
Gucci, verão 2024 – Foto: WWD
Se existe uma peça de vestuário que pode-se chamar de perene, é o slip dress: uma camisola de seda fina, um item funcional no quesito de remover o atrito entre o corpo e a roupa, ou item usado por baixo de vestidos e saias, um tipo de roupa íntima – que de íntima não tem mais nada.
Décadas atrás, o vestido de seda poderia indicar o começo ou o fim do ato de se vestir. Hoje em dia, não precisamos de uma combinação por baixo da maioria das roupas contemporâneas, já prontas para o uso. Mas a contradição entre uma roupa íntima escondida e o desejo de ser vista é um charme que a peça ainda carrega.
De onde vem a ideia de se vestir assim? Bem, o projeto do visual veio do século XVIII, na França, segundo os estudos apresentados na exposição “Infra-Apparel”, mostra de moda no Museu Metropolitan de Arte, em Nova York, em cartaz em 1993, sobre a história e prática do uso de lingerie como outwear.
Os curadores Richard Harrison Martin e Harold Koda escreveram que um retrato famoso de Maria Antonieta feito pela pintora Élisabeth Vigée-Lebrun foi um dos primeiros exemplos do slip dress em seda branca considerado como um item respeitável o suficiente para se vestir em público. Na produção cinematográfica de Sofia Coppola, de 2004, sobre a vida da jovem rainha, é possível ver um conjunto de cenas calmas e serenas nos jardins com vestidos brancos mais leves.
Passa alguns anos e revoluções, quem se interessa pela história pelas peças fluída são as flappers, na década de 1920. Ao contrário do espartilho em formato de S da geração anterior, o vestido de seda dava liberdade para dançar relaxada.
Na década de 1930, a silhueta sereia fica famosa pela cintura marcada e por acentuar o movimento das pernas. É então que Chanel revive a silhueta com elegância e descrição em tons escuros. Em um momento pós-depressão, em que a fascinação pelo cinema cresce na população, grandes figurinistas, como Travis Banton e Edith Head, exerciam influência ao traduzir as ideias de glamour para as telas em preto e branco.
Em meados do século XX, nada era tão bom para divulgar uma ideia como as telas, por isso, os vestidos brilhantes rapidamente se tornaram uma peça desejo. A silhueta sem mangas, em champagne vestida por Jean Harlow em “Jantar às Oito” (1933) fez barulho com uma alusão à ideia do vestido lingerie. As revistas de moda, como a Harper’s Bazaar entre outras, foram creditadas por dar o nome de “slip” ao vestido. Com as medidas ficando cada vez mais estreitas, no ano 1934 a vinda da silhueta estreita e reta deslizante ficou conhecida.

Jean Harlow em “Jantar às Oito (1933)” – Foto: Reprodução/IMDB
O primeiro passo estava dado, porém em meio à Segunda Guerra Mundial e o New Look de Christian Dior, os vestidos slip voltaram para baixo das saias rodadas e vestidos elaborados. Quase uma década depois, em ares de contracultura e youthquake, a revista Nova publicou em 1969 um editorial intitulado “O que você está tentando esconder”, com o objetivo de defender o conceito de roupa íntima transformada em moda, usada abertamente com o propósito expresso de ser vista.

Michelle Pfeiffer em “Scarface” (1983) – Foto: Reprodução/IMDB
Como esquecer da personagem de Michelle Pfeiffer em “Scarface” (1983), Elvira, vista pela primeira vez na tela com um um vestido de seda em esmeralda e alcinhas bordadas. Ao decorrer do filme a silhueta se torna confortável para a personagem tanto no quarto se preparando para sair quanto nas próprias festas.

Princesa Diana no Met Gala de 1996 – Foto: Getty Images
A grande era de ouro do slip dress são os anos de 1990, onde a peça foi revivida de um jeito moderno, com celebridades da década sendo vistas regularmente com suas versões da silhueta, incluindo Gwyneth Paltrow em um branco brilhante, Princesa Diana com sua versão azul marinho assinada por John Galliano – em seu tempo na Christian Dior – para o Met Gala de 1996, e Courtney Love, que usava-os como seu uniforme pessoal em conjunto com os cabelos platinados.

Kate Moss, em 1993 – Foto: Reprodução/Instagram/@harpersbazaarus
Talvez na aparição mais famosa do vestido em um tecido brilhante transparente foi estrelada por Kate Moss de 1993. Com os flashes das câmeras, a peça ficou completamente transparente e a foto virou um ícone.
As coisas começaram perder a exclusividade de rockstars e supermodelos quando socialites queridinhas da sociedade de Nova York seguiram o exemplo de Carolyn Bessette Kennedy que usou um modelo para seu casamento íntimo com John F. Kennedy Jr., assinado por Narciso Rodriguez.
Na nossa linguagem moderna de realeza americana, Rihanna talvez seja uma das celebridades mais vistas com diferentes versões do modelo, em paletas diversas e até em outras texturas de tecidos para se aventurar no styling do modelo.
Eventualmente, o slip dress passou a ter menos a ver com seu passado e mais com a troca de um propósito como um todo, do glamour das várias camadas de um visual elaborado a elegância e sensualidade de sair apenas com ele.
Apesar de ter atingido seu grande auge durante a década de 1990, a popularidade do modelo parece não diminuir com o tempo com as últimas coleções internacionais apresentando o slip dress de diferentes formas, seja com seda e renda usado com casacos de couro pesados na francesa Saint Laurent (por Anthony Vaccarello), as peças contemporâneas com acessórios para elevar o visual de Matthieu Blazy na Bottega Veneta e em texturas variadas criadas pela designer Gabriela Hearst.