Por Cassio Prates e Eve Barboza, do Gid Estudio
Em uma das peças da campanha criada por Thomas Lelu para a Polaroid, uma foto impressa registra uma pessoa na praia e, ao lado, sua famosa forma de escrita à mão, de caneta Bic, com a frase: “a Inteligência Artificial não consegue gerar areia entre os seus pés”. A campanha tem outras frases e peças, como “real stories, not Stories & Reels” (“histórias reais, não Stories e Reels”, em tradução livre) e por aí vai.
A colaboração é sensível, contemporânea e bastante óbvia em questionamentos que já são pressupostos no dia a dia de quem trabalha com imagens e criação. No entanto, faz pensar sobre a estrutura da IA como metodologia de trabalho nas indústrias criativas e de moda – e se podemos ou não ser mais inteligentes do que a ferramenta.
Hoje em dia, é quase impossível não trabalhar com IA. Mesmo que você não queira, ela já está presente em todos os programas de edição de imagem. Mas para além disso, a Inteligência Artificial como um meio, e não como fim estético, tem gerado um caminho perigoso e duvidoso no mercado criativo.
Um conceito de imagem baseado exclusivamente em IA pode deixar tudo sem significado – perder a ironia e o humor do retrato –, além de chegar em lugares impossíveis de se alcançar na vida real. Cria caminhos vazios e utópicos que, na maioria das vezes, servem mais para alimentar um sistema perverso baseado na criação de fatos do que na criatividade em si. Nem vale lembrar do filme que o presidente dos Estados Unidos publicou, em que a Faixa de Gaza é reimaginada como a nova Riviera de turismo, cheia de hotéis Trump. Na piscina de um deles, sua persona dorme em calções de banho com Benjamin Netanyahu. A Inteligência Artificial usada dessa forma não precisa mais de artistas ou criativos, especialmente porque já foi amplamente alimentada por eles.
O que também significa que todas as ferramentas das quais a IA depende (incluindo transgressão, provocação, choque e ironia) estão esteticamente ultrapassadas. Quando algumas campanhas, como a criada por Lelu, tentam ser mais inteligentes do que a Inteligência Artificial, elas acabam chamando a atenção de quem ainda se importa com um universo mais criativo e menos dominado pela tecnologia exclusivamente.