
Fotos: Gabriela Queiro
Minutos após o desfile de Uó por Marcelo Sommer encerrar a passarela da 60ª edição do São Paulo Fashion Week, ainda pairava no ar a sensação de recomeço. Um recomeço de quem olha para o passado sem nostalgia, mas com a urgência de reconstruir com tempo, memória e consciência. Marcelo Sommer, ícone da moda autoral brasileira, apresentou sua nova marca como um manifesto vivo sobre o que significa fazer moda em 2025.

Fotos: Gabriela Queiro
“Uó”, gíria que o próprio Sommer ressignifica, deixa de ser o adjetivo do que é brega ou descartável para virar sinônimo de transformação. É o luxo do improvável, o belo encontrado no que foi deixado de lado. Essa lógica guia toda a coleção, criada a partir do garimpo de peças nacionais e internacionais, reinventadas sob o olhar do estilista com detalhes pintados à mão com cervos, números e laços — símbolos que revisitamos desde os anos 1990 em seu universo criativo — agora reinterpretados sob a estética do upcycling real.

Foto: Gabriela Queiro
Entre um look e outro, conseguimos trocar algumas palavras com Marcelo, que nos contou um pouco sobre o processo de criação. “Essa é a minha quinta ou sexta coleção de upcycling. Venho fazendo roupa nesse processo desde 2019 e já fiz várias collabs. Nesta coleção, eu e meu marido estamos garimpando desde o ano passado peças de acervo, aqui no Brasil e fora, também tem muita coisa do Brechó Capricho à Toa. Pela primeira vez estou trabalhando com tecidos sustentáveis, todos com o carimbo LENZING ECOVERO, que são fibras naturais que se decompõem no meio ambiente e têm origem rastreável”, explicou.

Foto: Gabriela Queiro
Na quadra da Academia Competition, na rua Oscar Freire, sob o voo de drones, o desfile pulsou em um hi-lo de sport e street com volumes amplos, recortes assimétricos, texturas e um mix infinito de estampas. Entre diversos truques de styling, camisas unidas por botões viraram saias, camisetas esportivas foram combinadas com peças de flanela, moletons, babados e muita renda. A paleta transitou entre brancos e off-whites, tons intensos de verde, royal, amarelo e vermelho.

Foto: Gabriela Queiro
Para o novo momento, o estilista convocou nomes que partilham da mesma crença na regeneração criativa: Gilda Midani, que assina quatro looks em collab, explorando a cor e a matéria em estado livre; e Alexandre Herchcovitch, que abriu sua oficina para confeccionar peças mais complexas, num reencontro simbólico de duas trajetórias que moldaram a moda brasileira. O styling se completou com acessórios de History.Call, óculos curados pela Marchon, tênis vintage da Fila e etiquetas criadas pela Hacco.

Foto: Gabriela Queiro
“Esta coleção começou a ficar muito bonita e sentimos a vibração dela. Foi aí que falamos: ‘Tá na hora de fazer um desfile’. Já vinha conversando com o Paulo [Borges], que sempre esteve do meu lado, então entendemos que era o momento certo de voltar”, contou Sommer sobre sua estreia no SPFW.

Foto: Gabriela Queiro
Sobre o futuro da marca, ele foi enfático: “Tenho um sonho de fazer o upcycling em escala industrial. Ainda estamos falando de uma coleção artesanal, são poucas peças, mas acredito que dê para fazer esse trabalho em larga escala. Muitas marcas grandes aqui no Brasil têm estoques enormes de 50 mil, 100 mil peças — sobra de piloto, pequenas imperfeições, estoque parado. Já existem marcas fora do Brasil que fazem isso, e acho que está na hora da gente começar.”

Foto: Gabriela Queiro
A coleção, marcada por um espírito de memórias e nostalgia, ganhou ainda mais significado neste momento em que o SPFW celebra três décadas de história. Em sintonia com o sentimento, Marcelo escalou um time de modelos que fizeram parte de capítulos importantes da moda brasileira, como Ana Claudia Michels, Carol Ribeiro, Pathy de Jesus, Luciana Curtis, Flavia Lucini, Caroline Bittencourt, Sabrina Gasperin, Anabela Santos e Luciana Giani.

Foto: Gabriela Queiro
Trinta anos depois de sua primeira estreia nas passarelas, o estilista prova que, para ele, o tempo é matéria-prima.