
Como a ex-primeira-dama transformou escolhas de estilo em mensagem pública e arquivo político de uma era. Imagem: Reprodução
Há mais de duas décadas o mundo observa Michelle Obama, primeiro como advogada e figura pública em ascensão, depois como primeira-dama que transformou a moda em linguagem. Nos oito anos em que acompanhou o marido, Barack Obama, na Casa Branca e, depois, no capítulo seguinte, consolidou um jeito de vestir que equilibra acessibilidade, sofisticação e propósito. “As pessoas esperavam pelos looks e, quando eu conquistava a atenção, elas ouviam o que eu tinha a dizer. Esse é o poder suave da moda”, escreve em “The Look”, seu novo livro que apresenta seu estilo pessoal e, nesta terça-feira (04.11),liderou os mais vendidos da Amazon na sessão de autores e autoras negras.
Como relembra a publicação, no início de 2009, Michelle Obama usou casaco e vestido amarelo-claro de Isabel Toledo no Dia da Posse e, à noite, um modelo branco de um ombro só de Jason Wu. As escolhas inauguraram um protocolo próprio: estilistas norte-americanos, leitura fresca do cerimonial e uma silhueta limpa que marcou um começo. Ao mesmo tempo, sua imagem entrou no redemoinho do escrutínio público; o corpo atlético virou pauta, os cardigãs viraram rótulo e o cabelo se tornou ponto político. “Eu sabia que não poderia oferecer nada mais até que o país me conhecesse”, disse em entrevista a ABC. Durante os anos na Casa Branca, ela manteve os fios lisos para não deslocar o foco do trabalho e, ao lado do cabeleireiro Johnny Wright, aprendeu caminhos de proteção com perucas e extensões, preparando o terreno para um futuro de mais liberdade.
Com a imagem consolidada, a paleta e as formas ganham jogo. No segundo mandato de Obama, a experiência cresce sem romper o código institucional. Em 2021, já na posição de ex-primeira-dama, ela ressignifica a cena pública na posse de Joe Biden com o conjunto framboesa de Sergio Hudson. Monocromia intensa, impacto de presença, e a visibilidade de um designer negro americano em um momento de alta audiência.
Na fase pós-Casa Branca, o repertório se ampliou. A partir de então, o cabelo abre outro capítulo. No livro, Michelle mapeia o alisamento químico da infância à rotina de proteção térmica que manteve durante o governo. Assim que a narrativa pública estava assentada, vieram as tranças, os coques altos, os cachos e as mechas castanhas. “Tranças são mais fáceis; me dão liberdade”, diz. O gesto dialoga com discussões atuais sobre discriminação capilar e iniciativas que proíbem sanções por textura e estilo. Ela reconhece que a decisão de manter o cabelo liso na Casa Branca foi estratégica para aquele tempo e, no presente, usa a própria imagem para abrir espaço a outras leituras de profissionalismo e beleza.
Nada disso acontece ao acaso. Meredith Koop, stylist de longa data, organiza as aparições por pauta e contexto, define paletas funcionais, escolhe materiais que resistem à luz de palco e câmeras e alterna nomes consagrados e vozes em ascensão sem deslocar a mensagem central. Com ela, a alfaiataria sem mangas da Monse e o smoking canadense da Ganni passam a compor um repertório coerente, em diálogo com beleza e cabelo. Assim, “The Look” registra esse processo criativo de moda, com fotos e com textos da própria equipe e que deixa claro seu método: roupa como ferramenta de trabalho e imagem construída para servir ao que será dito.





