
Giorgio Armani – Foto: Reprodução/instagram @giorgioarmani
Por Pedro Diniz, publicada originalmente em 11 de julho de 2024
Há quem diga que ele anda repetitivo no discurso. Mesmo padrão de cores, mesma modelagem, mesmo glamour alinhavado em tecidos tecnológicos nas passarelas. A questão é que quem enxerga voltas no próprio eixo nas criações de Giorgio Armani talvez nunca tenha entendido a relevância desse italiano de Piacenza, para a fundação dos pilares do que entendemos por casualidade do estilo. Até ele fazer os primeiros cortes na Hitman, do conterrâneo Nino Cerruti, há exatos 60 anos, a alfaiataria seguia um tipo de rigor técnico no qual entretelas, forros e enchimentos reproduziam o visual engomado de sempre. Logo que vendeu um fusca para ter dinheiro para abrir seu ateliê, tratou de desmembrar tudo e, assim, permitir às redes de lojas escalar, por exemplo, paletós para homens e mulheres. Antes dele, homens deveriam seguir regras de corte, paletas de cor e tecidos para se dizerem elegantes. Quando conseguiu que Richard Gere, em O Gigolô Americano (1980), misturasse camisa azul com abrigo rosa bebê sobrepostos ao paletó de jacquard cinza, criou a imagem do yuppie moderno, alterando as bases de toda a geração jovem de Wall Street
O próprio cinza ganhou nova cara, quando adicionou tons de bege à escala P&B, criando a tonalidade símbolo de sua moda. Armani não é minimalista stricto sensu, mas suas roupas, sim, guardam a leveza das linhas e a pureza intrínseca à escola artística que, agora, assume nomes com o prefixo quiet gravados. Não é possível chamar de minimal a mistura, comum em suas passarelas, de púrpuras e rosas, verdes e azuis fundidos – o tom Acqua di Giò, popularizado como emblema do sucesso do signore Armani na perfumaria – e as diferentes bases de preto unidos em um mesmo look. Porém, a destreza com a qual ele funde tecidos da mesma cor para que reflitam de formas distintas à luz do dia e na noite, criaram um arquétipo de glamour tão delicado que comumente confunde quem gosta de rótulos fashion. Armani nunca gostou deles porque sabe ter sido um pioneiro de várias frentes. “Sempre olho o que está ao meu redor, mas eu jogo com as coisas do meu jeito, também porque eu fui o primeiro a introduzir muitas coisas”, disse a este jornalista, na ocasião de um desfile em Londres, em uma das vezes que lhe concedeu a fala.
Numa outra vez, pareceu querer responder aos porquês do seu sucesso a quem tenta rotulá-lo. “Devo confessar, não tinha uma grande paixão por moda, pelo menos não no começo. Acabei neste mundo porque queria desenhar para pessoas reais. Fiz uma busca contínua por harmonia e linhas. A reação do público foi surpreendentemente positiva.” É tudo por dinheiro? “Dinheiro é ferramenta, não a motivação do meu trabalho. Sempre quis me expressar, ficar rico só foi um resultado. Tive restrições na infância, então, trato dinheiro da mesma forma hoje em dia: gasto prudentemente.”

Giorgio Armani – Foto: Reprodução/instagram @giorgioarmani
Talvez venha desse passado difícil no pós-guerra, o desejo de querer falar por si e de ser pioneiro. Quando nem se falava numa tal democratização do estilo, primeiro com o fast-fashion e, mais recentemente o ultra-fast-fashion de Shein e companhia, fundou a Armani Exchange, já extinta, e a Emporio Armani, mais viva do que nunca, para chegar aos diferentes estratos. Não há jovem, pobre ou rico, que não conheça o símbolo EA, ou o AX, gravados em camisetas lisas, jeans e toda sorte de roupas que, de tanto sucesso, foram copiadas, pirateadas e, sem que o dono percebesse, lançaram a logomania vigente até hoje. É obra de um visionário inconteste fazer o simples símbolo EA7 virar marca de uma nação, como quando colocou a insígnia nas camisetas da seleção italiana de futebol. Até 2026, sua grife vestirá atletas olímpicos em torneios. Sabiamente, nunca deixou os tapetes vermelhos e é em sua Armani Privé que mantém a mística em torno do sobrenome.

Giorgio Armani – Foto: Reprodução/instagram @giorgioarmani
Joga com pedras, tecidos e matemática que remete aos primórdios de uma história de elegância inimitável. Até o século passado, o Oscar recebia o apelido na imprensa de Prêmio Armani, tamanho o sucesso que seus modelos faziam – e fazem, se olharmos a lista dos mais bem-vestidos. Giorgio Armani nunca poderia se repetir, porque suas roupas não são meras ilustrações de um tempo. Olhe de perto e você verá que o motivo de existirem é tentativa ininterrupta de seu mestre de retirar a carga das convenções. Para os homens, diminuir o peso de manter a aparência viril-agressiva, e, nelas, desconstruir a insistente feminilidade adocicada. Não é repetição, mas, sim um embate constante entre o passado de gesso e um futuro mais feliz.