Domingo é um bom dia para ler com calma uma boa crônica. Pensando nisso, o time da Bazaar irá analisar e sintetizar momentos do cotidiano, com humor e leveza, assim como o fim da semana merece. Abaixo, nossa repórter Cecilia Madonna Young dá início ao nosso novo canal – boa leitura!

Foto: Reprodução/IMDb
Tudo começa em uma madrugada em que estava perdendo horas e horas de sono, assistindo a vídeos no TikTok em que uma inteligência artificial escolheu especificamente para mim. De pessoas quebrando cera de vela até vídeos dramáticos de personagens fictícios de produções Hollywoodianas, estava me perdendo dentro do vórtex presunçoso e viciante que é essa rede social jovial e um tanto perigosa. De repente, me aparece um vídeo sobre um tal de “method dressing”.
O vídeo começava inocentemente definindo o termo como vestir uma celebridade de um jeito que remeta o seu mais novo projeto – pense em Margot Robbie como a Barbie, Jenna Ortega como Wednesday Addams (a Wandinha), Zendaya em Duna e Homem-Aranha… Isso, claro, é uma espécie de marketing escondido. Afinal, quem não acordava toda manhã algumas semanas atrás ansioso para saber que modelo vintage Margot estaria vestindo naquele dia para promover Barbie? Dei uma risadinha, esse vídeo era perfeito para quem, alguns dias atrás, tinha ido toda de rosa assistir ao esperado filme de Greta Gerwig. Aquela sessão cheia de Barbies e Kens tinha me aquecido o coração. Era como se todos nós, por duas horas, fizéssemos parte de algo juntos. Como uma pessoa que sempre teve dificuldade de se encaixar, foi um sentimento que abracei com toda a força. É bom se sentir parte de um tipo de movimento.
Se formos pensar de maneira cínica, estávamos apenas ajudando no marketing de milhões de um filme que não precisava tanto da nossa ajuda. Ou melhor, estávamos todos fazendo o trabalho já feito por uma equipe muito mais especializada e ainda estávamos pagando para fazer isso. Olhando assim, dá até vontade de ir assistir Barbie de preto. Mas, não é sobre isso. E, obviamente, não é a primeira vez que isso acontece. Acredito que a grande diferença, dessa vez, é que não estamos mais olhando para esse tipo de animação como algo “fanático” ou “para nerds”. Como uma pessoa que frequenta o CCXP todo ano e nunca perdeu uma estreia de meia-noite de algum filme da Marvel ou de Harry Potter, esse tipo de aceitação do “ser-fã” me acolhe.

Foto: Instagram/@harrystyles
O TikTok sobre “method dressing” parecia concordar com meu devaneio nostálgico. Foi argumentado, em meio a flashes que mostravam jovens histéricos com roupas coloridas e espalhafatosas, que esse fenômeno vai muito além de apenas uma celebridade vestindo uma roupa em um red carpet. Recentemente, isso tem adentrado a cultura do fã de uma maneira grandiosa e definitiva. “Olhe os shows do Harry Styles, por exemplo,” disse o TikToker. Engraçado. Mais uma coincidência: alguns dias atrás, eu mesma estava em um show do Harry Styles – o penúltimo de sua longa turnê Love on Tour, em Lisboa. Soube imediatamente o que o vídeo queria dizer mencionando esse evento. Afinal, todo mundo faz questão de se inspirar nas roupas empetecadas e espalhafatosas de Harry para assistir ao show do artista desde o ínicio da turnê.
Não é difícil achar a localização de um show do ex-One Direction. Quilômetros de distância da entrada, você já vai começar a ver plumas coloridas voando e jovens vestidos com uma mistura de neon, tons pastel, paetês, glitter e estampas diversas. É como uma versão moderna de O Mágico de Oz: “Siga o caminho de tijolos amarelos”. Eu mesma, naquele dia, tinha pegado o look mais chamativo que tinha na minha mala de viagem: um vestido de seda laranja com uma meia calça roxa-bebê. Com uma quantidade de roupas limitada, acho que me dei bem com o resultado. Com certeza não é uma roupa que você escolheria para ir à padaria em um domingo de manhã, se é que você me entende.
Me aproximando da arena, já sentia um aperto bom no coração. Estávamos todos lá pelo mesmo motivo: para ver o show de alguém que todos admirávamos e nos divertir. Escutava línguas diferentes sendo faladas ao meu redor: inglês, italiano, francês, português… Havia de tudo. E, ainda sim, parecia que falávamos o mesmo dialeto. Acredito que essa teoria tenha sido confirmada no momento que o Harry começou a cantar um dos maiores hits do One Direction, What Makes You Beautiful, e eu comecei a pular e dançar com umas gringas que estavam do meu lado. Nem sei de onde eram ou quais eram os nomes delas, mas naquele momento era como nos entendêssemos 100%.
Você pode até estar achando que estou ficando emocionada demais com algo tão simples como se vestir para um show. Talvez esteja, talvez não. Depende do jeito que você olha esse fenômeno. Outro dia, estava ajudando a minha amiga de Los Angeles com a roupa dela para o último show nos Estados Unidos do The Eras Tour, da Taylor Swift. Ela tinha escolhido uma roupa específica da cantora (o primeiro look usado no Red Tour, de 2013) e iria copiá-lo para usar no dia. E esse é só o início de todo preparo que um show da cantora requer hoje em dia. Além de uma roupa que seja facilmente reconhecível como parte de uma das dez eras (ou álbuns) da estrela, você também tem que levar uma quantidade considerável de pulseirinhas de amizade.

Foto: Instagram/@taylorswift
“Make the friendship bracelets” (“Faça as pulseiras de amizade”), cantou Taylor na música You’re On Your Own, Kid, do seu décimo álbum Midnights. Os swifties (como é chamado seu fandom) levaram essa ordem a sério. Em cada show da cantora, milhares e milhares de pulseiras com frases, brincadeiras e siglas sobre Taylor são compartilhadas e trocadas pelos seus fãs. É adorável e impressionante como isso virou quase como uma apresentação por si só. As melhores amigas de Taylor e banda de abertura, Haim, estão até fazendo suas próprias pulseiras para trocar com fãs. Um projeto de um grupo de Swifties virou um fenômeno. Posso confirmar que, por tudo que vi na internet até agora, toda pessoa que vai no The Eras Tour sai pelo menos com um pulso cheio de pulseiras de amizade.
Há quem questione se isso não é apenas mais uma maneira do ser humano se adequar às práticas capitalistas modernas. Quero dizer, há sim uma quantidade um tanto excessiva de dinheiro que podemos gastar comprando um look Barbie, Harry ou Taylor para usar apenas por uma noite. Mas não é exatamente isso que sempre fizemos durante o Carnaval, as festas à fantasia e de fim de ano? Por que é que não repetir tal ato para ver nossos ídolos nos palcos ou assistir a um filme que estamos esperando faz tempo?
Honestamente, acredito que quem olhe feio para fãs que se vestem para determinados eventos deveria parar e tomar conta de sua própria vida. Digo assim como um jeito de evitar usar termos mais agressivos (que seriam editados para fora). É lindo amar tanto a arte de alguém ao ponto de querer representá-la em seu próprio visual. Nos vestimos para nos adequar, nos sentir parte de algo maior do que a nossa própria existência medíocre – e o “method dressing” na cultura de fãs é só mais uma representação disso. E, no final das contas, é muito antiquado chamar alguém de “nerd” como insulto, você não acha?