
Por Jorge Wakabara
Um dos nomes que melhor traduzem a sofisticação carioca na verdade é paulista: Maria Helena Ortiz Niemeyer se mudou para o Rio em 1979, quando casou com Paulo Niemeyer Filho. Originalmente da área de arquitetura e se vendo sem trabalho, ela começou a fazer biquíni na sala de jantar. Literalmente.
“O biquíni são quatro triângulos, né? Dois no peito e dois embaixo. Tínhamos dificuldade em achar biquíni de um tamanho adequado, em São Paulo todo mundo usa um pouquinho maior. Então comecei a fazê-los para me ocupar: pegava uma canga, cortava na mesa de jantar… E arrisquei, fiz uns ossinhos, queria tanto um biquíni desse e não tinha mais. Não havia muito aviamento naquela época, então eu mesma cortava o tutano do boi, lixava. Tudo na mão”, Lenny Niemeyer conta, com o charme de quem é considerada uma das melhores anfitriãs do Brasil.

Foi assim que a estilista deu a largada para uma das marcas mais chiques do território fluminense. Quem usa maiô e biquíni da Lenny garante: é o melhor caimento. E quem experimenta, volta! Mas ela, que nasceu na litorânea Santos, tinha uma relação com moda praia antes de ir para o Rio? “Nenhuma! Comecei por começar”, responde.
Só que depois desses primeiros experimentos irem para uma amiga que vendia roupa em casa, fez-se o destino. A amiga vendeu todos e pediu mais. Lenny, por sua vez, começou a reparar que ela pensava (e fazia) algumas coisas bem diferentes e que o pessoal, apesar de achar inusitado, comprava. Existia um público carente de ideias mais arrojadas.
“Era tudo muito fio dental, muito verde-limão. O tamanho das estampas, por exemplo, era sempre miudinho. Eu, que vinha do universo da arquitetura, buscava estampas maiores, não entendia por que usavam coisas tão minimalistas e temáticas nos maiôs”, explica.

Existe uma lenda de que ela pegou um lenço da Hermès do armário da mãe para servir de base para uma estampa. É verdade? “Quando comecei a trabalhar, não tinha recurso para desenvolver estamparia. Então, sim: pegava um lenço da Hermès, mudava um pouquinho. Os desenhos eram feitos a guache e todo mundo achava que aquilo era uma loucura. Perguntavam: ‘Isso vai virar um biquíni?’ Aí no biquíni, com estampa cheia de elementos de selaria, não aparecia o bridão. Eu falava ‘deixa, não precisa’. Porque na saída de praia ele aparecia!”
No primeiro desfile de Lenny, na Semana Leslie de Estilo em 1996, o drama era arranjar alguma celebridade para participar – coisa essencial para atrair mídia. Uma ligou se oferecendo, tanto que acabou virando uma grande amiga e quase um símbolo não-oficial da marca: a atriz Carolina Ferraz.

A partir daí, virou um statement: o casting da Lenny estava sempre tão recheado de tops poderosas, que a lista de modelos também era notícia! “Eu gostava: queria ter as melhores, as mais conhecidas”, ela relembra. “Isso acabou, não tem mais sentido. Hoje em dia existe uma aceitação maior da variedade de corpos. Continuo exigente na forma que elas andam e se posicionam, mas é independente do corpo. De serem mais velhas, mais novas, mais cheinhas ou mais magras.”

Já a moda amadureceu. Com o tempo, Lenny limpou seu estilo, dando mais ênfase à roupa, desafiando formas, experimentando materiais, ampliando o leque de inspirações. Imagens poderosas substituíram as tops na expectativa de quem ia aos eventos, como a estufa translúcida do verão 2015 trazendo pétalas esvoaçantes saindo das peças de roupa, em efeito 3D; ou o japonismo do verão 2017 com quimonos e lindas carpas em jaquetas bomber (que viraram um dos maiores objetos de desejo daquela temporada); ou as geometrias do verão 2018 inspiradas nos trabalhos das artistas plásticas Hilma Af Klint e Emma Kunz. Quem conhece sabe: a estilista segue muito nervosa no backstage, antes de cada apresentação acontecer. É de praxe. Mas continua amando fazer desfile!
E Lenny sempre foi fascinada pela cultura carioca de sair da praia e ir para um contexto urbano com o mesmo look. A improvisação e a invenção de moda que a rodeavam eram encantadoras e inspiradoras. Tanto que a marca Lenny Niemeyer virou a maior tradução disso: o requinte que ultrapassa os limites da areia e do asfalto.

No desfile de 30 anos da marca, ela mostra mais uma vez que a moda praia não precisa se condicionar a rótulos e preconcepções. Vida longa!