Olivier Polge fala sobre a criação da nova fragrância da Chanel, Comète – Foto: Divulgação

Olivier Polge incorpora a elegância à la française. Dono de uma fala mansa e pausada, marcada por um vocabulário elegante, exatamente como os perfumes que cria para a Chanel. Antes dele, havia seu pai, Jacques Polge. Grande perfumista, ele trabalhou 35 anos na maison, criando clássicos como Allure, Égoiste e Coco Mademoiselle. De père en fils, o talento para as criações olfativas vem de família.

Nos encontramos numa tarde de março no Ritz em Paris, célebre hotel no qual Mademoiselle viveu boa parte da sua vida. O motivo? O lançamento da Comète, a mais nova eau de parfum da coleção Les Exclusifs. Intensa e sensual, assim como a estrela viajante, ela é impregnada com um acorde fresco e delicado de flor de cerejeira. A isso, se adicionam notas de heliotrópio, extrato de íris e um acorde de almíscar. A boa noticia é que ela chegará em breve ao Brasil.

Harper’s Bazaar Brasil – Como foi o processo de criação de Comète?

Oliver Polge – Quis fazer um perfume floral em pó. O que me interessava era, primeiramente, o cometa, um elemento simbólico na Chanel. A primeira vez que o vimos isso foi na coleção de joias de 1932, especialmente com aquele colar com a estrela cadente. Esse símbolo se tornou uma espécie de emblema para Gabrielle Chanel. Acho que isso ilustra sua crença na força dos símbolos, na astrologia e, de certa forma, nas coisas mágicas da vida. Não há melhor maneira de ilustrar isso do que com um perfume.

Comète, nova fragrância da Chanel – Foto: Divulgação

HBB – E como foi transformá-lo em fragrância? Qual a correlação dos símbolos de Chanel com as notas de Comète?

OP – Pensei nessa ideia de poeira estelar. Abordei essas notas de pó com elementos florais. Inicialmente, pensei em fazer um perfume de baunilha, pois ela tem um cheiro de pó, mas decidi explorar as notas de coração com o heliotrópio, pequena flor branca. Também temos uma qualidade muito boa de íris em Grasse, no sul da França, que traz um lado amadeirado em pó, e construí o perfume com essas notas.

HBB – Na Chanel, você sempre concebe perfumes a partir de uma ideia, não apenas de uma matéria-prima…

OP – Sim, nunca criamos um perfume a partir do cheiro de rosa ou jasmim. Mas usamos esses elementos, não para reproduzir o cheiro, mas para combinar e criar um perfume mais abstrato. Dito isso, uma das notas com as quais os associei foram as de heliotrópio. Normalmente ela é usada como nota de fundo, mas pode e deve ser usada no corpo do perfume.

HBB – O interessante dos exclusivos é que você brinca com elementos que são constitutivos do imaginário da Chanel.

OP – Sim, para as notas de cabeça, isolei os elementos que têm uma impressão de flor de cerejeira. Esses são os acordes importantes para a cabeça: espinheiro-alvar, amêndoa, cereja. São deliciosas, com um toque de frutas. E para as de fundo, optei pelas almiscaradas e ligeiramente ambaradas.

HBB – Quanto tempo você leva para elaborar um perfume?

OP – A criação é lenta. Não há regras fixas para combinações que funcionam. Na Chanel, temos um apreço por matérias-primas ricas e complexas. Criamos fórmulas, vivemos com elas, experimentamos o perfume para ver se certas notas não se tornam cansativas com o tempo. O processo é íntimo e intuitivo.

HBB –  E como, então, trabalhar com o calendário intenso de lançamentos?

OP – Atualmente, trabalho em projetos para 2026. Isso nos dá o luxo de tempo, mas às vezes queria que o processo fosse mais rápido. A Comète foi finalizada há mais de um ano. Entre a criação e o lançamento, há um tempo considerável. Sempre trabalho em vários projetos ao mesmo tempo. O olfato funciona melhor com contrastes. Às vezes, durante a semana, preciso respirar algo diferente para manter a criatividade.

HBB – E quais as atividades que você mantém para manter a criatividade?

OP – Além do perfume, gosto de música clássica e piano, mas não tenho tanto tempo para praticar. A música e o perfume têm algo em comum: ambos são imateriais, se difundem no ar e têm um impacto profundo nos sentimentos. Na Chanel, há um entendimento profundo e uma absorção da filosofia da maison, que leva tempo. Trabalhar na Chanel é como trabalhar em nenhum outro lugar, e com o tempo, sentimos uma conexão cada vez mais forte com a maison.

HBB – E como um músico se torna perfumista?

OP – No meu caso, foi a profissão do meu pai, que também trabalhou para a Chanel. E mesmo que provavelmente haja uma influência da parte do meu pai e da minha família, minha personalidade. Além disso, acho que o perfume me atraiu porque gostava muito de música. Ou seja, acho que isso desenvolveu minha sensibilidade de certa forma. Se eu intelectualizar a questão, posso dizer que são duas coisas imateriais, que se difundem no ar de maneira totalmente invisível e que têm um impacto nos sentimentos mais do que muitas outras coisas.

HBB – Para finalizar, como você vê esses dez anos de Chanel?

OP – O tempo passa rápido. Sinto que foi há apenas um ano. Antes de vir para a Chanel, trabalhei por quase vinte anos em outras empresas. Mas chegar à Chanel é realmente uma revolução. Fazemos perfume como em nenhum outro lugar. Há um tempo de compreensão, de assimilação da casa, que é excepcional. E conforme os anos passam, melhor nos sentimos.