A cirurgia robótica avança para além da simples assistência técnica – Foto: Getty Images

O futuro da medicina já chegou — silencioso, preciso e, em muitos casos, com braços mecânicos. Já é realidade: robôs assistidos por inteligência artificial têm sido utilizados em procedimentos cirúrgicos com cada vez mais frequência. Esses sistemas vêm demonstrando ganhos concretos em segurança, redução de complicações e recuperação mais rápida dos pacientes.

Segundo o The New York Times, o uso de Inteligencia Artificial na medicina cresceu de forma exponencial nos últimos anos. O FDA, agência reguladora dos Estados Unidos, já aprovou centenas de dispositivos médicos baseados em inteligência artificial — muitos deles voltados ao suporte cirúrgico, análise de imagens e decisões clínicas em tempo real.

Em paralelo, a cirurgia robótica avança para além da simples assistência técnica. Pesquisadores da Johns Hopkins University desenvolveram um sistema capaz de realizar cirurgias em tecidos moles de forma autônoma, com precisão superior à dos cirurgiões humanos em testes laboratoriais. Em outro marco, publicado pelo The Guardian, robôs treinados com IA conseguiram remover vesículas biliares de porcos com sucesso total — abrindo caminho para futuros ensaios clínicos em humanos.

Ainda que o toque humano siga insubstituível em diversas etapas da prática médica, o avanço da inteligência artificial promete redesenhar o papel do cirurgião — que passa a ser cada vez mais estrategista, enquanto a máquina executa com milimétrica precisão. A era da cirurgia inteligente já começou.

Inicialmente adotada em especialidades como urologia, ortopedia e gastrocirurgia, a cirurgia robótica também chegou à cirurgia plástica. “A técnica foi primeiramente utilizada em microcirurgias. Agora, a estratégia é utilizá-la em cirurgias da face, como os liftings. O robô é usado para dar mais precisão na cirurgia. Ele magnifica a imagem, confere visualização em 3D para o cirurgião e elimina os tremores que o profissional poderia ter”, explica o cirurgião plástico Dr. Paolo Rubez, especialista formado pela UNIFESP, mestre pela Escola Paulista de Medicina, membro de importantes sociedades nacionais e internacionais de cirurgia plástica, com certificação em cirurgia robótica e passagens por centros de referência nos EUA.

Mesmo com os avanços tecnológicos, a autonomia permanece totalmente com o médico. “É importante enfatizar que o nome ‘robótica’ se refere ao robô que é comandado pelo cirurgião plástico. Ou seja, ele é apenas a extensão do braço do especialista. Toda a cirurgia ainda é comandada pelo médico especialista e não por inteligência artificial”, afirma o cirurgião.

Na ortopedia, o uso de robôs é cada vez mais comum em procedimentos como a artroplastia de joelho. “Um robô cirurgião que age por conta própria ainda é ficção científica. Na verdade, hoje, quando falamos de cirurgia robótica, nos referimos principalmente a um equipamento com um braço robótico equipado com pinças e câmeras. Esse braço é totalmente controlado pelo cirurgião. Então, o sucesso do procedimento ainda se deve totalmente à experiência e ao conhecimento do médico”, afirma o Dr. Marcos Cortelazo, ortopedista formado e pós-graduado pela UNIFESP, especialista em joelho e traumatologia esportiva, membro de sociedades como SBOT, ISAKOS e SLARD, atuante em hospitais como o Albert Einstein.

A robótica permite um grau de precisão que ultrapassa as limitações da cirurgia manual. “O procedimento tornou-se cada vez mais comum nas últimas décadas para tratar a degeneração do joelho e aliviar a dor e a incapacidade. A maioria das artroplastias ainda é convencional, o que significa que os cirurgiões as realizam manualmente, julgando quanto osso remover com base em seu treinamento e experiência. Um número crescente dessas cirurgias é realizado usando robôs cirúrgicos que dependem de imagens pré-operatórias ou da descoberta de marcos anatômicos durante a cirurgia para determinar onde cortar”, explica.

“O robô filtra os tremores da mão do cirurgião, eliminando-os, o que evita movimentos involuntários e, consequentemente, aumenta a assertividade e a segurança. Essa precisão é submilimétrica, o que também garante que o procedimento seja menos invasivo. Com o auxílio do robô, as incisões são mais exatas e o trauma é menor, o que se traduz em cirurgia mais rápida, menor sangramento e tempo de internação, recuperação mais rápida, pós-operatório mais tranquilo e incisões menores”, acrescenta o Dr. Marcos.

A cirurgia plástica também se beneficia desse nível de precisão, especialmente em áreas sensíveis como o rosto. “A ideia é que a magnificação da imagem vai permitir mais segurança na cirurgia na medida em que melhora a visualização dos nervos da face”, diz o Dr. Paolo. “Além disso, podemos ter benefícios como maior precisão e cicatrizes mais discretas”, completa. Ele também destaca o potencial da tecnologia para acessar áreas difíceis: “O auxílio da tecnologia também pode permitir melhor segurança em acesso a lugares difíceis e com visualização detalhada da região operada. A robótica oferece alta precisão para o cirurgião plástico. No futuro, é possível que a tecnologia seja utilizada em muito mais técnicas de cirurgia plástica.”

O funcionamento da técnica é semelhante entre diferentes especialidades. O cirurgião inicia o procedimento, posiciona os braços do robô no campo operatório e passa a controlá-los por meio de um console. “A partir daí, o médico dirige o console para comandar todos os movimentos do robô, que não tem autonomia de movimentos ou criatividade”, explica o ortopedista.

As imagens em tempo real são um dos pontos fortes da tecnologia. “As câmeras presentes no braço robótico do equipamento também geram, em tempo real, imagens de alta definição que podem ser aumentadas, assim auxiliando no posicionamento dos instrumentos cirúrgicos e na tomada de decisões pelo cirurgião. Na ortopedia, as imagens em 3D permitem que o cirurgião planeje melhor os cortes ósseos e o posicionamento da prótese para garantir um encaixe e alinhamento mais preciso, o que tende a ser mais difícil com a técnica tradicional”, complementa o Dr. Marcos.

Esse encaixe milimétrico contribui para um resultado mais duradouro. “O encaixe mais preciso da prótese no osso melhora o prognóstico da cirurgia e o paciente tem menos chance de sofrer com problemas como dor, rigidez e inchaço da região após o procedimento. Apesar de ter bons resultados, na técnica tradicional, o encaixe depende unicamente da experiência do cirurgião, o que, em alguns casos, pode resultar em um posicionamento não tão exato, causando alterações no alinhamento da articulação que fazem diferença a longo prazo, especialmente em relação à durabilidade da prótese”, afirma.

No campo estético, o fator humano segue essencial. “Apesar de toda a precisão, na cirurgia plástica, a habilidade, o estudo anatômico e o toque do profissional ainda serão fundamentais para o sucesso do procedimento. Continua, então, valendo a máxima de procurar um especialista experiente para realização da técnica, uma vez que sua habilidade e conhecimento estão associados a um melhor resultado”, completa o Dr. Paolo.

Apesar dos custos ainda elevados, a cirurgia robótica representa um passo significativo rumo a um novo padrão de cuidado médico — mais preciso, menos invasivo e centrado na segurança do paciente. A tendência é clara: à medida que a tecnologia se aprimora e se torna mais acessível, os benefícios deixarão de ser uma exclusividade e passarão a integrar cada vez mais a rotina de hospitais e centros cirúrgicos ao redor do mundo. A revolução não é robótica apenas no nome — ela está acontecendo agora, conduzida por especialistas humanos, com o apoio da máquina, e a favor da vida.