Isabela Chusid, fundadora da Linus e representante brasileira no Cartier Women’s Initiative 2024 – Foto: Fernanda Corsini

Diversas marcas surgem com o desejo de um empresário de solucionar um problema – e foi esse o fator que alavancou a fundação da Linus. Diagnosticada com hiperfrouxidão ligamentar (condição hereditária que se define pelo aumento da elasticidade articular), Isabela Chusid começou a sentir dor nos pés. Ao ser recomendada por um médico que usasse um calçado que desse suporte aos arcos plantares, se deparou com a falta de marcas com todos os atributos que buscava: com seu estilo, um viés sustentável, financeiramente acessível e que suprisse a questão ortopédica.

“Fiz uma pesquisa de mercado – no Facebook, naquela época (início de 2018) – e teve uma adesão boa de respostas. Vi que existia uma demanda e decidi ir atrás”, lembra sobre os primeiros passos. Sem largar seu emprego e consciente do privilégio que tinha em poder investir no novo negócio, Isabela decidiu criar sua própria marca. “Desde o início, sabia que queria que fosse plástico, porque é um material que te permite usar o produto se chover, se quiser ir na praia ou piscina, onde for. Só que eu não dormiria tranquila se não conseguisse fazer um plástico com o menor impacto ambiental possível. Então, foi um trabalho de pesquisa. Foi aí que descobri que empreender é sobre conversar com pessoas, fazer conexões.”

Sem experiência na indústria do calçado, Isabela Chusid usou seu dom do diálogo para encontrar alguém que estivesse desenvolvendo o que ela buscava. E foi em uma empresa de desenvolvimento de novas matérias-primas que encontrou outra mulher que desejava o mesmo que ela. “Nessas de não entender muita coisa, falei que queria algo 100% reciclável, vegano, com o maior percentual de fontes renováveis e a menor pegada de carbono. Não tinha conhecimento das dificuldades e desafios em desenvolver tudo isso, mas juntas, chegamos nessa versão: um PVC mais ecológico, que substitui os lubrificantes e plastificantes de origem animal ou fóssil por óleos vegetais. Viramos inclusive case dentro do nosso fornecedor, porque foi o PVC com maior percentual de CO2 de origem renovável que eles encontraram”, explica.

Além das questões ambientais, Isabela Chusid reforça o quão necessária é a inclusão das mulheres em cargos de poder quando falamos em sustentabilidade. A empresária lembra os primeiros da empresa, em que precisou lidar com “chão de fábrica” na busca de fornecedores e passou por situações indelicadas. “Hoje, com a casca que tenho, saberia lidar melhor com essas tentativas de ultrapassar o limite do profissional. Comecei, quase inconscientemente, a masculinizar um pouco minha postura. Acho que sou mais direta, preciso mostrar que somos iguais, que sou durona quando preciso. Isso é muito ruim”, reflete.

Por isso, um dos principais pilares da Linus é focado em criar um ambiente saudável para mulheres e colocá-las em cargos de liderança, para que nenhuma passe por situações como a que a própria Isabela enfrentou. “Comecei a contratar mulheres porque queria criar um ambiente em que me sentisse confortável. Só depois fui entender, ler estudos e viver na prática que mulheres em posição de liderança tendem a ter muito mais decisões que levam sustentabilidade em consideração. Empreender sendo mulher me dá essa visão e oportunidade de fazer a diferença.”

Mas além de mudar fora de casa, Isabela também tem a preocupação de olhar para dentro. Ela conta que se mostra aberta em relação aos seus erros, dificuldades e desafios, criando um ambiente mais seguro para vulnerabilidades e empatia.

O reconhecimento da Cartier

Isabela Chusid, fundadora da Linus e representante brasileira no Cartier Women’s Initiative 2024 – Foto: Fernanda Corsini

A trajetória da Linus a levou para um lugar muito desejado, mas que parecia muito distante: o prêmio Cartier Women’s Initiative. “Lembro de quando a Emily [Ewell, fundadora da Pantys] ganhou e era algo muito distante. Tenho uma relação próxima a ela e foi quem me incentivou a me inscrever. É um processo seletivo longo, mas que te passa seriedade”, lembra.

Para a empreendedora, a maior honra é representar o Brasil no programa, que anualmente visa impulsionar a mudança no empreendedorismo internacional ao capacitar mulheres que impactam, social e ambientalmente, o mundo, além de destacá-las no mercado e oferecer suporte financeiro e humano para o crescimento de seus negócios. “Apesar de sermos chamados de ‘o pulmão do mundo’, estamos muito atrás em termos de sustentabilidade – principalmente quando olhamos a Europa. Mas temos muitas coisas boas para mostrar, estamos impactando não só a indústria calçadista, mas outros players. Assumimos a responsabilidade de ser um agente de mudança”, acrescenta.

Um dos pontos altos da premiação, para a empresária, é poder trocar com outras mulheres, que enfrentam desafios inimagináveis para construir suas empresas. O evento também conta com diversas mentorias, além de incentivar as trocas entre as nomeadas.

“As mulheres que mais me inspiram são as que são chefes de família, lidam com jornada tripla, que continuam mesmo não sendo reconhecidas pelo que fazem. É quem está no backstage, sustentando a família, trabalhando para garantir a escola. São mulheres que conheço e que estão próximas do meu dia a dia de alguma forma”, analisa entre as mulheres que lhe inspiram.

E mesmo alcançando um espaço na premiação, Isabela Chusid confessa que, para ela, ainda é surreal pensar que se tornou inspiração para tantas outras. A empresária afirma que, sempre que conversa com alguém sobre o assunto, se preocupa em deixar claro que desafios existem, mas que é preciso valorizar o lado humano do trabalho. “Não existe short cut. É trabalho duro, fazer as coisas direito. Estar dentro das quatro linhas. Mas me coloco muito à disposição, de fazer pontes. Hoje tenho uma rede de contato e de apoio muito boa, mas quando você está no começo, você não sabe para quem pedir ajuda. Meu maior conselho é: não tenha vergonha, fale com todo mundo”, finaliza.