Por Carolina Andraus
Poderíamos tentar definir Carolina Augusta como uma alma criativa de fortes raízes europeias, uma dualidade de leveza e profundidade que juntos constroem até um certo ar de mistério, de atemporalidade. Conhecer Carolina Augusta é quase como um transporte para o futuro em qu pudemos resgatar toda a beleza de um passado distante, onde as roupas eram feitas com as melhores fibras e tingimentos naturais e as modelagens cuidadosamente desenvolvidas para serem atemporais. Um tempo em que ser feminina é mostrar muito pouco de pele, e deixar a fluidez do tecido de uma roupa toda feita a mão, em um ateliê de alta-costura, contribuir com uma genuína energia criativa e de amor à moda que transparece.
Carolina Augusta cria figurinos de alta-costura, no ateliê parisiense tradicional de sua marca homônima Augusta, e não se preocupa em estudar as tendências. Sua roupa busca ser uma forma de arte usável, já que, segundo ela, o que vestimos é a primeira forma de expressão criativa e artística. Nenhuma roupa dela é igual a outras peças que já tenham visto por aí, e todas os seus modelos são numerados e feitos de forma totalmente artesanal, com tingimentos naturais e tecidos e cores que são criados também de forma orgânica, já que o ateliê Augusta não segue o calendário de coleções – a marca tem muitas de suas peças atemporais como uma coleção permanente, com variações nos materiais, reflexo de processos artesanais e dos insumos que encontra para produzir.
Formada em cinema com especialização em direção de arte, figurino e cenografia, Carolina Augusta decidiu estudar na Escola do Sindicato de Paris, uma escola tradicionalíssima, berço da alta-costura francesa, e buscou se aprofundar na técnica para poder trabalhar com figurinos, balé e cinema. Carolina, que se define como muito intensa, rapidamente percebeu que a alta-costura tradicional era seu verdadeiro chamado, sua paixão e que, segundo ela mesma, nasceu para isso, só consegue fazer isso.
Como empreendedora, logo no início sentiu um forte chamado de alma para experimentar o conceito de sustentabilidade nos figurinos, e apesar de ter recebido ofertas para trabalhar em algumas das grandes maisons francesas, decidiu seguir seu sonho e montar seu próprio ateliê. Vegana há 15 anos, filha de mãe alemã e de família diplomática, Carolina sempre circulou com facilidade pelo mundo criativo e cultural internacional. Por outro lado, sua herança germânica trouxe um forte olhar e preocupação em comprar qualidade e uma forte influência de reciclagem, costume que há muitas décadas faz parte da rotina dos alemães.
Seu modelo de negócio, em que a sustentabilidade é total, com 100% de aproveitamento de insumos e geração de lixo próximo de zero, começou há sete anos, em um momento em que o mundo ainda não estava com a consciência que temos hoje, um tempo em que conseguir insumos têxteis sustentáveis e de qualidade era extremamente desafiador. Quando começou a experimentar com materiais sustentáveis, com sua marca, então embrionária, ainda era vista como algo meio hippie e foi bastante criticada por seus pares da indústria, que consideravam impossível viabilizar economicamente um projeto assim. No Brasil, tínhamos a Osklen como precursora mundial com esse conceito e Stella McCartney como uma marca internacional dando os primeiros passos na busca da sustentabilidade. Durante os primeiros dois a três anos, enfrentou um grande desafio para conseguir tecidos e materiais alinhados com sua visão e, de repente, viu a indústria se transformar drasticamente.
A visão de um produto altamente sofisticado, como uma alta-costura, ser feito de forma sustentável era algo ainda impensado. Hoje, vemos que o mundo percebeu e está fortemente engajado com esse comprometimento com o meio ambiente e a mudança das marcas que tem sustentabilidade como bandeira, como alma, passou a ser extremamente apreciado e valorizado. Passados seis anos, vemos a indústria como um todo buscando exatamente essa revisão na sua identidade e se adaptar à sustentabilidade virou quase um pré-requisito mandatório que em poucos anos poderá, de forma definitiva, tirar do mercado marcas que não se adaptarem. Hoje, todos se dizem, ou buscam se tornar, sustentáveis.
Todas as peças são numeradas e made-to-order. Por serem feitas em um número pequeno, com cores exclusivas, que serão sempre peças especiais, mesmo os modelos clássicos da marca acabam tendo uma característica única pelo tecido e tingimento do momento. Em São Paulo, você encontra na loja conceito Pinga ou pedidos podem ser feitos pelas mídias da marca. A proposta é vestir um lifestyle e usar um “couture-to-wear”, a alta-costura que pode ir à praia ser altamente versátil em um guarda-roupa sofisticado e atemporal.
Sua clientela foge de logos, valoriza a alfaiataria, o conceito da exclusividade inerente à marca e aprecia uma coisa quase secreta, difícil de identificar. Da mesma forma, seus clientes estrelados e aristocratas europeus preferem não se identificar, não querem mostrar o rosto. Em Paris, seus clientes são na grande maioria japoneses e dizem que eles têm na cultura deles apreciar o trabalho e chegam querendo um luxo diferente. Em Paris, trabalha com uma personal stylist em atende os pedidos apenas sur rendez-vous, com hora marcada, sem loja aberta ao público. Está com uma parceria em Londres, onde acaba de entrar na Rotaro, uma plataforma nova de aluguel de roupas de cult-brands europeias. Augusta também é vendida na Itália, em um hotel histórico na costa amalfitana chamado Palazza Alvino, em Ravelo, que é administrado exclusivamente por mulheres – o que nos faz lembrar de ter encontrado um segredo bem guardado. O site da marca Augusta é só um showroom para made-to-order.
As pessoas sempre perguntam por que a Augusta não está nos lugares, não é postada nas mídias sociais, e a resposta de Carolina Augusta é sempre a mesma: que essa não é a proposta da marca, que se mantém fiel ao espírito parisiense, e busca se manter quase como um endereço secreto. Mais uma vez caminhando aparentemente contra a corrente, Carolina conseguiu imprimir uma exclusividade ao seu produto, e hoje além de ser um “couture-to-wear” totalmente sustentável, mais uma vez, se coloca contra a corrente e se define uma marca verdadeiramente off-line com a coragem de trazer de volta o glamour desconstruído de uma moda com pilares muito sólidos de posicionamento.
@carolina.andraus é formada pela FGV, ex-mercado financeiro, empreendedora, desenvolveu e vendeu diversas empresas no mercado imobiliário. Globetrotter e cidadã do mundo, já morou em Londres, Paris, Nova Iorque, Boston, Istambul e Frankfurt. Recentemente voltou a estudar na Harvard Business School e passou a escrever sobre mulheres inspiradoras, comportamento, e viagens.