
Sua infância na periferia de Paraty foi simples, porém rica em liberdade, natureza e brincadeiras. Teve banho de cachoeira, frutas roubadas do quintal do vizinho e jogo de queimada nas ruas de terra. Criada no Bairro da Mangueira, Thayná Soares, uma de nossas capas desta edição, cresceu em Paraty envolvida com as culturas tradicionais presentes.

Foi mãe da Maria Flor aos 16 anos e mesmo com dificuldades de uma maternidade precoce, se graduou em serviços sociais e fez pós em psicopedagogia. Aos 21 anos entrou para o conselho tutelar de Paraty onde atuou por três anos e exerceu a sua profissão na Casa Abrigo para crianças e adolescentes. Também foi agente de segurança pública na guarda municipal e aos 27 anos surgiu a oportunidade de iniciar a carreira de modelo em São Paulo por forte incentivo de sua filha, que estava com 11 anos na época.

“Após 8 meses buscando oportunidades em São Paulo resolvi ir para Paris realizar meu sonho de trabalhar com Haute Couture. Quando vi, estava entre fittings e showrooms, o que fiz por três anos trabalhando com grandes marcas como: Armani, Alaia, Balmain, Givenchy, Issey Miyake entre outros.”

Neste período de contato com a alta-costura em Paris, percebeu o quanto o trabalho artesanal realizado em Paraty se assemelhava àquele universo em termos de qualidade, técnica e criatividade e ao mesmo tempo permanecia distante em termos de visibilidade e valorização.

O que sempre a deixou inquieta foi saber que a técnica de bordado livre que existe entre as caiçaras de Paraty era praticamente a mesma que via em Paris, com diferença na temática: enquanto os grandes designers buscam inspiração e muitas vezes se apropriam de outras culturas para criar, as bordadeiras de Paraty bordam a representação da própria cultura e vivência cotidiana, tornando cada peça única, autêntica e verdadeira.

Ao iniciar o processo criativo de sua marca, Thayná faz um resgate de memórias afetivas da sua infância em Paraty que logo se somou às memórias de outras mulheres: “Somos um grupo de quase 30 mulheres, compartilhamos da mesma cultura e construímos ideias juntas. Queremos levar aos nossos clientes a história e o significado de cada peça, contando quem bordou, quanto tempo demorou e com isso trazer a reflexão sobre a origem da roupa e seus significados. Acreditamos assim poder impactar positivamente o mundo da moda.”

“Nós brasileiros, que temos uma educação com base colonial e eurocêntrica, infelizmente não aprendemos a valorizar nossa cultura tradicional. Só fui perceber isso depois de alguns anos morando na Europa e de ter viajado grande parte do mundo. Essa percepção se concretizava cada vez que eu falava sobre minha cultura para alguém de outro país e percebia que quem escutava minha fala tinha um olhar mais carinhoso e enaltecedor para meu País do que eu mesma.”

Quilombolas, indígenas e caiçaras são suas referências culturais e fazem de Paraty patrimônio mundial: o título de “Sítio Misto” foi concedido pela Unesco levando em consideração a importância de se preservar as culturas tradicionais ali existentes.

“Em Paraty sempre estive em contato com o trabalho artesanal seja através dos artigos em palha trançada do quilombo ou das artes indígenas, carregadas de culturas e significados em seus grafismos cores e formas.”

Thayná, que sempre esteve presente em ações sociais, durante a pandemia participou ativamente do projeto #ParatyTemGuarani, que, em parceria com a Arte Canoa, garantiu a entrega de cestas básicas e tem a missão de levar dignidade às três aldeias indígenas de Paraty, que têm no artesanato sua principal fonte de renda.

