação da biodiversidade. Os colonizadores ainda existem, mas nós resistiremos como sempre fizemos. Só que, agora, com voz no Congresso Nacional”, alerta.
Aos 32 anos, acredita que se os portugueses não tivessem atracado as naus por aqui, tudo poderia ser diferente. “Não haveria necessidade de brigar para salvar a humanidade.” Sobre a importância da reparação histórica, Célia é enfática: “Isso demandaria uma mudança radical que não sei se é possível acontecer de uma hora para a outra. O que acredito é na nossa ação diária pela manutenção da cultura e da vida dos nossos povos. O Brasil é terra indígena. Não é sobre o que pode trazer reparação, mas do entendimento que somos os únicos que ainda podem salvar a vida na Terra – e isso é urgente”.