
Valentino, primavera-verão 2025 (Foto: Divulgação)
É preciso ser snob para entender a estreia de Alessandro Michele na Valentino? Não, mas ajuda. Desde sua nomeação, em março, as opiniões foram várias e sua primeira coleção (lançada de surpresa, em junho), girou muitas cabeças. Eu mesmo, naquela época, jogado em uma cama em Mônaco, achei que tinha meio cara de sobremesa. Enfim, mordi minha língua – como bem esperava.
Michele, agora, está mais em casa do que jamais esteve na Gucci. Lá, sim, suas excentricidades eram um delírio. Aqui, chez Valentino, têm sentido. A essência da casa florentina, afinal, sempre foi demasiada urbana para o romano colecionador de antiguidades (e Sabato de Sarno tem ido muito bem na direção contrária). Sim, eu sei que é difícil aceitar, mas a Valentino de Alessandro Michele é a mesma Valentino de sempre! Ou quase.
Pierpaolo Piccioli, seu antecessor que, segundo fofocas, está a caminho de voltar para Fendi, tinha um olhar elegante para a moda – plumas, transparências, blocos de cores, basiquinhos nada básicos… era esse o seu parquinho, com frescor real sobre os códigos mais superficiais (sem qualquer desdém) da casa. Michele, entretanto, mergulhou fundo nos arquivos e, de corpo e alma, se nutriu do exagero italiano que fez parte da essência Valentino em suas primeiras décadas.
Casaquetos e jaquetas bordadas, por exemplo, chegam idênticas a modelos dos 80’s e 90’s, sem muita cara de novidade (o styling atrapalha), mas com leveza. É sério! Dias depois do show, segurei todas as roupas com a mão e, apesar de todo o brilho, parecem plumas. Falando nelas, aliás, a coleção tem várias – e os chapéus à la Belle Époque são iguais aos da temporada de 1971.
Também há chapelões e rendas mil (trazidas de 1994), com uma boa dose de estampas “caxemira” (paisley, para quem gosta do inglês) que resgatam o orientalismo de outros tempos. Golas com babados são um charme à parte – fazem mesmo pensar na festa circense que Valentino Garavani organizou no Studio 54, em 1978 – e os poás são dignos de um guarda-roupa da geração X.
Enfim, dá apenas para imaginar o que Alessandro Michele ficou fazendo (se é que fez alguma coisa) durante seu exílio da moda pré-Valentino, mas teve tempo para suficiente para contemplar o existencialismo de Frankl e as estéticas de Théophile Gautier, Martin Heiddeger e Michel de Montaigne. Eis seu maior esnobismo: Alessandro não está procurando nada novo – quer buscar a beleza escondida no tempo (e nas gavetas) da Valentino.