
Os desenhos de Nina Portnoff para Pierre Cardin, na boutique vintage Déjà Vu, em Marbella, na Espanha (Foto: Harper’s BAZAAR Brasil)
Quem diria… os mouros conquistaram a Andaluzia – e Pierre Cardin também! Custei a acreditar, mas era tudo verdade: na Costa del Sol, “riviera espanhola” onde a África está ao alcance dos dedos, descobri em andanças por Marbella uma boutique vintage repleta com tesouros. A região da Andaluzia, aliás, é cheia deles e Déjà Vu, o “brechó” em questão, faz justiça ao endereço.
É no número 8 da Calle Pedraza, centro histórico da cidade, que o casal de estrangeiros Richard e Amanda Zizzi-Knight criaram o negócio há 27 anos. Desde então, fizeram de lá uma galeria de “quinquilharias” de luxo deliciosas, achadas em viagens ou através de uma rede complexa de contatos. Entre araras de roupas assinadas, móveis, joias e outros objetos curiosos, encontrei espalhados desenhos carimbados com um selo familiar: “118, Fbg Saint-Honoré” – as coordenadas da boutique parisiense que o estilista Pierre Cardin inaugurou em 1954, por onde passei poucas semanas atrás.
“Esses têm uma história curiosa”, me disse Richard, quebrando o silêncio e tirando da gaveta mais dezenas de desenhos coloridos, alguns ainda alfinetados com amostras de tecidos. Naquela pasta, descobri a jornada incomum de uma mulher russa que, nascida às vésperas de uma revolução, fez carreira como designer em Paris e faleceu na Andaluzia, com mais de 7.800 croquis em sua coleção.

Os desenhos de Nina Portnoff para Pierre Cardin, na boutique vintage Déjà Vu, em Marbella, na Espanha (Foto: Harper’s BAZAAR Brasil)
Seu nome era Nina Portnoff, moscovita de 1914 que, na fuga aos bolcheviques, acabou com os pais na França ainda na juventude. Na década de 1930, estudou design, mas deixou ignorou a profissão durante seu primeiro casamento, entre 1938 e 1955, com um francês. Foi apenas com o segundo marido, o espanhol Eugenio Amado Garcia, que retomou a carreira para a qual se dedicou até o fim dos anos 1980.
Vizinha de Pierre Cardin em Paris, acompanhou de perto o sucesso do estilista na Era Espacial e seu sucesso no prêt-à-porter, queridinho da (então) nova geração. Criou croquis para o estilista, mas se manteve freelancer por toda a vida: Yves Saint Laurent também consta em seu portfólio.

Os desenhos de Nina Portnoff para Pierre Cardin, na boutique vintage Déjà Vu, em Marbella, na Espanha (Foto: Harper’s BAZAAR Brasil)
A carreira discreta chegou ao fim na metade da década de 1980, quando o marido, já aposentado, decidiu retornar para a Espanha. Agora na Andaluzia, Nina continuou desenhando até ser acometida por Alzheimer poucos anos depois, vindo a falecer na virada do século. Antes de morrer, Eugenio dividiu os mais 7.800 croquis da esposa entre amigos, uma das quais vendeu sua parte para o casal da boutique vintage Déjà Vu, em Marbella.
“Muitos já encontraram novos lares”, me conta Richard sobre a coleção, que já foi muito maior. “É o tipo de objeto que encanta as pessoas não apenas pela estética, mas pela história”. Quer combinação melhor?

