Mulheres que Inspiram: Jane Austen foi pioneira ao contar histórias sob o olhar feminino

Ilustração da autora Jane Austen – Foto: Getty Images

Por Manoela Cesar

Autora de “Persuasão”, cuja adaptação acaba de estrear na Netflix, Jane Austen foi pioneira em contar histórias realistas sob a perspectiva feminina. Mais de 200 anos depois de sua morte (205 neste 18 de julho), estamos aqui debatendo sua obra em uma nova adaptação que, pela primeira vez, se permite ter atores não-brancos nos papéis principais. Só isso já mostra o quanto a nova produção chega alinhada ao discurso de romper preconceitos defendido por aquela jovem, filha de um clérigo, nascida em uma pacata cidade rural da Inglaterra.

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O livro de embasamento para o filme tem uma das frases mais impactantes da obra austeniana: “Os homens tiveram todas as vantagens no que diz respeito a contar sua versão da história (…) uma educação muito mais refinada; a pena sempre esteve em suas mãos. Não vou aceitar nenhuma prova retirada dos livros”, argumenta Anne Elliot, a protagonista. Por isso, vale frisar que Jane Austen não veio ao mundo só para tomar chá, tocar piano e falar sobre mocinhas que sonham com casamentos.

E enquanto aplaudirmos somente as adaptações tradicionais, que insistem em apresentar suas tramas devidamente adequadas à Aristocracia – falida desde então, diga-se de passagem –, estaremos fechando os olhos para uma autora que, em apenas 41 anos de vida, deixou um legado atemporal na defesa por uma sociedade em que as mulheres fossem respeitadas como seres racionais (há quem enxergue em “Persuasão” citações à obra de Mary Wollstonecraft, considerada a grande mãe do feminismo).

Uma escritora que, naquele início do século 19, se posicionava claramente contra a escravidão (Emma e Sanditon), cujas histórias nunca foram românticas, mas muito pautadas em dados concretos de realidade: dinheiro, heranças repassadas sempre para os homens, por mais injusto que fosse, filhas deixadas à própria sorte, falta de perspectiva das mulheres em um mundo com leis que privilegiavam um único lado da moeda. E protagonistas extremamente observadoras, que, com sua inteligência, conseguiam subverter a ordem e, sim, casar por amor, se assim desejassem.

Corajosa e à frente do seu tempo, ainda adolescente escrevia esquetes de humor para denunciar a opressão que enxergava recair sobre os ombros femininos. Desde os idos do Príncipe Regente Jorge IV, em 1815, que acreditava estar diante de uma doce escritora de costumes e que, por meio de seu assessor, cometia a gafe de lhe sugerir pitacos enfadonhos em seus romances (coisa que, claro, Jane Austen transformou em piada na primeira oportunidade). Aos desavisados do século 21, que se julgam feministas mas dizem asneiras como: “ah, não, não leio Jane Austen, estas obras são românticas demais para mim”, infelizmente, estas pessoas não entenderam nada.

Manoela Cesar é jornalista à frente do clube de leitura Colher de Chá Books, focado em reunir mulheres para ler mulheres. 

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião da Harper’s Bazaar Brasil.