Aos 44 anos, Zoë Saldaña está mais do que acostumada com o termo “mulher forte”. Não apenas nas telinhas ou telonas, onde a vimos interpretar papéis memoráveis com aspiração a guerreiras – nos diferentes sentidos da palavra, vale destacar -, como Amy Wheeler da série “Recomeço” (Netflix) ou a Gamora do blockbuster “Guardiões da Galáxia” (Marvel).
Mas porque foi criada por mulheres sobreviventes aos ambientes social, político, religioso e genético. Essa garra veio de nascença como forma de sobrevivência, Zoë explica. “Não é uma decisão consciente. Quando leio um personagem e vejo algo que me lembra um momento, acontecimento ou mulher da minha vida e do meu ambiente, vale a pena contar a história”, resume em conversa com Bazaar.
Prova disso? Ela volta a interpretar Neytiri, a mesma protagonista marcada em sua carreira há 13 anos e que a catapultou ao estrelato, no novíssimo “Avatar: O Caminho da Água” (Disney) – que chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (15.12).
Para o segundo filme da franquia de James Cameron, com mais três longas sobre os Ikran (criaturas azuis protagonistas da trama) engatilhados até 2028, a atriz teve de aprender novas habilidades, como mergulho livre e a respiração debaixo d’água por mais de um minuto. “A uma profundidade de até 30 mil pés (algo próximo a 9 km)”, exclama. “Até agora, o maior desafio que já recebi na preparação para um papel fisicamente. Gratificante, incrível, mas assustador no começo”.
No preparo, ainda resgatou outras habilidades, como a língua nativa desse povoado da lua Pandora (planeta fictício do longa). Se no já distante 2006, quando ocorreram as gravações daquela primeira parte, aprendeu a manusear arco e flecha de forma maestral, sua psique manteve a performance como se o instrumento fizesse parte de seu corpo e, após alguma prática, lhe rendeu boas histórias nesta sequência. “Toda vez que era desafiada a acertar algo, conseguia e ganhava dinheiro. Às vezes, cerveja. Foi incrível”, diverte-se.
Quando se fala sobre o fantástico mundo criado por Cameron, Zoë ressalta o meio ambiente como foco. E não apenas a preocupação com queimadas ou exploração de riquezas, mas uma sensação de déjà-vu desde o antecessor, por causa de suas raízes e ascendências dominicana e porto-riquenha. “Sou, antes de mais nada, latina. Nascida como a primeira geração americana, mas formada por três mundos unidos por escolha e por força nos últimos 500 anos: heranças africana, indígena e europeia”, pondera. “De norte a sul deste continente, as pessoas podem se relacionar com tópicos como colonização, invasão e apagamento de uma espécie. Somos muito familiares, eu e Neytiri”, reflete. Sabedoria, discorre, regeu esse reencontro.
Agora, mais velha e mais sábia. “Virei mãe, algo que não era no primeiro filme. Pude explorar e incorporar muitas emoções pessoais à Neytiri. Estávamos vivendo de forma muito paralela”, reforça sobre os desafios inimagináveis para qualquer pai ou mãe e que foram levados em conta na trama. Sem spoilers!
A atriz até concorda: é possível ir aos cinemas sem ter assistido à primeira produção. Mas, antes, aponta “Star Wars” como um exemplo prático. “Como você vai apreciar o filme ou a experiência criada se não tiver assistido aos primeiros episódios?”. Para ela, conhecer a história até aqui e o universo criado até então aprimoram a experiência. “Há pessoas que eram jovens quando o primeiro foi lançado e agora são pais de crianças com idade suficiente para assistir”, complementa. “É o tipo de filme cuja experiência só pode ser sentida por completo na tela grande. Sentir o som, colocar os óculos 3D para apreciar o nível de trabalho, tecnologia e o tempo de montagem dessa produção”.
Para se desvincular de uma personagem, Zoë não é do tipo que carrega souvenir para casa, adereço ou outfit. “Disseco meus roteiros e escrevo notas e as coloco naqueles fichários, que vão ficando cada vez mais grossos”, conta. “Guardei cada um deles, porque o nível de trabalho que emprego é tanto… Gosto de lembrar do trabalho duro”.
E se você se perguntar se deve assistir a esta sequência, lembre-se: por muitos anos, Avatar foi a maior bilheteria mundial. Perdeu por um curto período para “Vingadores: Ultimato”. Mas, com a reestreia especial nos cinemas neste 2022, voltou ao topo da lista com um total de US$ 2,847 bilhões (na faixa dos R$ 15 bilhões) arrecadados até o fim de novembro.
Antes de nos despedirmos, Zoë reforça um ponto importante sobre o longa-metragem. “É captura de movimento, não é animação. Essa tecnologia não substitui tamanho esforço e dedicação de um ator na sua interpretação e sua transformação”, explica. Para ela, esta atuação vai desde a fala até o brilho no olhar. É com isso que o cineasta trabalha! “É ele quem explica ao ator como uma arma funciona, a textura e até o som daquela fera ao entrar e atacar o personagem, para o ator dar o tom, a intensidade e o grau de atuação que precisa”.
À frente do tempo, talvez naquele 2009, a academia do Oscar e as outras premiações não haviam entendido o verdadeiro papel e legado dos atores para dar “o reconhecimento às pessoas da equipe, que se uniram para fazer Avatar”. Pois foram muito premiados como produção, efeitos e adereços, mas não os atores e time. Por falar em conquista, Zoë acredita que as mulheres devam celebrar por sobreviver aos estigma masculino e machista no mundo, seja de um pai, de um avô, professor e até mesmo de um estranho. “Isso já faz dela uma mulher forte”, arremata.