
Assim como Coco Chanel, Karl Lagerfeld acreditava que as roupas somente ganham sentido quando são usadas. Em um desfile, acompanhadas de cenário e trilha sonora, ficam ainda mais expressivas, criam uma narrativa. São cerca de 15 minutos mágicos, quando a moda consegue traduzir a sociedade de seu tempo de maneira espetacular.
Foi assim no Inverno 2019/20 da Chanel. Ainda que a atmosfera fosse de luto, a apresentação da última coleção do kaiser para a grife francesa era sobre leveza e liberdade. São valores que estão no radar da moda. Vêm sendo trabalhados nas duas últimas temporadas das mais diversas maneiras e ganham, agora, um capítulo pautado por estampas.
A estação de esqui montada pela marca especialmente para a apresentação traduz, de maneira poética, essas vontades, em uma conexão direta com a natureza. Tanto que Lagerfeld transformou em print sutil uma pista de esqui, com direito a alegres e coloridos esportistas em ação, sem nenhuma barreira à vista. Metaforicamente, é essa conexão com o meio ambiente que atualiza o desejo coletivo por uma vida menos complicada; movimento que a gente está vendo crescer dentro e fora da passarela.

Nas coleções recentes, foi traduzida em tecidos fluidos, plumas e junções inesperadas de peças levinhas, como se fosse disposta em camadas, de maneira descompromissada. No desfile-homenagem a Lagerfeld na Chloé – ele esteve durante 25 anos à frente da equipe de estilo –, a atual diretora criativa, Natacha Ramsay-Levi, também incluiu uma paisagem natural bastante realista.
A cena, que estampa camisetas, evoca um sentimento de liberdade e, ainda, proximidade e paz, inspirada no pioneirismo da velejadora francesa Florence Arthaud, primeira mulher a bater o recorde da travessia do oceano Atlântico Norte. Tudo temperado com uma essência retrô dos anos 1970 inspirando roupas para o dia a dia, com ênfase em uma alfaiataria equestre.

Já Clare Waight Keller foi buscar suporte estético no mítico Jardim do Éden para criar flores que mais parecem nuvens, rodeadas por borboletas brancas, sobre vestidos com microplissados. A imagem traz um estado contemplativo e harmônico, mas com certo humor, graças às barras sinuosas. O resultado é um antídoto fashionista contra a ansiedade.

O mesmo pensamento é válido para a estampa repleta de estrelas que deixa bem mais jovial o vestido à la diva hollywoodiana do diretor criativo Julien Dossena para a Paco Rabanne. Na Valentino, esse sentimento de leveza veio borboleteando em meio à longa sequência de peças estampadas com a imagem neoclássica de um casal, assinada por Jun Takahashi, aka Undercover.
O diretor criativo Pierpaolo Piccioli construiu em intársia as figuras coloridas do inseto, acompanhadas por uma das frases sobre o amor que vêm salpicadas pela coleção, assinadas por quatro poetas: o escocês Robert Montgomery, que cria painéis gigantes com frases; a feminista inglesa Greta Bellamacina; Yrsa Daley-Ward, mais conhecida como “poetisa do Instagram”; e o letrista Mustafa the Poet, que assina algumas das letras de The Weeknd.

A mesma técnica foi usada por Demna Gvasalia para construir as flores que brotam no quimono de tricô da Balenciaga para o Inverno 2019/20, inspirado em suas observações do street style dos parisienses. A intársia aparece, ainda, nos balões que surgem na bomber de tricô do inglês Christopher Kane. Além de sugerir leveza, segundo ele essa imagem está irremediavelmente ligada à ideia de fetichismo, assim como os líquidos coloridos que aparecem em acessórios e detalhes de plástico.
Independentemente da temática adotada por cada estilista, e atenta ao mood do momento, a moda contribui, à sua maneira, para deixar a vida mais leve.
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