Coco Chanel com a socialite britânica Lady Pamela Smith nos salões de alta-costura em Paris (Foto: Getty Images)

O anúncio de Manchester, na Inglaterra, como o endereço do próximo desfile da Chanel, em dezembro, agitou as redes sociais na última quarta-feira (19.07). Seguindo a semana de alta-costura (e depois de uma estreia na África no ano passado, quando a marca se apresentou em Dakar, no Senegal), a revelação do local soou familiar para a maison que, desde sua fundação em 1910, encontra na cultura inglesa uma fonte inesgotável de inspiração.

Na história de Gabrielle “Coco” Chanel, nascida na França em 1883, seus casos de amor com homens ingleses se tornaram míticos. O nome de Boy Capel, a grande paixão de sua vida, já batizou perfumes, bolsas, uma linha masculina de cosméticos e, entre as lendas da história da moda, inspirou até mesmo a criação do logo com os dois C’s entrelaçados que se tornou sinônimo de luxo. Sua morte precoce, em 1919, abriu portas e janelas para outras liasons da estilista – e com ainda mais ingleses. Entre eles, o Duque de Westminster se destacou no hall de amores por apresentar à Chanel o tweed, tecido escocês que ela eternizou em suas criações.

Coco Chanel ao lado do Duque de Westminster, em 1925 (Foto: Getty Images)

Apesar dos dois personagens, foi o primeiro amante de Coco, o herdeiro Étienne Balsan, quem introduziu a estilista no universo e cultura britânicas, durante o tempo que viveram em sua propriedade em Royallieu, no interior da França. Com Balsan, aficionado por cavalos, Chanel aprendeu sobre o turf e a obsessão dos ingleses pelas corridas de cavalo e conheceu, entre os convidados de festas luxuosas, a elite britânica que só se perfumava com fragrâncias da Penhaligon’s. Quando a paixão por Balsan esfriou e Chanel partiu, aos 25 anos, para Paris, onde começou de fato a carreira na moda (ainda como chapeleira, ao lado da irmã Antoinette), conheceu Arthur “Boy” Capel, amigo de Balsan, magnata e industrial inglês, que a fez mergulhar na história de amor que definiu sua vida.

Apaixonado, Capel financiou, em 1910, a abertura de sua primeira boutique (a Chanel Modes) no número 21 da rue Cambon, endereço até hoje associado com a marca. Três anos mais tarde, depois de apresentar a estilista para o elegante litoral de Deauville, providenciou ainda mais fundos para uma nova empreitada no local, que atraiu rapidamente clientes da elite europeia. A terceira aposta do casal veio em 1915, com uma maison de couture inaugurada na também litorânea Biarritz, na costa basca, e que Chanel manteve aberta até a década de 1930 com grande sucesso, graças aos seus designs revolucionários em jérsei.

Coco Chanel e Arthur “Boy” Capel na praia em Saint-Jean-de-Luz, na França, em 1917 (Foto: Getty Images)

Para além do visual masculinizado de Boy, que definiu os gostos da estilista, sua paixão por literatura inglesa também a influenciou: Cathy, a heroína de “O Morro dos Ventos Uivantes” (1847), escrito por Emily Brontë, era uma das personagens de romances favoritas de Chanel. Apesar da relação complicada (Capel se casou, em 1918, com uma herdeira britânica), o affair se manteve até a morte precoce do amante em um acidente de carro, em 1919 – ano que, junto com o dia de nascimento da própria Coco (19 de agosto), transformou o número 19 em uma de suas obsessões ao longo da vida.

Depois de um flerte com o grão-duque russo Dmitri (uma das figuras por trás da história do icônico perfume nº5), Chanel redescobriu, com ainda mais pompa, a cultura inglesa. No Natal de 1923, conheceu em Mônaco o Duque de Westminster, primo do rei da Inglaterra e o homem mais rico do país, apresentado à ela pela amiga e socialite londrina Vera Bate Lombardi. A atração mútua transformou a vida da estilista, que passou a frequentar os iates do novo amante durante as férias no Mediterrâneo e em suas casas na Normandia, Escócia, Noruega, Londres e Chester, onde tinha a enorme mansão Eaton Hall.

Eaton Hall, propriedade do Duque de Westminster na Inglaterra, onde Chanel passou temporadas durante o relacionamento (Foto: Getty Images)

Na casa gótica, restaurada durante o século 19, Chanel imergiu nas paisagens do interior inglês e se inspirou, na roupa dos empregados, para criar modelos listrados que marcaram seu “British Look”. Das costas britânicas, resgatou as boinas de marinheiros e, ainda mais importante, descobriu com o amante (apelidado de Bendor, em homenagem a um dos cavalos de corrida de seu avô) o tweed. Além do romance, a estilista aproveitou o status do relacionamento para estabelecer relações duradouras na sociedade londrina, como a socialite Lady Pamela Smith e Winston Churchill.

Coco Chanel ao lado de Winston Churchill e seu filho, Randolph Churchill, em uma caçada na França, na década de 1920 (Foto: Getty Images)

Em 1927, pouco depois de ganhar do amante uma mansão na Escócia, Chanel também recebeu emprestado do duque uma mansão em Mayfair, no coração de Londres. Lá, além de morar, abriu sua primeira boutique inglesa, atraindo clientes ricas como a Duquesa de York, Daisy Fellowes, Diana Cooper e até a viúva de sua antiga paixão, Boy Capel, Diana Wyndham.

Cada vez mais íntimos, os rumores de uma casamento entre a estilista e o duque começaram a circular na imprensa já no ano seguinte. Ainda assim, a infidelidade de Bendor irritava tanto Chanel que, quando ele a presenteou com uma joia durante uma viagem de iate (em que uma de suas amantes mais jovens também estava presente), ela derrubou propositalmente a peça no mar. O relacionamento terminou oficialmente em 1930, quando Westminster se casou com Loelia Ponsonby, depois que Chanel não conseguiu engravidar. Mesmo com o fim da liaison, ela organizou um desfile de caridade dois anos depois, em um dos apartamentos do duque na Grosvenor Square, com enorme sucesso.

Coco Chanel e o Duque de Westminster em Chester, Inglaterra, em 1924. (Foto: Getty Images)

Em uma das histórias famosas que acompanham a biografia da designer, o embaixador britânico em Paris teria perguntado a ela o porquê de não ter se casado com o duque, recebendo como resposta: “Há muitas duquesas por aí. Mas apenas uma Coco Chanel”. Rebelde e independente, a estilista foi profundamente impactada por suas relações e conexões inglesas – e resta esperar se a atual diretora criativa da maison Chanel, Virginie Viard, olhará para o passado de amores da fundadora para se inspirar em sua coleção Métiers d’Art a ser desfilada na Inglaterra no fim do ano.