Rayssa Leal: “Tenho uma meta, que é a medalha de ouro nas Olimpíadas. Só vou parar quando conseguir”

Em uma manhã ensolarada de junho, Rayssa Leal chega irradiando ainda mais luz ao estúdio onde seriam feitas estas fotos. Skate preto em mãos, estava ansiosa para se lançar na pista cenográfica montada para ela. Entre flips e ollies, a timidez vai se dissipando ao som da playlist GenZ pensada para soltá-la: ia de Alicia Keys e Kaash Paige a Rüfüs Du Sol e Billie Eilish. “Estar em uma capa é algo que jamais poderia imaginar quando comecei a andar de skate”, diz. Em sua estreia em Bazaar, nossa cover girl usa peças que “teria fácil” em seu guarda-roupa. O styling street minimal, com pontos de cor e tons pastel, faz fit perfeito com a atleta e medalhista de prata nas últimas Olimpíadas, em Tóquio. Aos 16 anos, o talento precoce e a garra de conquistar o mundo atraíram a atenção de ninguém menos que Nicolas Ghesquière, diretor criativo da Louis Vuitton, que puxou a nossa “Fadinha” (apelido dado quando ela viralizou ao andar de skate com uma fantasia, aos 13 anos) para seu seleto rol de embaixadores globais.

Quando não está em estúdio para editoriais e campanhas publicitárias, viajando o mundo para competir ou marcando presença em desfiles na primeira fila, a skatista brasileira e promessa de medalha nos Jogos Olímpicos de Paris, tem a vida de uma adolescente comum. Natural de Imperatriz (a segunda maior cidade do Maranhão, distante 635 km da capital São Luís), com 275 mil habitantes, mora com a família, além do pequeno Slink, um pugzinho que faz falta quando ela está dando seus kickflips por aí. “Eu me divirto ao andar de skate, como se eu estivesse em um parquinho de diversões.” Se nas últimas Olimpíadas o momento impedia a participação do público por causa da Covid, neste ano a plateia volta com tudo, na França. Rayssa relata que está se sentindo “mais nervosa” por entender o peso do páreo. “Mas, não é um bicho de sete cabeças. Sinto esse friozinho na barriga de quatro em quatro anos.”

Seu porto seguro em momentos de tensão é a rede de apoio formada por família e amigos. “Quando estou com eles, em dias de folga, quero aproveitar ao máximo.” E isso inclui passar o dia inteiro na piscina da chácara em que vai aos finais de semana, encarar partidas de futebol e jogar conversa fora.

Já nos treinos, o desafio é manter o medo longe e superar os limites nos heats. “Às vezes, coloco uma barreirinha na cabeça, em que falo ‘eu não consigo e nem vou tentar’. Aí converso com a minha psicóloga e com os meus pais. Eles me dão o suporte que preciso, assim como meu coach e minhas amigas. Eles me passam segurança, tento e dá certo.” Toda vez que sai para andar de skate, vai com uma manobra diferente na cabeça. “Quanto mais a gente sai da zona de conforto, mais vai ganhando confiança e abre a mente para tentar algo novo.” O ritual antes de uma disputa foi aprendido com a bisavó, que a ensinou a ter fé. “Em todas as minhas competições, me pego falando: ‘Deus, vai na minha frente’.” Já a sua avó é quem faz suas roupas e os ajustes necessários. No mês passado, ela costurou seu vestido de São João em duas horas. “Faço questão de tirar esse tempinho, abro uma brecha na agenda para prestigiar o Arraiá da Mira, festival do Maranhão, bem famoso, com várias quadrilhas, um momento cultural”, conta.

Neste período pré-olímpico, Rayssa luta para manter a disciplina e não cair em tentações, como jogar futebol na escola, por exemplo. “Sigo morrendo de vontade, mas fico no dominó”, conta, entre risadas. Ela diz que sua agente ligou para ela, um dia desses, pedindo para segurar a emoção e ficar 40 dias de molho. “Tá bom, eu vou conseguir. Afinal, não vou me privar a vida inteira, apesar de que, de três em três meses, praticamente, tenho algum campeonato.” Rayssa segue uma dieta regrada, treina, mas seus pequenos troféus são guloseimas. “É docinho e chocolate para não ficar com fome. Quando vou para a academia, funciona como meu pré-treino”, diverte-se.

A disciplina ela traz também para o seu dia a dia fora das rampas. “Levo minha vida como se estivesse sobre o skate. Às vezes, é óbvio que vão ter as quedas, os nossos outs. Quando estou me sentindo mal, só penso em levantar e andar de skate, se preciso for, para dar uma animadinha.” Mudar-se para Los Angeles, meca mundial do esporte, está nos planos. Mas só quando completar 18 anos e tiver terminado o Ensino Médio, daqui a dois anos. Outra vontade é, finalmente, gravar seu video part – cartão de visitas audiovisual com manobras e tudo o que sabe fazer. “São três minutos andando na rua, corrimão ou caixote, e como não é um trajeto perfeito, tenta-se por horas ou, às vezes, dias. Tem gente que tenta há dez anos e nunca acertou.” Imperatriz, com certeza, será parte do cenário.

Aos 16 anos, Rayssa tem rodinhas nos pés, literalmente. Sabe que serve de espelho para outras meninas. Não conquistou seu lugar sozinha, por isso reverencia aquelas que vieram antes dela. “Tenho uma meta, que é a medalha de ouro nas Olimpíadas. Só vou parar quando conseguir.” E a gente dá como certo: Rayssa terá de dobrar essa meta muito em breve… E, assim, sucessivamente!