Vitrine da boutique Hermès na Faubourg Saint-Honoré, em Paris. (Imagens: Divulgação)

Lever de rideaux – quatro vezes por ano, é esse o evento (“levantar das cortinas”) que atrapalha o trânsito na frente do número 24 da Faubourg Saint-Honoré, no coração de Paris. Tudo por um bom motivo: dezenas de pessoas ansiosas para ver, de perto, as novas vitrines da Hermès, assinadas por Antoine Platteau, decorador e figurinista que, há dez anos, é o designer oficial das “janelas” no endereço icônico da maison. Em conversa exclusiva ao editor de moda Guilherme de Beauharnais, ele conta os segredos de seu estilo, processo criativo e jornada de uma década “atrás do vidro” de uma das marcas mais exclusivas do mundo.

Guilherme de Beauharnais: Quando você percebeu que tinha talento para criar vitrines?

Antoine Platteu: O trabalho com vitrines é um exercício muito particular para o qual eu não estava nem um pouco preparado. Em 2013, quando tive a surpresa de ser chamado por Pierre-Alexis Dumas, diretor artístico da Maison Hermès, que me propôs essa missão, fiquei muito impressionado pelo talento e conhecimento de Leïla Menchari (e Annie Beaumel antes dela). Quanto a mim, foi mais uma questão de prática adquirida e desenvolvida ao longo das estações. Minhas duas predecessoras tinham temperamentos totalmente diferentes. Tenho grande admiração por Leïla Menchari, mas sinto-me mais próximo de Annie Beaumel, talvez pelo senso de espetáculo. Leïla tinha uma abordagem de artista, enquanto, em minha opinião, Annie Beaumel era uma maravilhosa artesã de ideias, fantasia, poesia, estranheza e malícia, atributos com os quais me identifico.

Vitrine da boutique Hermès na Faubourg Saint-Honoré, em Paris. (Imagens: Divulgação)

GDB: Onde você encontra inspiração para as histórias que conta em suas vitrines?

AP: Essa substância volátil que é a criatividade está em cada esquina e eu uso tudo o que posso. A inspiração é a conexão de várias memórias entre si, é uma associação de ideias, um “cadáver esquisito”.

GDB: Quando você anda pela rua, presta atenção às vitrines ou tenta evitar olhar o que as outras marcas fazem?

AP: Pelo contrário! Adoro olhar as vitrines e algumas marcas com as quais sinto uma afinidade de gosto e espírito são particularmente queridas para mim. Penso no trabalho de Serge Lutens, muito refinado e espirituoso, e no de Olivier Saillard para J.M. Weston, impactante e cheio de humor. Infelizmente, nos últimos anos, a prática da vitrine tem se perdido muito em favor da transparência nas lojas.

GDB: Nos últimos 10 anos, o que mais mudou no seu trabalho, na sua opinião?

AP: Bem, eu diria que fui eu quem mais mudou. A confiança, a benevolência e o entusiasmo que a maison Hermès me concede a cada trimestre me permitem ter uma liberdade de expressão crescente e um trabalho cada vez mais lúdico. Mais do que métodos de trabalho ou ferramentas, foi o tempo que fez sua obra.

GDB: Quando você começou a trabalhar na Hermès, Jean Paul Gaultier estava saindo da maison e Christophe Lemaire estava começando. Em 2015, Nadège Vanhee-Cybulski se juntou à casa. Seu trabalho se torna mais difícil quando há uma mudança de diretor artístico?

AP: Uma das particularidades das vitrines da Faubourg é que elas são dissociadas de qualquer contingência desse tipo. Desde o início, a regra do jogo determinou que elas fossem um território que evolui fora de qualquer influência. Além disso, sua concepção permanece secreta para todos até o levantar da cortina. No entanto, cada estação é trabalhada para destacar a particularidade da Hermès, com o objetivo de se dirigir a todos os passantes. O único ponto obrigatório é não esquecer as crianças, o que para mim significa que devemos tentar fazer sonhar o maior número de pessoas.

Vitrine da boutique Hermès na Faubourg Saint-Honoré, em Paris. (Imagem: Getty Images)

GDB: Você cria quatro vitrines por ano… Quanto tempo se passa entre a primeira ideia e o resultado?

AP: O tempo entre cada vitrine é contado rigorosamente pelo calendário. As estações impõem uma mudança a cada trimestre e o departamento de decoração evolui em um ritmo particularmente acelerado. Por razões de viabilidade, uma ideia só costuma ser realizada duas ou três temporadas depois do primeiro conceito. Isso me faz pensar nas tapeçarias realizadas com o artista Antoine Carbonne, com vinte e quatro peças tecidas em Felletin, cidade próxima de Aubusson no coração bucólico da Nièvre, que exigiram um ano de trabalho. Como pode ver, tudo é muito variável, é difícil estabelecer uma regra. Além disso, tento planejar com bastante antecedência para o deixar o processo menos exaustivo, mas me parece que o exercício é uma conversa com a rua que se inscreve no espírito do tempo. Planejar com muita antecedência pode, às vezes, secar a troca com o público.

GDB: Pode me dar um spoiler sobre as próximas vitrines do Faubourg?

AP: É tradicional que o segredo seja mantido até o levantar da cortina. No entanto, posso te confidenciar que o tema será o Natal…

Vitrine da boutique Hermès na Faubourg Saint-Honoré, em Paris. (Imagens: Divulgação)

*Um trecho dessa entrevista foi publicado originalmente na edição de novembro/2024 da Harper’s BAZAAR Brasil.