Criações da ALuf na passarela da apresentação de “Chuva do Caju”, durante a Expo Osaka 2025 – Foto: Keisuke Kira

Por Piti Koshimura

Formas, experimentalismo e teatralidade. Cinco marcas brasileiras lideradas por mulheres se apresentaram no último domingo (24.08) na Expo 2025 Osaka, no Japão, representando o caldeirão criativo da moda nacional. A exibição fez parte da abertura da Semana da Mulher, em Osaka – uma iniciativa da ApexBrasil, que também assina o Pavilhão do Brasil na Exposição Mundial.

Em uma performance embalada com visuais poderosos, criados em arte generativa pela artista JE Kos, Aluf, Argalji, Artemisi, Mayara Junges e Penha Maia apresentaram três looks cada, para mais de mil pessoas. O evento aconteceu no conhecido “Shining Hat”, anfiteatro projetado por Toyo Ito, vencedor do Prêmio Pritzker.

Em um primeiro contato com aquele público, as marcas levaram a Osaka peças representativas de suas coleções. Fundada pela paraense Ana Luisa Fernandes, a Aluf quis destacar sua essência em tons crus, alternando entre modelagens ajustadas e volumosas. Sobre a escolha dos looks estruturados da Argalji, a carioca Monique Argalji contou à BAZAAR que foi interessante trabalhar em conjunto com o stylist do evento, o japonês Babymix, que apostou em uma releitura de seu trabalho, sem fugir à proposta mais experimental que a marca comunica.

Artemisi, marca da estilista capixaba Mayari Junbini que já vestiu Katy Perry e Demi Lovato, apresentou peças que unem tecnologia e processos artesanais, como um top em 3D e um vestido com aplicações em cristais. De seu ateliê em Curitiba, Mayara Junges levou peças que revelam seu DNA como o top Flor – peça com a qual afirma ter se tornado estilista. A paraibana Penha Maia encerrou com looks lúdicos e irreverentes, que rompem com formas usuais e traduzem sua liberdade criativa.

Segundo a curadora Olivia Merquior, além da liderança feminina, outro traço em comum entre as cinco marcas é que todas exploram volumes em suas criações. “A gente resolveu buscar algo que trouxesse essa sinergia entre cultura brasileira e japonesa, onde a gente entende que a criatividade e, principalmente, a experiência de formas são fundamentais”.

Chuva do Caju

Arte generativa criada pela artista JE Kos – Foto: Keisuke Kira

A “generosidade” nas formas, como comenta Olivia, faz uma referência direta à Chuva do Caju, iniciativa da ApexBrasil criada inicialmente para levar o mobiliário brasileiro à Semana de Design de Milão, em abril deste ano. No Japão, o projeto se expandiu para a moda, com a mesma proposta de valorizar a cultura brasileira. Segundo o curador Bruno Simões, a inspiração veio de Lina Bo Bardi: “Não é preciso muito para ser muito”.

“Tentei buscar um tema essencial, que nos trouxesse de volta à origem – à origem de uma família, à origem regional”. Veio daí a ideia de centralizar o projeto na imagem do fenômeno meteorológico que acontece no Nordeste – e empresta o nome para iniciativa –, marcado por chuvas que anunciam o fim da estação seca. “A gente quis expressar um design de vanguarda, moderno, inesperado, surpreendente. Um momento em que a gente pode mostrar um Brasil que muitas vezes não é tão reconhecido ao falar sobre moda internacional”, completa Olivia.

As cinco marcas foram aprovadas em edital realizado pelo Texbrasil, um programa fruto da parceria entre ApexBrasil e da ABIT (Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção), e que tinha como principais critérios a liderança feminina, a representatividade regional e como elas se conectavam com a narrativa proposta pela Chuva do Caju.

No backstage, o clima era de comemoração e orgulho por estarem prestes a representar o Brasil com outras mulheres e exibir suas criações ao público global da Expo. Penha Maia dividiu que “o mais incrível é que essa iniciativa vai abrir espaço para pessoas como eu. Tenho um ateliê enxuto e, apesar de estar há 16 anos na área, nunca pensei em estar aqui. A minha marca não teria condições”.

Empreendedorismo feminino

Semana da Mulher, na Expo Osaka 2025 – Foto: Keisuke Kira

Com o objetivo de promover a participação de empresas lideradas por mulheres no mercado internacional, a ApexBrasil lançou em 2023 o Programa Mulheres e Negócios Internacionais (MNI). Reconhecido em 2024 pelo International Trade Center como a melhor iniciativa para a inclusão de gênero na agenda do comércio internacional, o programa está por trás da realização da Semana da Mulher, em Osaka. Até o dia 30, está prevista uma série de debates sobre o papel da mulher nas agendas econômicas e sociais, abordando temas como empreendedorismo, sustentabilidade, políticas públicas e tecnologia – alguns deles organizados em parceria com o Pavilhão das Mulheres (Women’s Pavilion), assinado pela Cartier.

Questionada sobre as dificuldades enfrentadas pelas mulheres ao empreender, Ana Paula Repezza, diretora de Negócios da ApexBrasil e idealizadora do MNI, destacou que existem tanto barreiras socioemocionais — como a dificuldade de se reconhecerem no papel de líderes, empresárias ou negociadoras — quanto obstáculos técnicos, relacionados ao acesso a crédito ou à aquisição de equipamentos para ampliar a produção.

Por outro lado, de acordo com uma pesquisa recente realizada pela agência, quando mulheres empreendem, a grande maioria tende a incorporar a sustentabilidade em seus negócios, movidas por uma visão holística a respeito do seu negócio, segundo Ana Paula. “Na maioria das vezes, ela tem um propósito e monta um negócio para atender esse propósito”.

Isso é evidenciado no posicionamento de algumas etiquetas. “Com tantas marcas no mundo, entendemos que a questão do design tem que solucionar um problema e não criar mais um”, afirma Marcelle Dutra, head de comunicação e branding da Aluf. Defensora do slow fashion, Mayara Junges reforça o coro e afirma que “quer poder manter por muito tempo essa consciência do sustentável, do comprado com carinho, amor”.

Nesse sentido, o Brasil tem apostado no algodão como um produto em consonância com as exigências globais, investindo em certificações e na rastreabilidade. De acordo com Luciana Furtado, coordenadora de Agronegócios da ApexBrasil, todo algodão brasileiro exportado é rastreável, ou seja, é possível monitorar toda a sua cadeia, desde a produção até o varejo. O resultado desses investimentos ao longo dos últimos anos, segundo a instituição, é visível na liderança do Brasil como o maior exportador de algodão do mundo na safra 2023-2024, ultrapassando os Estados Unidos.

A moda brasileira pode ganhar o mesmo alcance?

Apesar da relevância do setor têxtil de confecção no Brasil, com um faturamento que atinge 220 bilhões de reais por ano, o país ainda exporta pouco do que produz, segundo Lilian Kaddissi, superintendente de marketing e negócios da ABIT.

O investimento em ações articuladas no exterior consolidando a força da cadeia brasileira, que produz desde a matéria prima ao design de moda, em alinhamento com pautas globais como sustentabilidade e liderança feminina, pode pavimentar o caminho. “Disso, consequentemente, não de forma imediata, a gente vai colher frutos lá na frente em termos de exportação”, acredita Maria Paula Velloso, gerente de indústria e serviços da ApexBrasil. Que venha mais chuva do caju.